terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Eleições Americanas de 2014


                               
       As eleições intermediárias nos Estados Unidos costumam favorecer a oposição, que, no momento, é o Partido Republicano, acolitado pela facção do Tea Party (que teve o seu melhor momento em 2010 e vem decaindo nos anos subsequentes).

       Por falar em 2010 – que foi a precedente eleição intermediária – pelo relativo autismo da Casa Branca de Barack Obama no biênio 2009/2010, o seu desastroso resultado para o Partido Democrata (o famigerado shellacking, de que falou o Presidente) determinou a crise quase-permanente em Washington, com a passagem do mando na Casa de Representantes para o GOP. Tal maioria, como é notório, foi dominada pelo Tea Party, um movimento de agressivo reacionarismo. A par de ajudar a eleição de demagogos como o Senador Ted Cruz (Texas)[1], por vezes o Tea Party ceifa também à direita, eliminando nas primárias expoentes moderados do GOP e, em consequência, dando a eleição (as mais das vezes para o Senado) de bandeja para próceres do Partido Democrata (que agradecem penhorados o ‘favor’ da direita raivosa de afastar respeitados representantes republicanos, a que dificilmente conseguiriam vencer nos comícios de novembro).

       Essa crise permanente e sistêmica decorre de um fato que articulistas de nomeada têm assinalado. Por causa de 2010, e de sua avalanche conservadora, a Casa do speaker John Boehner não mais representa o sentir médio da cidadania estadunidense. Daí, o radicalismo – que na primeira crise, em 2011, levou de roldão ao 44° Presidente, com queda abismal em sua popularidade.

       A despeito de suas características e do próprio temperamento, Barack Obama aprendeu a ser mais enérgico, e assim a dominar os próprios demônios. Prova convincente disso foi a sua reeleição em 2012 contra o republicano Mitt Romney, desmentindo assim o célebre mantra de Mitch McConnell, líder da minoria no Senado: incumbe fazer de Barack Obama presidente de um só mandato.

      A tal respeito, sobrepaira nos Estados Unidos a nuvem negra da não-reeleição: em geral, atinge a mandatários malogrados na prática, como James Buchanan (1857-1861)  (às vésperas da Guerra Civil), Herbert Hoover (1929-1933) (vencido pela grande Depressão), Jimmy Carter (1977-1981) (marcado por falta de autoridade, apesar de deixar legado relevante), e o primeiro Bush, i.e. George H.W.Bush (1989-1993) (a recessão deu a vitória a Bill Clinton).

        Quanto às vindouras eleições intermediárias de 2014, a história não costuma ser leniente com um presidente em segundo mandato, que é geralmente havido na experiência política americana como relativamente enfraquecido. É lógico que tal regra admite exceções e a principal delas é Franklin Delano Roosevelt, que pela sua personalidade, autoridade e bom governo abriu em Washington um longo período de domínio democrata, que se refletiu nas duas Câmaras e na própria Corte Suprema, apesar de o 32°  presidente (1933-1945) nela enfrentar a princípio a grande adversária para o seu programa do New Deal.  FDR pensou em aumentar o número dos juízes, mas a reação desfavorável o levou a recuar. Resolveria o problema com a caneta, dado o fato de ter sido o presidente com mais longa permanência na Casa Branca. Morreu em abril de 1945, vítima de fulminante derrame (o que hoje se chamaria AVC).

         Sucedido pelo então obscuro Vice-Presidente Harry S Truman, o Partido Democrata perderia a maioria no Congresso em 1946. Truman, que se afirmou pela personalidade e a disposição de enfrentar a maioria no Congresso – que apelidou de faz-nada (do nothing) logrou, contra as expectativas superar a Thomas E. Dewey em 1948. Desta eleição resta a famosa barriga do Chicago Tribune na manchete Dewey defeats Truman, mostrada por um sorridente presidente.

        As atuais previsões apontam, com um viés pró-GOP, para um eventual resultado misto. Para ganhar a maioria no Senado, o Partido Republicano precisaria vencer com vantagem de pelo menos seis cadeiras.  Por isso, a possibilidade é grande de que os democratas logrem manter-se com maioria no Senado, ainda que diminuída. Ironicamente, o líder da minoria Mitch McConnell tem pela frente uma difícil luta para manter a sua cadeira pelo estado do Kentucky. Se for derrotado, a conquista da maioria no Senado fica ainda mais problemática para o GOP.

        Se a reconquista da Câmara de Representantes não é uma missão impossível  para os democratas, tampouco ela é  fácil. Isto se deve ao guerrymandering[2] que 2010 tornou possível. Para recuperar a Casa e ter de volta Nancy Pelosi como Speaker, o Partido Democrata precisa vencer em um total de mais dezessete cadeiras das que possui atualmente (hoje, os republicanos tem bancada de 233 e os democratas, 200. Existe uma vaga a ser preenchida e não há nenhum deputado independente).

       Na última eleição, houve uma redução na bancada republicana, devida a várias derrotas de representantes do Tea Party. No entanto, a virada de mesa pelos democratas tem uma dificuldade adicional pela artificialidade do desenho de muitas circunscrições, com vistas a favorecer o GOP.

        Nos comícios de novembro, pelas características das intermediárias, pesam sobretudo assuntos locais, assim como é menor a influência do presidente, mormente quando adentra o seu último biênio. De qualquer modo,  a reforma sanitária (o ACA -  Affordable Care Act ou Obamacare, designações aplicáveis segundo a posição política do cidadão) pode ser julgada pelos óbvios benefícios que trouxe para a cidadania, abrindo a cobertura do seguro médico para muitos que não dispunham de sua proteção. Ou então, pelo seu desajeitado começo, através de  site impróprio e burocrático, por força de um descuido típico da Administração Obama (como diz Bill Clinton, faz o difícil e descura do fácil). Essa situação, no entanto, já foi superada. Resta apenas o mal-estar de ter-se inscrito a princípio com dificuldade em um site organizado por burocratas, sob a inepta direção da Secretária de Saúde, Kathleen Sebelius. Na terra do vale do Silício, tais confusões só são imagináveis sob Barack Obama...

         Como o leitor há de presumir, é ainda cedo para prognósticos mais definidos. Quanto à reforma da saúde, no entanto, com o passar do tempo e o funcionamento normal do site (como já felizmente ocorre) os raivosos ataques dos republicanos tenderão a perder muito de sua força.

(Fontes: The New York Times;The New York Review of Books)



[1] A quem muitos vêem similitudes com outro demagogo da direita, o também Senador Joseph McCarthy (que deu nome ao macarthismo)
[2] Redesenho fraudulento das circunscrições eleitorais, feito de modo a favorecer um determinado partido.

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