As eleições intermediárias nos
Estados Unidos costumam favorecer a oposição, que, no momento, é o Partido
Republicano, acolitado pela facção do Tea
Party (que teve o seu melhor momento em 2010 e vem decaindo nos anos
subsequentes).
Por falar em
2010 – que foi a precedente eleição intermediária – pelo relativo autismo da
Casa Branca de Barack Obama no biênio
2009/2010, o seu desastroso resultado para o Partido Democrata (o famigerado shellacking, de que falou o Presidente)
determinou a crise quase-permanente em Washington, com a passagem do mando na
Casa de Representantes para o GOP.
Tal maioria, como é notório, foi dominada pelo Tea Party, um movimento de agressivo reacionarismo. A par de ajudar
a eleição de demagogos como o Senador Ted
Cruz (Texas)[1], por vezes o Tea Party ceifa também à direita,
eliminando nas primárias expoentes moderados do GOP e, em consequência, dando a eleição (as mais das vezes para o
Senado) de bandeja para próceres do Partido Democrata (que agradecem penhorados
o ‘favor’ da direita raivosa de afastar respeitados representantes
republicanos, a que dificilmente conseguiriam vencer nos comícios de novembro).
Essa crise
permanente e sistêmica decorre de um fato que articulistas de nomeada têm
assinalado. Por causa de 2010, e de sua avalanche conservadora, a Casa do speaker John Boehner não mais representa o sentir médio da cidadania
estadunidense. Daí, o radicalismo – que na primeira crise, em 2011, levou de
roldão ao 44° Presidente, com queda abismal em sua popularidade.
A despeito de
suas características e do próprio temperamento, Barack Obama aprendeu a
ser mais enérgico, e assim a dominar os próprios demônios. Prova convincente
disso foi a sua reeleição em 2012 contra o republicano Mitt Romney, desmentindo assim o célebre mantra de Mitch McConnell,
líder da minoria no Senado: incumbe fazer
de Barack Obama presidente de um só mandato.
A tal respeito,
sobrepaira nos Estados Unidos a nuvem negra da não-reeleição: em geral, atinge
a mandatários malogrados na prática, como James
Buchanan (1857-1861) (às vésperas da
Guerra Civil), Herbert Hoover
(1929-1933) (vencido pela grande Depressão), Jimmy Carter (1977-1981)
(marcado por falta de autoridade, apesar de deixar legado relevante), e o primeiro Bush, i.e. George H.W.Bush
(1989-1993) (a recessão deu a vitória a Bill
Clinton).
Quanto às vindouras eleições
intermediárias de 2014, a história não costuma ser leniente com um presidente
em segundo mandato, que é geralmente havido na experiência política americana
como relativamente enfraquecido. É lógico que tal regra admite exceções e a
principal delas é Franklin Delano
Roosevelt, que pela sua personalidade, autoridade e bom governo abriu em
Washington um longo período de domínio democrata, que se refletiu nas duas
Câmaras e na própria Corte Suprema, apesar de o 32° presidente (1933-1945) nela enfrentar a
princípio a grande adversária para o seu programa do New Deal. FDR pensou em aumentar o número dos
juízes, mas a reação desfavorável o levou a recuar. Resolveria o problema com a
caneta, dado o fato de ter sido o presidente com mais longa permanência na Casa
Branca. Morreu em abril de 1945, vítima de fulminante derrame (o que hoje se
chamaria AVC).
Sucedido pelo
então obscuro Vice-Presidente Harry S
Truman, o Partido Democrata perderia a maioria no Congresso em 1946.
Truman, que se afirmou pela personalidade e a disposição de enfrentar a maioria
no Congresso – que apelidou de faz-nada (do
nothing) logrou, contra as
expectativas superar a Thomas E. Dewey em 1948. Desta eleição resta a famosa
barriga do Chicago Tribune na
manchete Dewey defeats Truman,
mostrada por um sorridente presidente.
As atuais
previsões apontam, com um viés pró-GOP, para
um eventual resultado misto. Para ganhar a maioria no Senado, o Partido
Republicano precisaria vencer com vantagem de pelo menos seis cadeiras. Por isso, a possibilidade é grande de que os
democratas logrem manter-se com maioria no Senado, ainda que diminuída.
Ironicamente, o líder da minoria Mitch
McConnell tem pela frente uma difícil luta para manter a sua cadeira pelo
estado do Kentucky. Se for derrotado, a conquista da maioria no Senado fica
ainda mais problemática para o GOP.
Se a reconquista
da Câmara de Representantes não é uma missão impossível para os democratas, tampouco ela é fácil. Isto se deve ao guerrymandering[2]
que 2010 tornou possível. Para recuperar a Casa e ter de volta Nancy Pelosi como Speaker, o Partido Democrata precisa vencer em um total de mais
dezessete cadeiras das que possui atualmente (hoje, os republicanos tem bancada
de 233 e os democratas, 200. Existe uma vaga a ser preenchida e não há nenhum
deputado independente).
Na última
eleição, houve uma redução na bancada republicana, devida a várias derrotas de
representantes do Tea Party. No
entanto, a virada de mesa pelos democratas tem uma dificuldade adicional pela
artificialidade do desenho de muitas circunscrições, com vistas a favorecer o GOP.
Nos comícios de
novembro, pelas características das intermediárias, pesam sobretudo assuntos
locais, assim como é menor a influência do presidente, mormente quando adentra
o seu último biênio. De qualquer modo, a
reforma sanitária (o ACA - Affordable Care Act ou Obamacare, designações aplicáveis
segundo a posição política do cidadão) pode ser julgada pelos óbvios benefícios
que trouxe para a cidadania, abrindo a cobertura do seguro médico para muitos
que não dispunham de sua proteção. Ou então, pelo seu desajeitado começo,
através de site impróprio e burocrático, por força de um descuido típico da
Administração Obama (como diz Bill
Clinton, faz o difícil e descura do fácil). Essa
situação, no entanto, já foi superada. Resta apenas o mal-estar de ter-se inscrito
a princípio com dificuldade em um site
organizado por burocratas, sob a inepta direção da Secretária de Saúde, Kathleen
Sebelius. Na terra do vale do Silício,
tais confusões só são imagináveis sob Barack Obama...
Como o leitor
há de presumir, é ainda cedo para prognósticos mais definidos. Quanto à reforma
da saúde, no entanto, com o passar do tempo e o funcionamento normal do site (como já felizmente ocorre) os
raivosos ataques dos republicanos tenderão a perder muito de sua força.
(Fontes: The New York Times;The New York Review
of Books)
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