quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Obama e Tsipras

                                                 

         O poder dessas duas personalidades não pode ser comparado em percentuais mensuráveis. E, no entanto, há uma semelhança, ainda que esquiva, entre esses dois políticos. Iniciaram a respectiva trajetória  como autênticos outsiders. Barack Obama, desde o seu discurso no Senado condenando a aventura americana no Iraque, tocara em nota sensível, que ressoaria através da longa preparação para as primárias do Partido Democrata, e por fim o levaria a alcançar dura vitória sobre a inicial favorita nas pesquisas, Hillary Clinton.
         Ontem, Obama pronunciou o seu sexto discurso sobre o estado da União, e o fez ao iniciar o seu derradeiro biênio na Casa Branca. Ao invés de acomodar-se, o 44º presidente optou por uma intervenção que em nada semelha com uma alocução por um presidente que já se sente em fim de mandato.

         A relação de Obama com o Congresso nunca foi fácil. O modelo mais marcante nesse contexto, será sempre o democrata Lyndon Johnson. Líder da maioria no Senado – em momento quando o Partido Democrata dominava os dois ramos do Legislativo – Johnson foi um dos mais poderosos chefes do partido democrata, e através de um conjunto de dotes sabia arrancar de sua bancada o apoio indispensável para conquistas memoráveis do Legislativo. Para tanto, Johnson não escatimava esforços, chegando até a empregar a linguagem corporal, como se verifica na antológica série de fotos de uma conversa dele Johnson enquanto líder da maioria com um até então reticente senador da bancada sulista democrata. Na série se verifica o efeito avassalador da palavra – mesmo em encontro de corredor – de Johnson sobre o companheiro de partido, que por contingências eleitorais duvidava em apoiá-lo. Ao fim, se intui que Lyndon Baynes Johnson uma vez mais imprime a sua vontade no correligionário antes pendente entre a abstenção e o voto contrário.
        Quando alcançou a presidência, pela prematura morte de John F. Kennedy, Lyndon Johnson levaria para o Capitólio um pouco da desenvoltura do passado líder da maioria.

         Infelizmente, a relação de Barack Obama com o Congresso não se pode comparar com a do seu antecessor, o texano Johnson.  Obama, lançado pelo discurso contra a guerra do Iraque, nunca teve na Câmara Alta posição de influência que se possa comparar à de Lyndon. Nos dois mandatos, a sua posição como Presidente foi condicionada de uma parte, pelo virtual desaparecimento do espírito do bipartidismo (bastante presente na época de Johnson) e pelas alternas fortunas das bancadas democratas no Senado e na Câmara.

          Obama dispôs de maioria democrata no Senado e na Câmara apenas no primeiro biênio (2009-2010). Os democratas perderam o controle da Câmara pela tunda (shellacking) de novembro de 2010, resultado em parte da inexperiência do novel Presidente.  E pelo visto só conquistarão nova maioria na Câmara Baixa depois de novo censo (na década de vinte) que eventualmente corrija a atual distorção que garante sólida maioria ao GOP. Por sua vez, os democratas lograram manter maioria no Senado até janeiro corrente, quando, derrotados em novembro passado pelos republicanos, se viram em minoria, passando a liderança na Câmara Alta do democrata Harry Reid, de Nevada, para o republicano Mitch McConnell, do Kentucky. Assim, Obama, com o Congresso democrata, alcançou duas grandes conquistas no Legislativo a Reforma Sanitária (chamada pelo GOP de Obamacare) e a lei sobre o sistema financeiro (Wall Street).  Também foi votada importante lei com fundos para setores mais atingidos pela Crise Financeira surgida em 2008.
             Obama não tem entre suas qualidades a capacidade de influenciar os senadores, seja na bancada, seja individualmente.  O seu estilo difere totalmente do de Lyndon Johnson, e assim os resultados de uma eventual liderança são de difícil aferição.

             Surgiu ele como líder de geração jovem, com o seu repúdio da guerra no Iraque.  Sua postura um tanto  distante, e a falta de inclinação para empregar o poder presidencial como instrumento político em relação às bancadas no Senado e na Câmara, contribuíram em parte para resultado legislativo que se afigura medíocre se afastarmos os dois anos em que o Partido Democrata tinha os votos para converter em lei projetos na Câmara e no Senado. Com 2011 em diante, entramos em fase aguda da paralisia parlamentar, por efeito do domínio republicana na Câmara.
              Mas não esqueçamos a comparação com Alexis Tsipras. Tanto Barack Obama, quanto Tsipras são homines novi, vindos da esquerda (que equivale ao liberalismo nos EUA). Se a presidência terá modificado o Senador Obama, o ponto de partida de sua trajetória política será o liberalismo democrático, que é o quanto  posições de esquerda nos Estados Unidos podem almejar na conquista do poder.

                Assim, com a liberdade das necessárias adaptações às realidades de cada país, Alexis Tsipras pode ser considerado hoje, com o seu percentual de 33,1% das intenções de voto o que Barack Obama prefigurava na véspera da Convenção Democrata, com a sua maioria relativa de delegados – politicamente ascendente, mas ainda dependente de apoios de última hora.    

                Se os totais aparentemente não bastavam para garantir matematicamente a vitória, pela tendência ao crescimento apontavam para a probabilidade da conquista num caso da indicação para a candidatura do partido democrata (a votação final contra o republicano  John McCain foi apenas um complemento do triunfo anunciado).

                 Nesse quadro, soa similar a assertiva de Nikos Marantzidis, cientista politico da Universidade da Macedônia: “Seria muito, muito difícil para a Nova Democracia (de Antonis Samaras, o atual Primeiro Ministro) reverter a liderança do Syriza (e a vitória de seu líder Alexis Tsipras). Só um evento democrático imprevisto  natureza pode mudar o cenário agora”.

                 Com a conquista de 147 assentos em Parlamento de 300 representantes, Alexis Tsipras está a um passo da conquista da maioria e da consequente condição de chefe de gabinete com o número de votos para ser convocado pelo Presidente da República.

 

( Fonte:  O Estado de S. Paulo )

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