sexta-feira, 22 de novembro de 2013

De tanto puxarem, a corda rebentou

                               

        Que o espírito do bipartidismo e a presunção de que Governo e oposição devem ter sempre presente a premissa de que Democratas e Republicanos servem ao mesmo país, e daí a necessidade de jamais esquecer o interesse nacional, que sobreleva àqueles de partido ou facção, que esse espírito desde muito se ausentara da colina do Capitólio, eis  verdade factual que o comportamento do GOP na oposição cuidou de observar diuturna e acintosamente.
        Todo o exagero e todo o extremismo carregam dentro de si o germe de sua própria destruição. O líder da maioria, o Senador Harry Reid (Nev/Dem.) evidenciou por muito posição moderada que  sua contraparte, o Líder da Minoria, Senador Mitch McConnell, terá confundido com fraqueza.

       Pelo regimento do Senado, até ontem, o debate – e, por conseguinte, a prática do filibuster – só poderia ser encerrado por sessenta votos (o Senado, presidido pelo Vice-Presidente, tem cem senadores). Essa regra estava em vigor desde 1975. Anteriormente, entre 1917 e 1975, a maioria exigida para tanto era de dois terços.
       O sistemático abuso pelos opositores republicanos do filibuster – que era utilizado precipuamente para bloquear as designações para cargos no executivo e no judiciário – forçou, por fim, o líder da maioria a ter de pôr em votação proposta de mudança da regra no regimento do Senado: se aprovada, passaria a valer a maioria simples, i.e., 51 votos.

       A estratégia do GOP havia sido até então a do bloqueio cego das designações da Administração Obama, tanto para o poder Executivo (e há 1183 cargos que requerem confirmação pelo Senado), quanto para o Judiciário.  Em política de terra arrasada, os candidatos não eram avaliados pelo GOP por suas qualificações e eventuais antecedentes. O partido Republicano se limitava a bloquear, por intermédio do filibuster,  as nomeações, sem preocupar-se em fundamentar a motivação dessa postura, que só é cabível quando a fé de ofício ou os antecedentes do indicado militam contra a respectiva confirmação.
       A obstrução das nomeações tornou-se  a regra do GOP na oposição. Dado o cinismo desta posição – que racionalmente não se sustenta – e a enorme diferença com o comportamento dispensado a presidentes anteriores, a única surpresa na mudança da regra quanto ao filibuster se encerra na pergunta – por que a modificação demorou tanto para ser implementada ?

       Quando o líder Harry Reid se decidiu a agir, havia em pauta, pendurados pela recusa do GOP,  59 designações para cargos no Executivo e 17  para o Judiciário Federal.
       Como o seu afrontoso desrespeito ao espírito parlamentar se estendera durante a primeira Administração Obama (com 27 filibusters para cargos no Executivo), o GOP terá pensado que pela ameaça de retaliações futuras lograria manter o bloqueio a que o governo Obama pudesse atuar normalmente, em consequência da vitória nas urnas em 2012.

       Para que se tenha idéia de o quanto pesou na balança o abuso do ‘veto’ da bancada do GOP para que Obama governe, semelha relevante assinalar que o Presidente Barack Obama, no segundo mandato, já teve 45 nomeações para o Executivo contestadas por filibuster !  Em contraposição, Eisenhower (Rep.), Kennedy (Dem.), Johnson (Dem.), Nixon (Rep.) e Ford (Rep) não tiveram nenhuma contestada. Em tempos mais próximos, Carter (Dem.) teve duas, Reagan (Rep.) também duas, Bush sênior (Rep.) nenhuma, Bill Clinton (9), Bush júnior (7) e Obama, com os já citados 27 e 45 (na primeira e segunda Administrações).
       A maior ironia é que foi no judiciário a última palha que levou o líder democrata a pôr em votação a mudança regimental (e apenas três democratas dissentiram do chefe), com a votação por 52 a 48 determinando a mudança da regra para encerrar o filibuster por maioria simples.  Havia três vagas na Corte distrital de Washington, em nível de tribunal de recurso. Para não preencher as vacâncias, os republicanos chegaram a propor que o efetivo dessa corte fosse reduzido em três! O interesse estava apenas em manter o viés conservador – dado por Bush júnior – a esse importante tribunal distrital.      

       O erro do Senador Mitch McConnell foi o de pensar que a sua estratégia de bloqueio virtual da Administração Obama – em postura que relembra o seu lema anterior de impedir a reeleição do 44º presidente, e de tornar Obama presidente de um só mandato, falhou pela debacle do candidato republicano Mitt Romneypoderia em sã mente prevalecer indefinidamente.
        Foi com ameaças que o líder da minoria recebeu a derrota: “Pensam que isto (a mudança na regra do filibuster) é o melhor para o Senado e o Povo Americano ? Vocês (os senadores democratas) vão lamentar isto. E vocês podem lamentá-lo mais cedo do que pensam.”

        Ao enrijecer as regras e passar para a tática de não permitir que a Administração Obama possa governar, o Partido Republicano, estimulado talvez pela húbris, pensou que poderia converter a excepcionalidade em norma básica e corriqueira. Quem desconhece os limites do bom senso, bem cedo será levado a deles tomar conhecimento em condições bastante mais desfavoráveis.

 

 
(Fonte: New York Times)              

Nenhum comentário: