Havendo resistido a
tantas guerras, inclusive as do século XX, a
Catedral de Notre Dame, esta gigantesca construção da Paris medieval,
ora se debate em meio a descomunal incêndio, que surpreende pela rapidez com
que as chamas se espalharam pela gótica beleza dessas pedras milenares.
Os bombeiros parisienses se
empenham em luta ingrata, diante desse ícone das ilhas do Sena da Cidade
antiga, essa avultada, maciça presença do gótico medieval, que nas sombras de Lutetia parece consumir-se nas espiras
que tombam, ela que atravessara indene a longa noite da Idade Média, ora se contorce
presa de um impio fogaréu, que se refugia nas remanescentes vigas e frageis
braços de madeira, ressecados pelos séculos,
enquanto os povos de Paris que hão de ter deparado cenas horrendas, e
revoluções assassinas, e, sem embargo, a deixaram indene, como aquele vulto
sombrio que sauda os viajantes em meio à noite nem sempre cintilante, mas às
vezes estrelada, nos caprichos da Cidade
Luz.
Esse hierático espetáculo a que
sempre acorreram os viajantes, mesmo em trêmulas vigílias e nas trevas de céus
enfarruscados, e que na Paris das luzes medievais e nas iluminadas, quase
feéricas sombras da Cité Lumière, hoje o mundo, unido por essa esgarçada e
modernosa gambiarra das luzes e dos holofotes, se debate sob a esperança de que
a pedra, nas suas torres enegrecidas pela marca dos séculos, possa de algum
modo manter-se de pé, para que o místico milagre desses muros e rípidas paredes
venham a ser salvo pela aliança de mestres bombeiros que desejam preservar esta
hierática presença da Idade Média e da sua fé amiúde estranha, no mundo de
luzes que faz tempo a abraça em meio às ambiguidades do turismo e de suas bizarras,
desengonçadas procissões.
(
Fonte: CNN )
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