terça-feira, 23 de julho de 2013

Papa Francisco entre nós

                                        
        O avião da Alitalia que nos trouxe o Papa Francisco chegou com cerca de trinta minutos de antecipação. É o efeito dos ventos favoráveis – os chamados ventos de cauda – que volta e meia encurtam o tempo das longas trajetórias transoceânicas.
        As multidões que o acolheram no caminho para a catedral foram mais uma vez prova de sua grande simpatia humana. Será talvez por força dessa singular qualidade, que o pontífice não admite qualquer cerceamento de seu contato com os fiéis.
        Sua Santidade se recusa a fechar-se por trás de janelas que  impeçam a  visão do povo. Tampouco admite a utilização do Papamóvel com proteções antibalísticas. Colocando o inegável carisma a serviço pastoral, Papa Francisco irrita as autoridades encarregadas de sua segurança.
         Não há negar o estresse a que submete os homens de preto, encarregados  de sua proteção. Por injunção profissional, eles vêem  todo ardoroso fiel que se aproxima da viatura pontifícia como potencial ameaça.
         Subtraindo o Papa à cercania das multidões,  sua tarefa se veria decerto facilitada. Não há negar, por outro lado, que desde o atentado do turco Ali Agca em 1981, na praça de São Pedro, que por pouco não cometeu o magnicídio, e que iria debilitar de forma irreversível a saúde do Pontifice  para o restante de seu pontificado. Nesse sentido, o Papa João Paulo II aceitou a blindagem de proteção,bem como o sucessor Bento XVI.
          Conforme  seu estilo, Papa Francisco não receia os banhos de multidão. Dadas a  simpatia e a impressionante comunicação com os fiéis, compreende-se que assim seja. Agora, para os exaustos seguranças, o ‘perigo’ não vem mais das efusivas demonstrações das freirinhas, mas ele é apanágio da multidão, como se viu ontem, tanto pelas confusões aprontadas pela prefeitura – que aumentou exponencialmente o stress dos pobres seguranças, ao ensejar que a viatura pontifícia ficasse submetida a  engarrafamento no trânsito por quinze minutos – quanto pela natural e incontrolável simpatia do Santo Padre.
           Se esta é a vontade de Francisco, vamos respeitá-la, confiados no carinho e na efusão dos peregrinos da Jornada Mundial da Juventude, além de não menos desse povo carioca, cuja boa disposição é proverbial. Dadas, no entanto, as humanas exceções, os banhos de multidão continuarão a despertar compreensíveis angústias naqueles senhores de terno escuro a correrem no entorno da viatura da alta autoridade, assim como a olhares nervosos para os braços estendidos, as efusões transbordantes, o onipresente cerco das aglomerações e até os inocentes bebês ofertos à benção do Santo Padre.
           Em um tempo onde as autoridades se curvam dóceis diante dos férreos ditames da segurança, surge um senhor vestido de branco que se recusa a obedecer-lhes as regras, por acreditar na bondade, na admiração e na generosa entrega das multidões de fiéis àquela personalidade que, por fé e tradição milenares, não teme infringir às disposições da proteção a que tantos outros não se atrevem a ignorar.
          Se nos condoemos do stress dos homens de preto, na sua frenética corrida, a ladear o veículo pontifício, e achamos até graça nos histéricos gestos de tais seguranças, na sua baldada tentativa de afastar todo o afeto que se encerra em multidão enlouquecida pelo entusiasmo de poder festejar a passagem do risonho e simpaticamente envolvente Papa Francisco !
        Não há negar a serena coragem do Sumo Pontífice que desce de seus estrados e alturas para tornar-se  memorável presença na admiração dos fiéis, a quem dispensa a bênção de um convívio, que por ser breve não perde a força, nem o estranho poder de vencer o efêmero e de transmitir a cada um a imagem singular e perene do Papa que não teme estar na companhia de estranhos, por transformá-los em discípulos, através da dádiva singela de epifania feita de coragem,  humildade e contagiante simpatia.
 

 
( Fonte:  Rede Globo )