quinta-feira, 18 de julho de 2013

Governo à Deriva ?

                       
                                       
        Com as passeatas de junho, um regime que vivia alegremente fora da realidade foi brutalmente acordado. Talvez a salva inicial haja sido a vaia no Mané Garrincha. Ao lado do gnomo Joseph Blatter, se mostrou à Presidenta haver terminado a longa sazão do oba-oba.
        Embalados pelos céus de brigadeiro das pesquisas, e sob a toada de tudo vai bem senhora marquesa, a pupila de Lula da Silva e os alegres compadres de Brasília cuidavam ou de legislação tipo Armando Falcão, para barrar o caminho de candidatos de oposição (leia-se Marina Silva) ou trocavam o fogo amigo do corporativismo.
       O despertar do povo será sempre inesperado. A soberba da rotina ignora, fundada em anos de pasmaceira, o que mais tarde parecerá óbvio para os argutos observadores do dia seguinte. Outro aviso a que os órgãos de segurança não dão a atenção merecida será o dito pugilístico de que só se vai a nocaute por um murro que não se sabe de onde saíu.  
      Com o devido respeito, foi o que sucedeu com o movimento do passe livre. Por um tempo, a circunstância da soberania popular, constante da Constituição, não foi apenas um atributo a ser esgrimido pelos descontentes. Graças a ela, desmoronou a absurda Pec-37, que se propunha emascular o Ministério Público. Anunciam também a introdução do voto em aberto para as cassações de mandato, que há muito dormia nas gavetas das presidências do Congresso, assim como se votou a redução para único suplente, podando a anterior excrescência jurídica nos suplentes de senador. Excetuada a manutenção dos poderes do MP, as demais ainda dependem de votações suplementares.
       O grito das ruas, que os palácios de Brasília parecem ouvir, também terá evitado outra sandice dos senhores congressistas, que estariam a considerar – há muitos barrados no Congresso pela Lei da Ficha Limpa para ulteriores aventuras eleitorais – introduzir emendas à dita Lei Complementar 135 de 2010, embalados pela anterior cancela aberta aos chamados fichas-suja.
      Para quem estava montada na virtual certeza da reeleição em primeiro turno, a presidenta levou um choque e tanto. De repente, despencou – e continuaria a cair  - nas pesquisas, quem se julgava em condições de ter uma relação, no limite do antagonismo, com os partidos políticos, a ponto de colecionar derrotas no Congresso quem tem, no papel, enorme maioria parlamentar, além de pesar no Tesouro com a escrachada fisiologia de 39 ministérios.
       Por outro lado, a resposta do Planalto à crise foi constrangedora. A par da inépcia no tratamento das propostas de Constituinte exclusiva e de convocação de plebiscito – ou será melhor um referendo? – ou do singular recurso aos favoritos – Aloisio Mercadante, na área política, e Arno Augustin, na econômica – que dissimulará o atarantamento na liderança.
       Lula da Silva, que ora nos deita falação através do New York Times, nos deu uma anti-lição em termos de democracia. Eleger postes por esses brasis afora não é prova de maturidade democrática, e sim de subdesenvolvimento. Os equívocos políticos de Dilma Rousseff não podem ser sanados pelo maximato de Lula, nem com consultas às pressas, como se a função presidencial não carecesse de um longo preparo político.
       No final de contas, malgrado a empáfia, os grandes erros são em geral atribuíveis à falsa onipotência do alegado benfeitor. Tudo leva a crer que Nosso Guia ignorou vários pareceres negativos quanto à aptidão de sua candidata de algibeira para o cargo. Há suspeitas de que a indicação se deva menos à capacidade da Chefe da Casa Civil, do que  a considerações pessoais, com sua maior dependência no caso de eventual retorno ao Palácio do Planalto de Lula da Silva. Em outras palavras, a sua responsabilidade é ainda mais acentuada, porque, se dermos tento a essa conjectura, ele subordinou uma indicação desta magnitude ao  próprio interesse.
       Ao aproximar-se o ano eleitoral, Dilma Rousseff não está mais montada em totais que lhe assegurem seja o triunfo no primeiro turno, seja até mesmo o prosseguimento da queda livre. Enfraquecida a candidatura, as alianças se tornam mais reticentes, na linguagem sem rebuços do interesse político preponderante.
       A par da inflação, que constituirá a ameaça mais séria, atendida a forma irresponsável que a trouxe de volta, na antecâmara do gabinete, há outras presenças incômodas, como a continuada fraqueza na economia, com demasiados truques fiscais, a possibilidade de um grande déficit na balança comercial – que costuma ser a nossa salvação da lavoura – além da impressão de desgoverno que, por difusa, constitui quiçá o principal mouro na costa.
       Não será através da convocação de reuniões com entidades chapa-branca que Dilma há de recuperar a liderança, e transmitir a impressão de que está à testa das grandes questões. Chefes de gabinete passam assuntos adiante ou os encaminham ao martelo de autoridade superior. Presidentes ou decidem ou fazem acontecer. Em última análise, a sociedade espera da Presidente mais do que autoridade, e sim liderança. Que, se for delegada, deixa de sê-lo. Olheiras e determinações desatendidas, passam mensagem inversa  e tendem a excitar as ambições de outrem.        

 

 
(Fontes: O Globo (R.Noblat), Folha de S. Paulo )

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