O Congresso brasileiro terá perdido rápido demais o medo das passeatas de junho ?
Recordam-se da presteza com que merecidamente jogaram às urtigas a PEC 37, que desejava emascular o Ministério Público ?
Pois, agora, a par de umas tantas inconsequentes mesuras, Câmara e Senado voltam ao autismo anterior, enterrados no corporativismo desenfreado, que não é senão a outra face da corrupção, que o Povo brasileiro detecta nos partidos políticos ?
Na Câmara, Henrique Alves preside ao desmanche das iniciativas da Presidente Dilma Rousseff, que ambicionava passar para o Congresso a ânsia das ruas por reformas, segundo uns, ou cavalgar o corcel das mudanças no figurino petista, conforme outros.
Para que fossem repelidas, terá ajudado decerto de um lado a pressa na apresentação, que as tornou vulneráveis aos primeiros obstáculos. Assim, a Constituinte exclusiva não durou uma jornada sequer; e o plebiscito se atolou nos prazos, esgrimidos seja pelo tribunal competente, seja por aqueles avessos às reformas propostas.
Passados uns poucos dias do movimento de junho, semelha que o medo dos senhores congressistas já se evaporou. Com a empáfia de antes fazem o enterro do dito plebiscito, que em poucos dias perdeu a força. Será difícil, no entanto, discordar do modo inepto e desastrado, com que foi encaminhado, chegando até a ser vítima do fogo amigo dos dúbios parceiros antes mesmo de bater às portas dos senhores congressistas.
No primeiro momento, na Constituinte exclusiva, a Presidenta – que não refletira sobre o tema com a atenção e o empenho desejáveis – abandonou a ideia no curso de uma jornada, o que, além de livrar a turma do statu quo das reformas que a atual situação exige, sinalizou para os opositores a inaudita facilidade de contê-las e desfazê-las, como de resto os eventos subsequentes o confirmariam.
Para quem é tanto temida pelos colaboradores diretos, surpreende a timidez e a insegurança da mandatária. Se se deseja montar o corcel dos anseios do Povo, tanto a indecisão, quanto eventuais suspeitas de manipulação, tem de ser de pronto rejeitadas, de forma clara e inequívoca. A liderança é um atributo raro, que não menospreza a oportunidade e o justo clamor dessa nova manifestação democrática, que é o movimento de rua.
Ao invés disso, vimos todos Dilma Rousseff enlear-se e hesitar diante dos expertos reclamos de quem se servia mais da ousadia do que das prerrogativas legais. Falta de experiência, titubeou, ela que detinha a força inercial e incoercível da mudança necessária. Ao hesitar, ela se deixou envolver pelos liames dos defensores do statu quo. Ao assim proceder, cedeu a iniciativa e sinalizou aos timoratos que a hora das reformas podia ser postergada, para o quase geral alívio dos alegres compadres de Brasília.
A linguagem dos símbolos está aí. Até livrar-se desta excrescência jurídica que é a escrachada figura de suplente de senador, o Senado não conseguiu. Houve 46 votos em favor da PEC, mas com sessenta e quatro presentes, a votação não logrou atingir a maioria constitucional para a aprovação, que seria de 49. E a provocação não para aí: oito suplentes votaram em causa própria, para derrubar a PEC !
Na verdade, o projeto de emenda constitucional não satisfazia. Escamoteia a necessidade de abolir a figura do suplente, ao dispor que o titular indique apenas um, que não seja seu parente. O que é necessário é extirpar as raízes patrimonialistas. O Senador titular não deve ter direito de indicar qualquer suplente. No caso de seu impedimento, nada como uma eleição especial para que seja escolhido pelo povo o substituto para o restante do mandato.
Não tenho dúvidas de que esses senhores não lograrão agarrar-se por muito a regalias patrimonialistas como a do estatuto dos suplentes. Para tanto, como na Lei da Ficha Limpa, será necessário que se faça ouvir o vozeirão rouco das ruas. Sem ele, não há salvação, como a atitude da Presidente da República, retirada da algibeira de Lula, o demonstrou, uma vez mais, para nosso desconforto e funda decepção.
(Fonte: O Globo on-line )
Nenhum comentário:
Postar um comentário