quarta-feira, 11 de setembro de 2013

O Senso do Ridículo

                                         

        Das motivações do Decano Celso de Mello e do Ministro Marco Aurélio Mello, que não creio sejam parentes, talvez seja um pouco tarde para experimentá-las, mas ninguém há de negar que se voltem para o exercício intelectual e jurídico. Há, no entanto, outros que perseguem fins diversos. Há de esperar-se, contudo, que não logrem êxito, porque os seus objetivos não são os da opinião pública. Por obra e graça da tevê Justiça, a sociedade tem acompanhado a longa marcha da Ação Penal 470, e boa parte dela se tem identificado com o avanço da causa, e com a maioria de ministros que a afirmou.
         Afinal, chegamos ao acórdão, que é a sentença com as respectivas votações, as penas cominadas, e os votos respectivos que as embasaram. Para perplexidade de muitos, a publicação do acórdão não significa a sentença definitiva, eis que faltavam ainda os embargos de declaração. Seria mais exercício intelectual do que jurídico, se ao prolongado juízo do mensalão não correspondessem as aposentadorias compulsórias dos ministros (Cezar Peluso e Ayres Britto). Como se tem verificado, algumas das sentenças do Supremo se tornaram questionáveis, não por erros de fato ou de direito, mas simplesmente pela circunstância de que, em alguns casos, pela partida dos ministros, não havia mais na Corte a maioria necessária para eventualmente confirmar esta ou aquela sentença. Entrava-se, por isso, em um paraíso dos advogados de defesa, eis que, pelos caprichos atuariais, ao invés do mármore ático, a Corte tinha um palimpsesto pela frente.
         Nesta semana, adentramos o espaço dos chamados embargos infringentes. Tais embargos oferecem a oportunidade aos leguleios de pleitear a modificação de sentenças, em que o lado perdedor tenha colhido quatro votos.  É oportunidade rara de livrar de uma condenação, havida como certa em outras terras, mas não no Brasil, em que, ao parecer, o processo pode desdobrar-se em novas sentenças, que infirmem as pregressas, e que transformem condenações em absolvições. Estaríamos assim diante do moto contínuo jurídico, por cortesia do dito embargo infringente.
         Só que há dois problemas em tela. Foram abrogados os embargos infringentes no Supremo para ações penais originárias. Nesse sentido, excluídos os zelosos e argutos advogados de defesa (cujo mister confundem em prolongar ad infinitum a ação, enquanto buscam pela oportunidade de salvar de algum modo o respectivo cliente), o consenso prevalente é de os ditos embargos infringentes não cabem. Este foi o voto do Ministro-relator Joaquim Barbosa, e se o bom senso prevalecer, este recurso de última hora não seria acolhido pela Corte.
          Nesta vigésima-quinta hora da longa caminhada, o Ministro Gilmar Mendes alerta para outro perigo: se o Supremo decidir analisar os embargos infringentes, o julgamento do mensalão terá “duração indefinida”.  Esse tipo de recurso tem o poder de reabrir o caso, com novo exame de provas e possibilidade de absolvição de réus já condenados no ano passado.  “Isso leva exatamente à duração indefinida de processos, com todas as consequências. Começa a ter discussão sobre prescrição (...). A gente tem que rezar para não perder o senso de justiça. Mas, se Deus não nos ajuda, pelo menos que rezemos para que não percamos o senso do ridículo.”

 
 
(Fonte: O Globo)        

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