sábado, 26 de novembro de 2011

Angela Merkel, a Chanceler de Ferro ?

                         
        Angela Dorothea Merkel, nascida em 1954, viveu na República Democrática Alemã até a queda do muro, em 1989. Foi a mais jovem Ministra no gabinete de Helmut Kohl, de cuja proteção se valeu no início. Kohl a chamava como ‘mein Mädchen’ (minha garota), o que não impediu que dele se distanciasse quando do escândalo do financiamento secreto, que provocaria a queda do primeiro Chanceler da Alemanha reunificada.
       Merkel representa no Bundestag (parlamento federal) o distrito de Mecklembourg-Vorpommen. Eleita presidente da CDU em substituição a Wolfgang Schäuble (abril de 2000), malgrado a sua popularidade, foi preterida por Edmund Stoiber (CSU), como candidata da frente conservadora. Diante da vitória do social-democrata Gerhard Schöder (SPD), ficaria na oposição até 2005.
       Sem embargo, a desastrosa campanha de Stoiber a conduziria à liderança da oposição, que ocupou até 2005. Apesar das resistências intrapartidárias – além de ser mulher, Angela Merkel provém do norte, da antiga DDR, e é protestante, dentro de grande aliança formada por CDU/CSU em que há  certo predomínio católico (o primeiro Chanceler da CDU, Konrad Adenauer, nos tempos da Alemanha Ocidental, era um político católico, que se distinguira no partido de Centro durante a república de Weimar).
        No pleito de 2005, nem a SPD, nem a CDU lograram maioria. A saída foi mais uma grande coalizão, com Merkel à frente (por ter a CDU/CSU maior número de deputados), por primeira vez uma mulher Chanceler.
       Nos comícios de 2009, a popularidade de Angela Merkel deu a vitória à aliança conservadora CDU/CSU. Com o apoio da FDP (liberal democrata) constituem a atual maioria.
      Na presente crise europeia, Angela Merkel e Nicolas Sarkozy, dentro da aliança franco-alemã que constitui o informal diretório da União Europeia, têm sido os líderes dos diversos acordos tornados necessários pela falência da Grécia e de similares ameaças de outros integrantes do mal-sinado acrônimo dos chamados piigs (portugal, itália, irlanda, grécia e espanha). Apesar das mesuras recíprocas, não subsistem dúvidas quanto às posições respectivas de Alemanha, a maior e mais sólida economia da zona do Euro, e de França (a segunda em importância, a despeito do respectivo alto endividamento). Em consequência, a preeminência de Merkel é decorrência dos relativos pesos nacionais, embora a Chanceler seja hábil o bastante para transmitir a impressão de uma diarquia que, na verdade, é um primado de Berlim, acolitado pelos orgulhosos gauleses de Paris.
       Um parêntese para a dúbia e marginal presença britânica. Excluído das reuniões dos membros da zona do Euro – de que o Reino Unido se dissociara, menos por motivação financeira, do que por idiossincrasia insular – é de intuir-se que, mesmo nas questões que envolvem os 27 membros da U.E. a participação do Primeiro Ministro David Cameron – que formou o gabinete em maio de 2010 – tende a ser  acessória, malgrado  seus esforços em dar  impressão contrária. Não é só uma vã preocupação com o prestígio da Albion no seio da Europa continental, eis que as tentativas de Cameron, por vezes um tanto canhestras, têm sobretudo a ver com a situação de Londres como centro financeiro, que se deseja manter, posto que não mais ostente a passada grandeza.
     Enquanto outros países – como a Grécia, por exemplo – não trepidaram em aderir ao euro, na certeza de adquirirem um passaporte para uma área financeira a que antes não tinham acesso, a Alemanha sabia muito bem que renunciava à duramente conquistada solidez do marco alemão. A entrada da Alemanha na área do euro implicava sobretudo em uma profissão de fé europeia, o que representava, de resto,uma opção coerente feita por Bonn , posteriormente Berlim, no espaço europeu, à luz dos desastrosos conflitos que tinham estigmatizado o Reich alemão.
     A crise financeira europeia – descendente da bancarrota helênica, mas na prática decorrência de um arcabouço de tratados que é singularmente omisso no instrumental para os tempos de crise. Se a atual situação da inchada União Europeia (27 membros) e da zona do Euro (17 membros), submetidos ao deficiente controle do Banco Central Europeu, é consequência de uma passada geração de líderes, cabe à atual leva de dirigentes – de que a Chanceler Angela Merkel é a primus inter pares – a tarefa nada invejável de remendar um mecanismo inadequado, eis que dependente da regra da unanimidade, decerto romanticamente democrática, mas por completo desajustada à  gestão de um grupo tão alentado de economias.
     A Chanceler Angela Merkel – que conta com a válida ajuda de seu Ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble – tem preferido exercer a própria influência no universo europeu sem prevalecer-se de indicações para cargos chaves, como o da presidência do Banco Central Europeu, após a longa – e hoje questionada – direção do francês Jean Claude Trichet. Acedeu, por  conseguinte, à recentíssima indicação do  tecnocrata italiano, Mario Draghi, ao invés de dispor em Frankfurt, como lhe caberia, de um banqueiro alemão.  
     Nesses tempos interessantes – no sentido chinês – afigura-se difícil contentar a todos. Por isso, costumam chover críticas sobre as alegadas falhas da Kanzler Angela Merkel, no que tange à crise financeira e às questões comunitárias. No entanto, por vivermos uma época de transição, se afigura deveras prematuro emitir juízos sobre alegadas tardanças e supostas indecisões da Chanceler.
     Partindo de estruturas já formadas, e com os vícios redibitórios das omissões dos próceres fundadores, a obra futura do diretório europeu, de que a Alemanha é a locomotiva, depende de muitos fatores imponderáveis, para que sejam possíveis gravar no mármore ático juízos com a pretensão da durabilidade.
    Como não é possível ao observador emitir pareceres sobre questões nas quais pende o equívoco parecer da caprichosa deusa Tuxe (Fortuna), creio ser de todo interesse não aventurar-se em comentários intempestivos. Por receber a dúbia mostra de tentar reajustar uma construção feita pela metade, Angela Merkel, ao contrário de apressadas censuras, faz por merecer um parêntese de tolerância, mesmo que tenha chegado um tanto tarde no cenário a que pretende pôr em ordem.



 

Um comentário:

Maria Dalila Bohrer disse...

Muito esclarecedor o conteúdo desta matéria.