domingo, 31 de maio de 2020

Desacelera a Covid-19 em capitais ?



          Ainda há incerteza no horizonte, mas nos grandes centros urbanos mais atingidos pela crise do novo coronavírus, tanto no Rio, quanto em São Paulo, o número de casos por morte nas duas capitais acena estabilizar-se.  Não sendo ainda possível assinalar uma queda, há fundamento de que essa situação seja um dos primeiros sinais alvissareiros de que se atingiu o pico da epidemia nessas duas capitais.

              Entretanto, o açodamento em querer transformar tal incerteza quanto à circunstância de que o pico da epidemia teria sido por fim atingido deve ser evitado. Dadas as características do contágio dessa epidemia, essa situação ainda não constitui premissa  para justificar a abertura da economia nesses grandes centros.
                Assim, o número de óbitos no Rio de Janeiro há dez dias se estabilizou, oscilando dentro de uma taxa cotidiana de aproximadamente 120 mortes per diem. Já em São Paulo, a taxa transcorreu em todo o mês de maio  em torno dos cem óbitos.  Por sua vez, em Fortaleza, registrou-se a maior média semanal há 20 dias, e agora dá indicações de que caia lentamente.

                Por sua vez, em Manaus outro centro bastante fustigado, após brusca escalada no mês passado, o número de óbitos cotidiano entrou numa tendência relativamente estável, ainda que haja voltado para um ritmo mais intenso nos últimos dias.  Já no município do Rio a mostra mais evidente da desaceleração está no sistema privado de saúde. Houve queda sensível  de pacientes  da Covid-19 em toda a Rede D'Or.  Dessarte, o Copa Star - que já teve  oito de suas dez alas de UTI destinadas a pacientes da Covid, reduziu para cinco alas.  E desde o dia 18 três dessas estão fechadas.

                 Dessarte, a ocupação das UTIs privadas no Rio de Janeiro caíu, entre 90% a 95%, e para entre 80% e 85% no município. Esse alívio relativo levou a uma negociação de contratação de leitos priva-dos SUS.  Por sua vez a prefeitura do Rio de Janeiro, apesar das sólitas filas para atendimento, também registra diminuição de demanda.  Assim, a média diária de atendimento caíu de 932 para 496 do meio de abril a meados de maio. Nesse contexto, o  sistema Infogripe, da Fiocruz cita estabilidade no número de casos  de síndrome respiratória aguda grave (Srag), diagnóstico por sintomas que tem sido usado para estimar a prevalência da epidemia diante da falta de testes disponíveis.    
                    Não obstante tais dados, é uma outra estória quando especialistas são questionados para "cravar" o pico da epidemia nas diversas regiões, as respostas são necessariamente mais complexas.                       

Plateau Seletivo.
  
                    Assim, o chefe do laboratório de pesquisa do Instituto Carlos Chagas, Fernando Bozza, acredita que o 'plateau' está sendo efetivamente atingido nas capitais, mas como seria de prever-se especificamente no segmento da população mais rica.
                        Segundo Bozza "precisamos de mais dados sobre as regiões mais pobres, uma vez que temos evidências de que é onde a doença está prevalente e a subnotificação é maior."
                          Esse mesmo fator se revela na diferença geográfica, porque as capitais que tiveram a chegada da Covid 19 mais cedo estão agora em um nível de transmissão menor.  O interior, no entanto,  contribui de forma quase homogênea para que as médias estaduais de casos diários não baixem.

                         Isso não significa que na capital tudo esteja sob controle, pois no sistema público as filas estão longe de zerar.  No Estado do Rio, hospitais de campanha  não foram entregues ou operaram com poucos leitos e falta de materiais e profissionais (decerto consequência de aparente corrupção na implantação do sistema extraordinário para atender ao flagelo do coronavirus).
                             No total, incluindo outras unidades da rede, a capital dispõe de 944 leitos (221 de CTI)  em operação, quando a previsão era chegar a 1.364.

                             Por outro lado, em São Paulo,  a aparente estabilização na aceleração da epidemia tampouco chega a ser de grande alento.  A média semanal de casos diários subiu um tanto, para 1.800, depois de passar 25 dias oscilando entre 1000 e 1400. É sem dúvida uma curva de inclinação menor  que a de muitos outros estados brasileiros, mas ainda é preocupante para  um estado onde a epidemia atingiu dimensão maior. A taxa de ocupação de leitos nas UTIs na região metropolitana, ainda assim, caíu  de 88% para 83% na última semana.

Ocupação de Leitos.

          Entre as capitais mais atingidas pela Covid-19, a única que já é mencionada por especialistas como relativamente pronta para uma reabertura controlada é Manaus,  que passou por um momento de colapso do sistema de saúde há poucas semanas atrás.
            - Abrir o Rio nesta semana, por exemplo, seria precoce - declara Alberto Chebabo, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia.
              Fortaleza, que passou por momentos difíceis e também teve colapso no sistema de saúde, ainda tem mais de 80% da capacidade  de UTIs em uso.
                Chebabo  explica que um parâmetro fundamental para avaliar a reabertura é o número de reprodução básica (conhecido entre cientistas pela variável  RO ), que indica quantas pessoas cada vítima da Covid-19 está reinfectando.

               - O ideal é abrir quando você tem o RO em torno de 1 e tem menos de 80% dos leitos de terapia intensiva ocupados. Nenhuma  dessas duas premissas aconteceu aqui no Rio, nem em São Paulo - afirma Chebabo.
                   Raquel Stucchi, professora de infectologia na Unicamp , diz que alguns estados tentam seguir um modelo adotado com cautela em outros países, mas sem cumprir  as condições necessárias.
                     - A Europa está começando a reabrir agora, mas eles aguardaram  uma estabilidade muito maior do que aquilo que já vivemos no Brasil.  As pessoas já me perguntaram se vai ter uma segunda onda de Covid-19 aqui, mas nem consigo enxergar que a gente já tenha superado a primeira - assevera a professora.
                       Guilherme Travassos, da Coppe-UFRJ  faz uma estimativa de pico no Rio, mas sob uma declaração condicional.
                       - Acreditamos que o estado chegará  ao pico entre 5 e 10 de junho, com 55 mil casos no estado e 35 mil na capital. Devemos ficar uma semana no pico. Para descer, é preciso adotar o lockdown. Sem medidas de proteção, a curva não desce - avalia Travassos.
                            Já o epidemiologista Paulo Lotufo, da USP, é menos otimista, e diz que é difícil prever quando se chegará ao pico, até porque isso depende das ações locais.
                             "Na situação que se via no início da pandemia, era uma previsão. Depois, com o boicote do Bolsonaro e de alguns governadores às medidas de isolamento, é outra história."

( Fonte:  O Globo  )

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