quinta-feira, 7 de maio de 2020

Bolsonaro terá de depor presencialmente ?


                                

       Com a devida vênia da colunista Miriam Leitão, desejo reportar-me à circunstância que é única - ou, pelo menos, raríssima - nos anais da República, a saber, que o  presidente  Bolsonaro venha a ser obrigado a depor presencialmente.

          O quebra-cabeças jurídico - que foi decifrado pelas devidas leituras e informes colhidos pela colunista, como se há de presumir - passa a ser exposto na coluna de Miriam Leitão, e pode por isso ser resumido nos seus aspectos mais relevantes.

           Assim, se o presidente Bolsonaro for ouvido nesta investigação iniciada a partir das declarações do ex-ministro  Sérgio Moro, a oitiva dele será presencial e não por escrito (como ocorreu com o então presidente Michel Temer). Conforme a colunista, essa é a conclusão a partir de o que está escrito na decisão do ministro do Supremo Celso de Mello.

             Se é verdade que Presidentes dos Poderes podem optar por responder às perguntas por escrito, no caso há um empecilho: tal só se aplica à autoridade que for testemunha ou vítima no inquérito. Não será decerto o caso do presidente Jair Bolsonaro.

              A fonte presumível da jornalista Leitão foi um procurador, que serve na cúpula do Ministério Público. Ele levantou o (claro) enigma[i] quanto à "aplicabilidade somente às testemunhas da prerrogativa fundada no art. 221 do Código de Processo Penal".  Pelo artigo em tela, no seu parágrafo primeiro, Presidente e vice-presidente e presidentes do Senado, Câmara e STF  quando forem ouvidos em um inquérito, podem fazê-lo por escrito. O problema é que o ministro Celso de Mello disse  que apenas se a autoridade em questão estiver na condição de testemunha. A dúvida que fica é se o Procurador-Geral da República vai mesmo requerer essa diligência.

                 A questão que hoje se coloca é que o Ministro Celso de Mello escreveu e grifou a afirmação de que só para testemunha é que cabem as prerrogativas do artigo 221.  Assinale-se que como testemunhas serão ouvidos os ministros  Augusto Heleno, Luiz Eduardo Ramos e Walter Braga Netto. Dada a sua hierarquia, eles têm a prerrogativa de poder combinar a hora e o local da oitiva. Mas o que se investiga é se o Presidente tentou ou não interferir  na Polícia Federal.

                   Ora, no ítem 7 de sua decisão, o ministro Celso de Mello reafirma  de maneira inequívoca a "inaplicabilidade a investigados e a réus da prerrogativa do art. 221 do Código de Processo Penal." Diz o artigo  que isso só se aplica às autoridades que constarem como vítimas ou testemunhas. "Caso estejam na posição de pessoas investigadas ou acusadas não terão acesso a tal favor legal, como se tem decidido nesta Suprema Corte." Mais adiante, o ministro Celso de Mello  repete que "unicamente" as testemunhas e vítimas de práticas delituosas.  "Isso significa, portanto, que suspeitos, investigados, acusados ou réus não têm essa especial prerrogativa de índole processual."
                     
                   Fica, portanto, meridianamente claro, que estando o presidente Jair Bolsonaro nas condições de suspeito, acusado ou investigado nesse inquérito, ele terá que ser ouvido presencialmente.


(Fonte:  Miriam Leitão,  O Globo)        


[i] Carlos Drummond de Andrade, Claro Enigma.

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