sábado, 24 de agosto de 2013

A Covarde Lógica da Barbárie (II)

                

       Se as atrocidades e depredações praticadas pelos islamitas, não constituem novidade, na deplorável história do relacionamento das religiões, e, em especial, da chamada Fraternidade Muçulmana, contra a importante minoria copta na milenar terra egípcia, o seu brutal reaparecimento coloca várias questões que não podem ser abafadas.
      De início, a maligna negligência do poder estatal – hoje, para variar, empolgado pelos militares – que não move um dedo para proteger das tropelias das multidões islâmicas, a despejarem sobre a comunidade cristã-copta toda a raiva que busca desafogar-se dos agravos sofridos por outrem – a saber a inatacável força militar.
      Traduzida na sua linguagem mais simples, como já assinalei, é a covarde lógica do pogrom, que, diante de supostos males sofridos por forças superiores, se dirigia contra a comunidade judia, em essência culpada de ser minoria e, por conseguinte, fraca e exposta às baixarias da malta. Para esta última, os judeus – ou qualquer outra minoria exposta, como os coptas – davam a oportunidade de descarregar o ressentimento havido pela derrubada do representante da Irmandade.
      É a velha e desprezível lógica do redirecionamento da reação pelas ofensas recebidas de uma força maior - que não pode ser contestada – contra outra menor. Para tal, a comunidade copta no Egito é o ‘cristo’ da vez. Minoritária, desarmada e abandonada pela facção armada – no caso, o Exército – constitui a vítima sempre disponível, para o trucidamento e a devastação infligida pelos islamitas, como espécie de oferenda propiciatória ersatz.[1] No altar da intolerância, a turba ignara e também ignava[2] (pois não se atreve a enfrentar o real fautor da situação havida como insuportável) acha mais cômodo atacar a vítima abandonada ao próprio destino, tradicionalmente desprotegida pelo poder estatal.
      Talvez condicionados pelo sentimento do perdão que é imanente na fé cristã, os coptas tendem a ser a comunidade exposta a tal tipo de tratamento. Enquanto não encontrarem uma resposta – que lhes resguarde o mútuo respeito – os cristãos sofrerão agravos e os seus templos serão vandalizados.
      A esse propósito, é emblemático o comportamento da multidão islâmica nos grotões interioranos. Em El-Nazla, ao sul do Cairo, um homem gritou “El-Sisi está matando nossa gente. Muçulmanos, saiam de suas casas !”
      E para quê saíram ? Não para participar dos sit-ins de oposição ao golpe do General Abdul Fattah el-Sisi. Para essa chusma, pareceu mais convidativo investir contra as duas igrejas coptas – que incendiaram e saquearam – assim como o mosteiro, e o fizeram com tal ferocidade, a ponto de despedaçarem altares de mármore.
     Enquanto isso, o poder civil se mantém ausente, cinicamente entregando a minoria cristã à própria sorte, como se os copta fossem cidadãos de segunda ordem. Pagam os mesmos tributos, mas não fazem jus à proteção contra tais torpes depredações. A esse propósito, como bom funcionário da Irmandade Muçulmana, Mohamed Morsi nunca encontrou tempo na presidência para visitar sequer uma igreja copta. Com a exceção já referida de Hosni Mubarak, a autoridade árabe muçulmana sói abandonar as comunidades coptas às investidas islâmicas, à cata dos bodes expiatórios da vez.
     Se em El-Nazla e na vizinha El-Zerby não houve mortes, as coisas no resto do país não correram sem sangue cristão. Aos ataques militares contra a Fraternidade Muçulmana, se seguiu... a perseguição islâmica aos cristãos coptas. Ishak Ibrahim, empenhado na ‘Iniciativa Egípcia pelos Direitos Pessoais’, disse ter havido “série de ataques a igrejas, escolas, organizações cívicas, orfanatos e mosteiros. Tudo o que tivesse algo a ver com a Igreja (copta)”. E três pessoas foram mortas em Minya, ao sul.
      Nos cômputos gerais, ocorreu a destruição total de 38 igrejas, além de outras 23, que sofreram danos. O poder civil nada fez para proteger os coptas, em comportamento que não difere de inações anteriores. Os imãs (sacerdotes islâmicos) alimentam a sanha da turba contra os cristãos, a perene vítima da vez, convidativa porque desprotegida. Talvez esta explicação contribua para levantar um pouco mais a cortina da hipocrisia: (as autoridades) apregoam que ‘estavam protegendo as delegacias de polícia dos facínoras da Irmandade Muçulmana’.
      Não surpreende, por isso, que a minoria copta – que seria equivalente a dez por cento da população total (cerca de oito milhões) – vá aos poucos diminuindo, buscando no estrangeiro terras em que não seja nem morta, nem perseguida. Responde com os pés, portanto, à intolerância que a cerca, como outras minorias cristãs no Oriente Médio, a exemplo dos cristãos caldeus do Iraque.

 

(Fonte: International Herald Tribune )



[1] Vocábulo alemão para ‘substituto’.
[2] Pusilânime.

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