Talvez redimensionamento seja o comentário mais apropriado para a eleição de Vladimir Putin na Rússia. Assim, há recuos tanto nas expectativas oficiais, quanto nas da oposição.
Por um lado, se afigura inegável que a fraude foi um fator saliente no processo eleitoral. Se como já assinalado, o sistema empregado tende a facilitar votações infladas e urnas adulteradas e não houve equilíbrio no acesso dos concorrentes aos meios de comunicação, forçoso se afigura reconhecer que Putin foi o candidato da preferência majoritária, como as pesquisas de boca de urna o indicaram.
Por outro lado, sua votação superou inequivocamente aquela dada ao Partido situacionista Russia Unida, nos comícios para a Duma (câmara baixa). A par disso, a fraude, posto que reconhecida pelos observadores internacionais, não terá desempenhado a influência determinante que se verificara no pleito legislativo.
Se ao conjunto dos instrumentos governamentais – dentro de uma crescente escala de ilegalidade – não poderia ser atribuída a razão para a vitória de Putin – cuja popularidade é inegável em amplos segmentos da população, de toda maneira a sua eventual incidência contribui para encher de verrugas o geral semblante da eleição do atual Primeiro Ministro.
Tomemos, à guisa de exemplo, o resultado no distrito 451, em Grozny, na capital da antes conflagrada república da Tchetchênia. Nessa zona eleitoral, o candidato oficial Vladimir Putin teve 1482 sufrágios, contra um apenas dado ao líder comunista, Gennady Zyuganov. Belo resultado, posto que estatísticamente um tanto dúbio. O que o tornou ainda mais embaraçoso para a apuradora-chefe local, Milana Atlanova, é o fato de a suposta votação superar o total de eleitores inscritos, que é de 1.389 votantes.
Ainda que tais ‘exageros’ tchetchênios já fossem conhecidos de passadas eleições – e o caráter marginal desses totais inflados, haja vista a numérica insignificância dessa república no contexto do pleito - não há negar que a fraude, em todas as suas formas, está presente no processo eleitoral da Federação Russa.
Pelas indicações de prévias, há relativo consenso de que Vladimir Putin ganharia de qualquer forma. No entanto, o desigul sistema, em que o representante oficial dispõe de acesso irrestrito aos meios de comunicação, sem que a oposição desfrute de oportunidades comparáveis, já não constitui base confiável para a realização de eleições com um mínimo de paridade. Se agregarmos a fraude – facilitada por um sistema adrede rudimentar -, não se poderá negar que a disputa se apresentará com extremo desequilíbrio. Nesses termos, o sistema de votação em todas as Rússias não há de diferir muito daquele que prevalece em muitos países do Oriente Médio e do Magreb.
Como uma nota de pé de página para os próximos seis anos do terceiro mandato de Putin – os dois anteriores haviam sido de quatro -, o atual Presidente Dmitri A. Medvedev determinou ao procurador-geral a verificação da legalidade da condenação de Mikhail Khodorkovsky, o antigo bilionário e desafeto de Putin, cuja prisão, prolongada por suspeita sentença passa por ser de motivação política.
Projetando imagem de maior moderação do que a de Putin, Medvedev tem sido menos severo nas apreciações do antigo dono da mega-empresa Yukos, chegando mesmo a dizer que a libertação de Khodorkovsky ‘não representaria nenhum perigo’.
Como na Federação Russa, quem tem a última palavra é o todo-poderoso Vladimir Putin, restará verificar se a iniciativa de Medvedev levará à libertação de Khodorkovsky.
( Fonte: International Herald Tribune )
Nenhum comentário:
Postar um comentário