quarta-feira, 28 de março de 2012

CIDADE NUA V

O Espelho Mágico  (13)


         Nunca saberia se ela o encarou por acaso, ou  movida por natural faceirice. O fato é que ao fitá-lo logo muda de atitude. Intenta, é verdade, disfarçar o interesse, mas estranha lassitude dela toma conta. Como se, de súbito, se vá transformando em livro aberto. Uma atração indefinida a empurra para ele. Sente ser algo que lhe é superior. Para sua surpresa, ela se deixa levar. E os olhos de novo se encontram. Num átimo, sensação de total abrangência. É uma impressão forte, demasiado forte para que se possa contrariar. Diria que um frenesi a investe. Súbita, inelutável experiência de plenitude a dois.
         O entorno não tem importância. Ambos se descobrem querer partilhar  segredos, porém a dois. Será guiado por tal certeza que Alberto a aborda, e a toma pelo braço. Quiçá o incomode o resquício de um escrúpulo. Que como tímida e matinal bruma logo se desfará sob o calor do instinto que se alevanta.
        Sem qualquer reação, ela se torna um prolongamento dele próprio. Ainda não trocaram palavra, mas já formam um casal.

                                                 *      *

       Alberto, querido,


       ontem foi maravilhoso. Difícil o depois. Quero dizer, acreditar no que aconteceu. Não gostaria que pensasse que normalmente sou assim. Gostei muito do barzinho a que você me levou. Tão discreto e charmoso... Mas hoje tenho uma sensação esquisita. Como se não fosse eu... Tudo saíu depressa demais. E fico com medo que me confunda com outro tipo de programa... Será que dá pra entender essa minha reação ?

      Com o amor da                                             

                                                   Lúcia Maria      

                                                 *      *

        Que chato, murmurou. Talvez tenha ido com muita sede ao pote. Quem sabe se  maneirasse um pouco mais, ela não sentisse esse desconforto, essa impressão de haver sido arrastada a fazer coisas que normalmente não faria com tal presteza ?
        Por isso, achou mais prudente não forçar a barra. Chamaria mais tarde, e pelo celular. Seria melhor para sondar o terreno.

                                                 *      *   
                                                                                      ( A continuar )

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