sexta-feira, 18 de julho de 2014

Barbárie


                                       

        Os fatos são conhecidos: uma aeronave Boeing 777, da Malaysian Airlines, foi derrubada por míssil de fabricação russa SA 11. Em altura de cruzeiro (cerca de 9 mil metros), o avião com 283 passageiros e quinze tripulantes explodiu sobre a Ucrânia oriental, em território ora controlado por separatistas pró-Rússia. Não há uma determinação completa da nacionalidade dos passageiros. Sabe-se que havia 154 holandeses (esse número aumentado se deve ao compartilhamento com a companhia neerlandesa KLM), 43 malaios, 27 australianos, 12 indonésios, nove britânicos, três filipinos e um canadense. Há 41 passageiros ainda não identificados. Três crianças de colo estavam no vôo MH17.
      Os dados acima já foram estabelecidos. Os satélites americanos ainda não determinaram a base de onde se originou o disparo.

      Há detalhes importantes. Na data do desastre, a Rússia fechara as rotas  aéreas   procedentes de seu território e na direção do leste ucraniano, com exceção da rota para a Criméia, antiga província ucraniana, recentemente anexada pela Federação Russa.
      O porta-voz do Presidente Petro Poroshenko classificou a ocorrência como um ato terrorista: “Este é o terceiro incidente trágico nos últimos dias, depois de as aeronaves militares ucranianas An-26 e Su-25 terem sido derrubadas a partir de território russo. Não descartamos que este avião tenha sido abatido e ressaltamos que o exército (ucraniano) não realizou nenhuma ação para destruir alvos no ar”.

      O vice-presidente Joe Biden reforçou a teoria ucraniana: “O avião foi aparentemente derrubado e digo aparentemente porque não temos todos os detalhes. Não é um acidente.”

     Segundo fonte do Ministério da Defesa da Ucrânia, os rebeldes teriam atingido por engano o avião, numa tentativa de abater aeronave de carga da Força Aérea da Ucrânia, que fora identificada pela defesa aérea russa. Ainda segundo a fonte ucraniana, não longe do itinerário do avião da Malaysian Airlines, estaria voando um Iliushin 76, com alimentação para a tropa de Kiev.

      Há acusações contrastantes quanto à origem do disparo. Rússia e Ucrânia possuem mísseis Buk terra-ar. E apesar de suas negativas de disporem do armamento, o jornal britânico Guardian determinou, com base em reportagem de tevê estatal russa do fim de junho, que os rebeldes teriam se apossado do controle de instalação de defesa ucraniana com o sistema Buk. Como os destroços do avião caíram sobre área controlada pelos separatistas (aldeia de Grabovo, região de Donetsk), há fundadas preocupações que os rebeldes disso se prevaleçam  para mexer no sítio com os restos da aeronave e de seus passageiros. Nesse contexto, os insurgentes revelaram a princípio ter em seu poder a caixa preta do avião, para depois negar a informação.

       Por outro lado, há dois áudios interceptados entre rebeldes e oficiais russos, em que se fala da derrubada de um jato civil. Na primeira ligação, o comandante rebelde Igor Bezler assevera para oficial da Inteligência militar da Rússia que os separatistas abateram um avião. Na segunda comunicação, um dos pró-separatistas, que se acha no local onde estão os destroços do avião, afirma que o ataque com o míssil foi efetuado por unidade insurgente a 25 km ao norte.

        A respeito da tragédia, o presidente da Federação Russa, Vladimir V. Putin, declarou desconhecer que os rebeldes tivessem lançadores de mísseis Buk. E, sempre segundo o Presidente Putin, mesmo que o possuíssem, não poderiam operá-los.

         Por fim, ainda em contexto especulativo - dentro do fogo cruzado de informes pro domo sua[1]- a agência estatal russa difundiu que “o alvo poderia ser o presidente russo”.

         Há fundadas esperanças de que a verdade apareça afinal. Mais uma vez, a estupidez humana já colheu a sua carga de opróbrio e de desgraça. Em meio aos indícios – que são muitos – e as contradições que repontam nas costuras apressadas da mentira, as responsabilidades se hão de determinar. E, quem sabe, outra expressão latina – cui prodest[2] – irá luzir com a sua incômoda claridade sobre a autoria de mais este crime.

 

(Fontes: O Globo, The New York Times )



[1] Para defender a própria causa
[2] A quem aproveita

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