quarta-feira, 11 de julho de 2012

Antidiplomacia


                                               

      Felisberto Caldeira Brant Pontes Oliveira e Horta, marquês (com grandeza) de Barbacena, fôra íntimo de Pedro I, a quem serviu em diversas missões diplomáticas e militares. Dentre tais encargos, se inserem as tratações para o segundo casamento de D. Pedro com Da. Amélia de Leuchtenberg.
      Posteriormente, o Soberano suspeitou de sua honestidade, a ponto de acusá-lo de ladrão.
     Inteirado, o Marquês de Barbacena respondeu com altaneria, chegando a predizer-lhe a próxima queda. Sua carta é avis rara, pois, no gênero, não abundam correspondências de súditos a romperem relações com soberanos na plenitude dos respectivos poderes.
     No momento, o Itamaraty – como por antonomásia é conhecida a diplomacia brasileira – atravessa momento difícil. Fundado em larga tradição histórica, que  alcança a época colonial com o precursor de nosso serviço exterior, o santista Alexandre de Gusmão, na qualidade de Secretário de D. João V (negociador do Tratado de Madri, com o desenho do mapa do Brasil), atravessa a imperial, com as negociações do Visconde do Rio Branco no Prata e de Duarte da Ponte Ribeiro, nas fronteiras a oeste, e, por fim, com o segundo Rio Branco, o Patrono de nossa diplomacia, vencendo as questões arbitrais das Missões e dos limites com a Guiana Francesa.
     No Império e na República, a diplomacia brasileira – que já com o Barão do Rio Branco teria a chancelaria no Palácio do Itamaraty – se assinalaria pelo profissionalismo e a competência. Depois da morte do Barão em 1912, muitos ministros ocuparam a pasta, na sua grande parte políticos. São a princípio muito raros os titulares de carreira, como Pedro Leão Velloso, mas, em geral, os chanceleres são políticos, com a presença interina eventual de nomes ilustres como Mário de Pimentel Brandão e  Heitor Lyra. João Augusto de Araujo Castro seria o último Ministro do Presidente  João Goulart.
     Com o regime militar, no que seria o breve interregno de abril de 1964 a fevereiro de 1985, se iniciou novo formato, com a presença de diplomatas de carreira como chanceleres. Se há exceções (Juracy Magalhães e José de Magalhães Pinto), a carrière predomina com Vasco Leitão da Cunha, Mario Gibson Barboza, Antonio Francisco Azeredo da Silveira e Ramiro Saraiva Guerreiro.  Assim, com os militares no poder, a norma não-escrita passou a ser confiar a um profissional da carreira a chefia da Casa de Rio Branco.
     Embora haja exceções, com a Nova República e a Constituição de 1988, a indicação de um político se tornou a princípio uma forte probabilidade, com Olavo Setúbal, Roberto de Abreu Sodré, Francisco Rezek, Celso Láfer e Fernando Henrique Cardoso. Mais tarde, voltariam os diplomatas com FHC e Lula da Silva, como presidentes, os diplomatas Luiz Felipe Lampreia e Celso Amorim, este último nos oito anos de mandato.
     Dessarte, apesar das aparências em contrário, os diplomatas de carreira passaram a ser probabilidade forte para a chefia da Casa de Rio Branco tão só a partir da revolução de 1º de abril de 1964.
     Segundo consta de o que vem transpirando acerca das intenções de Dilma Rousseff no que tange ao Itamaraty, Antonio Patriota não teria sido o primeiro da lista para as Relações Exteriores. Dilma pensara em designar uma mulher para a sucessão do Rio Branco, mas não encontrou ninguém que lhe satisfizesse.
     Se é notório o tratamento dispensado pela Presidenta a seus ministros, sem entrar em considerações pessoais seria mais do que oportuno que se evitasse uma ‘fritura’ de Chanceler. Esse procedimento, que terá tido nome a partir de José Sarney – mas nunca atingira a seus ministros de relações exteriores – não interessa ao país se nos cingirmos à permanência do chanceler  (o termo alternativo usado no Brasil para o Ministro das Relações Exteriores).
     Não aproveita ao Chefe de Estado ter um ministro do exterior enfraquecido. Enquanto estiver trabalhando a contento, a Presidenta deveria reserva quanto a eventuais juízos negativos. Defini-lo como ‘fraquinho’ ou qualquer outra designação pejorativa não seria inteligente de sua parte, por debilitar uma autoridade de seu governo, a quem se julga represente a vontade da Chefe de Estado.
     Por outro lado, nem FHC, nem Lula permitiram circulassem opiniões negativas ou indicações de supostas contra-ordens.
     Não creio, portanto, que seja do interesse da Presidenta fritar o Ministro das Relações Exteriores. Tampouco é aconselhável desconhecer os seus pareceres. Afinal, se o escolheu, se terá baseado em recomendações de peso. O próprio Ministro Patriota foi Secretário-Geral, após a aposentadoria do Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, e antes Embaixador em Washington. Tal correspondia ao apreço que lhe votava o anterior Ministro da Relações Exteriores.
     Para preservar a instituição – hoje alegre pasto da imprensa, a quem interessa mais a notícia desfavorável do que a favorável – e o seu respectivo trabalho, semelha igualmente seja o caso de ter presente a sabedoria de seu criador, que nunca teve maiores problemas com o Itamaraty e seus representantes. Não valeria a pena inspirar-se no chefe Luiz Inacio Lula da Silva, haja vista o seu trânsito internacional? Tampouco creio que Lula se haja queixado do Itamaraty, em matéria de relações com o nosso entorno mais próximo, sem falar dos demais continentes. É um exemplo a ser estudado com cuidado e, se possível, imitado.   

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