terça-feira, 13 de setembro de 2011

O Calote Grego

                                       
        As bolsas do mundo globalizado sofrem de um arrítmico nervosismo motivado pela onda de boatos que cercam a Grécia e a sua periclitante situação economico-financeira.
        Dada a sua posição preeminente na zona do euro, a Alemanha, como o primus inter pares  do grupo,  seria o líder na organização do socorro àquele país. No entanto, a Chanceler Angela Merkel e seus comentários por vezes demasiado francos, assim como o respectivo Ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble, exacerbam amiúde a suspicácia de que a ajuda a Atenas possa faltar.
        Na verdade, há sobejas indicações da precariedade da situação helênica. Os países membros da zona do euro – e a Alemanha em especial  - pagam caro pela ausência de regras para lidar com a crise. Com efeito, às disposições para o ingresso nesse clube restrito não foram contrapostas normas que dessem efetivo poder de controle ao Banco Central Europeu.
        A contradição básica reside nesta improvidente lacuna, o que permite aos membros menos responsáveis agirem como países soberanos ao empilharem dívidas e gastos incompatíveis com as  receitas, e, por outro lado, buscarem, no aperto subsequente, a ajuda dos países com situação econômica-financeira mais sólida, como se tal fora direito que lhes assistisse.
        Angela Merkel e seu Ministro Schäuble reagem com irritação a tal estado antinômico de coisas. Empurrados pela própria magnitude economico-financeira a assumir um papel pró-ativo na solução do problema, vêem-se imprensados entre a exasperação do contribuinte fiscal germânico (relutantes em aceitar o ônus crescente para o respectivo Tesouro em atender às demandas iteradas de ajuda da República Helênica, o que encaram como virtual saco sem fundos) e, de outra parte, as características ruinosas e contraditórias da assistência financeira pretendida.
       Nesse outro canto do ringue, exausto, já nas cordas, está o devedor, i.e., a Grécia do Primeiro Ministro Georgos Papandreou. Depois de uma série de ‘boatos’ que correspondiam, em realidade, a vazamentos em off quanto às críticas disponibilidades helênicas, surge afinal informação de vice-ministro das Finanças, Philipos Sachinidis, de que o país só tem capital de giro até outubro. 
      Por isso, é crucial, segundo a autoridade grega, que Atenas receba a próxima parcela de empréstimos prevista no acordo com a U.E. e o FMI.
      O Ministro Schäuble, no entanto, exige a contrapartida de que as condições do primeiro pacote de socorro à Grécia sejam atendidas, para que se possa aprovar um novo auxílio.
      O Secretário do Tesouro americano, Timothy F. Geithner, vem mantendo contato regular com as suas contrapartes europeias, sempre encarecendo    que falem com uma só voz para tentar reduzir a confusão nos mercados financeiros.
      De fora do problema – pelo menos nos seus primeiros desenvolvimentos – os americanos vêem com mais clareza que a situação na U.E. – e em particular na zona do euro – advem de  deficiência política que os Estados Unidos superara ainda no século dezoito. Reportam-se à evolução da nação americana de uma confederação para a federação consagrada pela atual constituição.
        Nesses termos, a União Europeia está mal equipada para enfrentar a crise, com muitas vozes dissonantes e a efetiva falta de autoridade central. Os países mais fortes financeiramente na área do euro não têm respondido de forma coordenada ao desafio colocado pelos membros mais fracos. Finlândia,  Países Baixos e Austria se manifestam, assim, de forma diversa quanto à eventualidade de assistência à Grécia.
       Por outro lado, a França – e tem sido  os pré-acordos do Presidente Nicolas Sarkozy e da Chanceler Angela Merkel que viabilizam  os entendimentos na UEatravessa uma possível área de turbulência. Há muita apreensão quanto às posições de três grandes bancos franceses – BNP Paribas, Société Générale e Crédit Agricole – ora examinados pela agência Moody’squanto ao potencial de uma inconsistência entre o impacto de possível calote ou reestruturação grega e seus atuais níveis de classificação”. Essa é uma preocupação recorrente na UE, relativa à excessiva exposição das carteiras dos bancos respectivos no que tange a ativos podres de países da zona do euro (e obviamente tais maus empréstimos não se cingem aos bancos gregos ).
      O acossado Primeiro Ministro grego intentou tranquilizar os seus parceiros europeus com mais um discurso neste sábado. Para continuar recebendo os indispensáveis fundos de socorro financeiro, ele promete observar metas draconianas de austeridade financeira, não obstante o perigo de a economia helênica entrar em nova recessão, com  contração do PIB de mais de cinco por cento.
       A citada exasperação de estados que cumpriram com o seu dever de casa em continuar desembolsando fundos para as ‘cigarras’ da zona do euro – e logo depois de Atenas, vêm Madri e Roma – se é compreensível, tende a exacerbar-se, pelo próprio caráter intratável do problema.
      Carregar nas exigências da ortodoxia financeira diante de uma Grécia convulsionada por distúrbios e manifestações, e padecendo de grande retração econômica, pode ser comparado à uma medicação que atenda às exigências da doença, mas que infelizmente também mate o doente.
       A importância da Grécia, malgrado as pequenas dimensões de sua economia, está na circunstância de que o calote (seja sem disfarces, seja na versão eufêmica de uma ‘reestruturação’) teria o efeito de precipitar uma reação em série, como foi o caso da falência do banco Lehman Brothers. O estado falimentar da República Helênica poderiam arrastar – ou infectar – instituições e economias em proporções de uma magnitude quantificável em trilhões de euros (nos primeiros cálculos a quebra de Atenas implicaria em uma conta de três trilhões de euros ).
      Maus humores à parte, o procedimento do bom senso aponta para a continuação da ajuda à Grécia. Seria manter a questão em nível controlável e administrável. Precipitar a falência seria tirar o gênio da garrafa e enfrentar impensáveis turbulências.
      Da crise financeira internacional de 2008, muitos pensam que a situação não teria se tornado incontrolável se a falência do Lehman Brothers  tivesse sido evitada, através de intervenção, como ocorreria na posterior salvação de outros bancos, considerados grandes demais para falirem. Depois de abrir a cancela, as coisas mudam de figura.



(Fontes: International Herald Tribune, O Globo )

Nenhum comentário: