Era uma vez um
partido xiita que se pautava exclusivamente pela ética. Aqueles gatos pingados
que acreditaram em atender ao clamor das ruas, e decidiram votar em Tancredo, a
despeito da ordem da direção de entregar ao povo a escolha e não ao acordo
suprapartidário, pagaram caro a sua opção aberta, conforme ao espírito de
então.
Fácil então
para Lula e seu grupo fulminarem a solução costurada por Tancredo Neves, que
obteria, por via indireta, o que a Nação ansiava, i.e. a reforma, no sentido militar do termo, dos generais e
de seu representante Paulo Maluf.
Se se partisse
para o caminho doutrinário, a solução tenderia a demorar e, ironicamente, a
defesa rígida, inabalável e xiita da democracia poderia dar chabu, e, quem sabe,
poderia repontar uma solução
insatisfatória. Naquela época, o PT era uma banda com poucos músicos, e não
tinha muito a perder com posturas maximalistas.
Hoje Dilma
Rousseff, por uma falsa ironia, se vê cativa de crise que cresce a cada semana,
e que tem a sua origem na Petrobrás.
Seria de pensar
que partido com o programa do PT transformaria, com zelo e empenho, a Petrobrás
no seu carro-chefe. A grande empresa estatal, fundada por Getúlio Vargas, e que
se deve honrar e preservar, pelo que representa para os brasileiros. Quantos de
nós, nesse sentido, reservamos de nossas, por vezes parcas, economias a
contribuição símbolo, i.e. a aquisição de ações da Petróleo Brasileiro S.A.,
como prova singela da confiança e do orgulho na maior empresa nacional.
Como então pensar
que Lula da Silva e seu partido tratariam tão mal a Petrobrás? Nem FHC, a quem se tachara de neoliberal,
teve comportamento comparável com o da dita frente de apoio parlamentar . Serão os mesmos do mensalão, só que em maior
número, pois o cartel das grandes empreiteiras ora se debate na rede do
Procurador-Geral, com toda a sua cáfila de aproveitadores, agenciadores et al.
Nas palavras do Ministro Felix Fischer eles representam a grande roubalheira,
impensável para muitos, porque desrespeita a pedra-mestra dos fundamentos de
nossa economia.
Na verdade, a
crise não é só da Petrobrás. Ela é a
crise de sistema de governo, que se
caracteriza por agressivo e invasivo aparelhamento do Estado. Desde muito, a
ambição do Partido dos Trabalhadores se dirigiu para os gastos correntes dos
órgãos estatais. Com a sua inchação – que não é empresa de neófitos, porque
conduzida de modo contínuo, dentro de sua prioridade de poder – fez com que o Estado se tornasse mais pesado e
grande, quando a norma atual é o oposto.
Essa ilusão
ignora a circunstância de que o projeto do PT é sobre o PT mesmo. Quer torna-lo
grande às expensas do Brasil. Por isso, o PT de Lula e Dilma tem o projeto de
poder que se implementa e concretiza pela transferência maciça do dinheiro
público para reforçar a própria presença, só que estipendiada com o dinheiro
dos fundos públicos. É esquema atrevido, mercantilista nos métodos, e que, com
o tempo, infunde em seus gestores a impressão de que não haveria distinção
entre o que é da Nação, e o que é do Partido.
Essa tese,
pela respectiva ousadia, se alimenta pelo dissídio, e pelo compreensível
ceticismo daqueles que se recusam a crer em similar projeto.
Entrementes,
no entanto, e a despeito de seus opositores, a tese se vai disseminando,
acolchoada pelas diversas instâncias, inclusive a malta dos inocentes-úteis.
O Petrolão é aquele falso segredo, que se
serviu por vezes da descrença de muitos, diante de tal enormidade. Hão de ter
pensado que tal desígnio seria impossível, pela evidência e grandeza da
Petróleo Brasileiro S.A. Sem embargo, a cobiça deve toldar-lhes raciocínio e
natural prudência, que se espera devam morar no homem público.
A velha
máxima de que ser honesto é a melhor solução – e até por velhacaria, segundo
acrescenta o vulgo - não mais semelha
possuir a força de alertar a pessoa política dos perigos da corrupção. Algo se
rompeu nesse mecanismo, o que leva, além do dirigente político – que é a peça
básica da corrupção, por ser a única que
dispõe da força suficiente para pôr em marcha o infernal mecanismo – a adotar
atitudes insensatas e temerárias, como se não os esperasse na curva do caminho
a perspectiva sempre maior da exposição, da acusação e da comprovação do
ilícito.
Tudo isso
essa gente parece ignorar. Essa aula de
crime a que alude o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, está na base
do empreendimento. Espanta que gente esperta e mesmo inteligente, como se tem
oportunidade de verificar, acredite possível manter similar esquema longe dos
braços da lei. É verdade que o poder inebria, e a húbris é a atitude que
representa a contra-face desse otimismo que outros diriam temerário, e que está
na raiz do empreendimento criminoso.
Dilma
Rousseff parece ter apreendido bem sua lição do mestre, ainda que apedeuta,
Luiz Inacio Lula da Silva. Na atualidade, ele terá perdido a capacidade de
eleger ‘postes’, como sinalizou com a usual empáfia e que, dentre muitos, estão
representados por ela, a candidata de algibeira, e por Fernando Haddad. O irônico terá sido que ambos cumpriram o seu
dever de casa vencendo um tarimbado
político – sem ser médico, o melhor ministro da saúde que por aqui tivemos –
José Serra. Essas vitórias são triste evidência do subdesenvolvimento de que
ainda padece o eleitor brasileiro. É
difícil imaginar terra no hemisfério norte em que um chefe político, um
coronelão, logre fazer com que um país (ou a sua metrópole) eleja uma virtual desconhecida,
ou alguém com experiência política muito inferior, ao candidato da oposição, no
caso o ex-governador e ex-prefeito José Serra.
Como Lula
tem a capacidade de reverter situações quase perdidas – como no caso do
Mensalão, v.g., em que até a esposa cuidou de arranjar documento para exilar-se
-, fica difícil intuir a possibilidade de o PSDB jogar fora, por juízos
políticos ineptos, essa oportunidade de
dar a volta por cima.
Aqui não se
deve pensar em vitórias no tapetão. Por ora, isso é quase impossível, dado o
aparelhamento resultante de doze anos de poder.
Sem embargo,
em meio à confusão e aos despautérios, a crise parece adquirir uma dinâmica
própria. As charges de Chico Caruso podem servir de mapa da mina: uma série de
dominós que vão caindo, Lula primeiro, e Dilma, ao fundo, perdendo o
equilíbrio; e hoje, como uma nova pensadora, sentada no barril de petróleo, com
a mecha acesa.
Há momentos-limite, em que cresce a sensação
de podridão. A leitura pelo deputado Marco Maia de um anti-parecer, em que não
indiciou ninguém, e no dia seguinte, a seriedade do Ministério Público Federal,
mostrando a amplitude e a profundidade do respectivo esforço do
Procurador-Geral Rodrigo Janot, que se liga ao corajoso, meritório e honesto
trabalho do Juiz de 1ª Instância Sérgio Moro.
A
Procuradoria-Geral da República, cuja presente posição de autonomia, junto com
a da Polícia Federal, é decorrência da
Constituição Cidadã, e torna possível o julgamento de ações penais como a de
número 470, pelo Supremo Tribunal Federal. Mas o privilégio dos resultados
alcançados pelo julgamento do Mensalão se devem igualmente ao esforço, coragem
e ciência jurídica do relator Ministro Joaquim Barbosa.
Se ainda não
estão de todo esclarecidas as razões que levaram o Presidente Joaquim Barbosa a
requerer a aposentadoria antecipada, há sobejos motivos de preocupação quanto à
capacidade dos sucessores de seguir seus passos.
De qualquer
forma, o desenho de Chico Caruso pode ser pressago. É difícil sufocar a
verdade. E na Petrobrás – que em verdadeiro inferno astral pela série de ações
em foros americanos, com multas americanas, motivadas por inversores e agências
preocupadas com os atuais níveis de respeito à legalidade da maior empresa
brasileira – se reforça o movimento de uma geral limpeza nos quadros de sua
direção.
A presidente
da Petróleo Brasileiro S.A. fez ouvidos de mercador às comunicações e denúncias
de uma funcionária da empresa, Venina Velosa da Fonseca, que depois de arrostar
muitos dissabores e veladas perseguições burocráticas, resolveu uma vez mais
bater à porta da Presidente Graça Foster, alertando-a sobre desvios e
superfaturamento na Refinaria Abreu e Lima. A presidente, uma vez mais, não deu resposta nem seguimento
administrativo crível aos avisos da funcionária da Petrobrás.
Até o
presente, a presidente Dilma Rousseff se tem recusado a afastar a sua amiga
Graça Foster, por causa das inúmeras irregularidades na empresa, que, ao parecer,
não lhe fazem mossa.
Tampouco
atendeu e mandou que seu Ministro da Justiça respondesse por ela, e
negativamente, à sugestão feita pelo Procurador-Geral da República para que
demitisse Graça Foster. Afirmar a própria ignorância em uma empresa com os
problemas éticos e as irregularidades sinalizadas, pode constituir razão
bastante para destituição, eis que mostra pelo menos incapacidade de estar
informada sobre o que está sucedendo com a empresa de que ela é a presidente.
Problemas não
faltam na maior empresa nacional, e quando a gestão não atende ao que se espera
da responsável, as consequências devem ser tiradas em tempo útil e sem maior
tardança. O quadro da Petrobrás não atinge apenas a amiga da Presidenta. Dado o
descalabro administrativo e a perda de substância, ele vai bem além: impasse no
Conselho Administrativo sobre como registrar no balanço financeiro as perdas
com a corrupção forçou a empresa a apenas divulgar dados parciais na
sexta-feira, doze de dezembro. A previsão é de corte de investimentos e de não
fazer captações (i.e. tomar empréstimos) no mercado em 2015. Pede-se paciência
aos inversores diante da queda em bolsa das ações em 6,56%.
Por isso, é
difícil entender que Dilma Rousseff – que foi presidente do Conselho Diretivo
e, por conseguinte, tem muito a ver com a compra em condições tão estranhas da
refinaria de Pasadena – confunda amizade pessoal com decisões de estado.
Porque, em fim de contas, pode ser que na próxima semana já não mais estejam
batendo à porta pela demissão de Graça Foster da presidência da Petróleo
Brasileiro S.A., empresa com que o Partido dos Trabalhadores, por intervenção
de seus máximos líderes, se tem
comportado de forma que escapa às descrições mais negativas que imaginar-se possa.
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