quarta-feira, 26 de novembro de 2014

O Problema de Ferguson


                               

        Os jornais e as tevês falam de recrudescimento da violência em Ferguson.

        Antes de correr para verberar o recurso à violência, que será sempre condenável em tese, é mister examinar-lhe as causas mediatas e imediatas.

         A justiça, por outro lado, não deve só parecer honesta. Ela deve ir além, ser efetivamente coerente, dando aos respectivos desafios respostas que podem afigurar-se até severas, mas que não se furtam diante do exame imparcial das ocorrências.

         A violência da comunidade afro-americana volta a reacender-se, com uma série de depredações, conflitos e incêndios na noite de diversas cidades. E com característica que turbará os observadores: os protestos dessa comunidade foram ainda mais fortes do que no dia da morte do jovem negro Michael Brown.

        Essa reação, que repontou em mais de trinta estados, estendendo-se até ao Canadá, é decorrência de um misto de raiva e perplexidade diante de uma afronta.

       Mais uma vez um policial branco, movido por tênues suspeitas, mata um jovem negro. No caso do estado de Missouri, um policial branco, Darren Wilson, foi levado a atirar pelo gesto de mãos ao alto do jovem adolescente negro, Michael Brown.

       Na Flórida, no ano passado, um miliciano branco matou um jovem negro que pensava estivesse armado.

       Em ambos os estados, o policial e o assemelhado (uma espécie de segurança armado),  que permite a lei da Flórida foram declarados não culpados.

        Há distinções técnicas entre as decisões das justiças estaduais. No caso da Flórida, foi uma sentença de julgamento, e no mais recente, do Tribunal de Clayton, em Missouri, um grã-juri decidiu por maioria de votos que o policial branco não seria indiciado.

        Quando uma comunidade é colocada diante de decisões judiciais que parecem parciais, e que favorecem objetivamente ao segurança e ao policial branco, em detrimento dos jovens negros, como verão os negros a justiça na Terra de Tio Sam?

        Ao invés de uma decantada imparcialidade do doa a quem doer,o que se confronta é o resultado de decisões suscetíveis de serem inquinadas de parcialidade racial. A ameaça imaginária dos jovens afro-americanos, tomada como se fora verdade, pelos policiais armados, terá dado ao jovem negro alguma oportunidade de esclarecer o próprio comportamento de forma civilizada e consoante as práticas dos oficiais da lei?

         Cresce, com efeito, com a rapidez do Velho Oeste, que existiria de parte desses supostos agentes da lei entranhada postura de racial suspeita em relação aos negros.

        Eles, na verdade, seriam suspeitos, em princípio e em fim de contas, pela sua intrínseca condição racial. Armados, esses agentes não defendem a lei como os políciais de antanho, mas vêem confrontação e, o que é pior, ameaça em atitudes próprias de gente jovem. Esses,  na verdade nutrem confiança – que os fatos irão tristemente menosprezar – na circunstância de que não desejam mal algum.

        Sem embargo, será um erro fatal, a despeito de realizado com boa fé, porque não leva em conta -  e como deveria ? – a existência do mal que, em um e outro caso, se aninha nas suas suspicácias paranoides.  Na Flórida e no Missouri, o único perigo existente nesses falsos confrontos semelha residir na condição racial, que o policial branco assume como  se fora a verdadeira ameaça.

        É necessário pôr um basta a esses vereditos que, ao invés da verdade judicial, expressam a carantonha do preconceito e da provocação.

 

( Fonte subsidiária:  O Globo )

Nenhum comentário: