A Reforma de Papa Francisco
Expoente da
linha conservadora, o Cardeal americano de Cúria, Raymond L. Burke se vinha
mostrando crítico ostensivo do programa papal de reforma da Igreja, e até do
próprio estilo introduzido pelo novo Pontífice.
No sínodo de
outubro último, o Cardeal Burke liderara uma ala de oposição às propostas do
novo Pontífice, enfraquecendo e mesmo rejeitando linguagem mais aberta, voltada
para pastoral menos severa e mais compreensiva da condição de católicos
divorciados, e casados de novo, sem autorização da Igreja. Também assinalara Papa
Francisco, quando de sua inédita entrevista, no voo de regresso a Roma, após
a exitosa visita ao Rio de Janeiro, que
mudaria a atitude pastoral da Igreja quanto aos fiéis homossexuais. Entrementes,
na Sé de Pedro, Burke persistiu na sua oposição a propostas
que permitissem a católicos divorciados ou casados de novo, sem autorização da
Igreja, recebessem a comunhão.
Na Corte
pontifícia, os opositores do programa do Santo Padre devem ter presente que um
Papa progressista deve ser respeitado, e não enfrentado da forma com que o seu
programa de adequação da Igreja aos novos tempos foi combatido e até desfigurado.
Não se enfrenta
em vão um Pontífice, mormente alguém com largo apoio entre os fiéis. Por
desrespeitar essa regra não escrita – mas que um príncipe da Igreja não deveria
desconhecer – Raymond L. Burke, o antes poderoso chefe da mais alta autoridade
judicial vaticana – o Supremo Tribunal da Firma Apostólica – vai agora
recolher-se a velho casarão na Via
Condotti, sede dos Cavaleiros de Malta, onde será o Capelão desse grupo,
que, se no passado distante teve bastante poder, hoje atua apenas com fins
caritativos.
A Reforma da Imigração do Presidente Obama
O Presidente Barack Obama reserva, segundo
indicam as fontes da Casa Branca, uma boa nova para milhões de imigrantes que
vivem e trabalham muita vez precariamente nos Estados Unidos. Malgrado a sua
faina e a contribuição dada para a economia americana, milhões deles continuam
hoje na precária situação de imigrantes não-autorizados, e, por conseguinte,
passíveis de caírem nas malhas da Autoridade Imigratória (a proverbial e temida
Migra, que pode infernizar a vida de
trabalhadores de muitos anos, e separá-los do convívio das respectivas famílias
e filhos).
Não se
desconhece que foi fator importante para a reeleição do 44º Presidente a sua visão progressista e maior abertura
para a comunidade latina, em que se acham tantos dedicados trabalhadores, muita
vez expostos à intervenção inesperada e objetivamente cruel, das autoridades
migratórias.
Tal não foi
possível a Obama, diante da virtual paralisia do poder legislativo dividido
entre o GOP, que domina por causas de
sobejo conhecidas e já versadas várias vezes neste blog a Casa de Representantes, e o Senado Federal que, ainda com
maioria democrata até janeiro próximo, passará a ser igualmente controlado
pelos republicanos.
A despeito de
ter apoios relevantes dentre os parlamentares do GOP mais abertos e esclarecidos, a oposição da facção do Tea Party (e dos demagogos
conservadores, como o Senador texano Ted Cruz[1]),
inviabilizou qualquer possibilidade de abertura na reforma imigratória, a
despeito de gozar da caução de grandes nomes, mesmo nas fileiras
conservadoras).
Sem embargo,
apesar de presidente em fim de mandato (faltam-lhe pouco mais de dois anos na
Casa Branca), Barack Obama prepara a aprovação por decreto – a executive order americana, que equivale
ao decreto no Brasil – de reforma da condição imigratória, com mais humanidade
para uma comunidade importante e que
traz um aporte significativo para a sociedade estadunidense.
O que a miopia retrógrada de setores do
GOP não permitiu realizar por disposição do Congresso americano, poderá
tornar-se realidade pela reforma de Obama, que tenciona redirecionar a
atividade de cerca de doze mil agentes de imigração, atualmente empenhados na
função repressiva de identificar os trabalhadores indocumentados e, por
conseguinte, passíveis de expulsão. Assim como na frase famosa de Thomas Hobbes, a permanência na terra de Tio Sam pode terminar de forma solitária, pobre, ruim (nasty),
brutal e curta, talhada por uma sorte
madrasta, determinada burocraticamente.
O plano de
Obama, se implementado, afetará positivamente a cerca de 3.3 milhões de pessoas
que vivem (e trabalham) nos Estados Unidos, de forma ilegal, pelo menos por
cinco anos. Esses trabalhadores são pais
de filhos que são, ou cidadãos americanos, ou
residentes legais. Pelo novo instrumento, eles poderão obter documentos
legais de identificação e não mais preocupar-se com a perspectiva de serem
descobertos, separados de suas famílias, e em seguida reexpedidos para o país
de origem.
A reforma
imigratória poderá estender a proteção a migrantes não-documentados que vieram
para os EUA ainda crianças. Também não se exclui a inclusão de proteção aos
trabalhadores no campo, gente que entrou ilegalmente no país, mas que está por
muitos anos na atividade agrícola. Se efetivada, poderá beneficiar a centenas
de milhares de pessoas.
Essa reforma
deverá ser anunciada e implementada, quando do regresso do Presidente da Ásia e
Oceânia. Dentre os seus compromissos, está o encontro do G-20, em Brisbane, na
Austrália.
Não é de
esperar-se no contexto a cooperação de próceres republicanos – e notadamente políticos como Ted Cruz, e os
Senadores Mike Lee de Utah e Jeff Sessions, de Alabama. Nesse sentido, reincidem
no velho truque de impedir a elevação do limite da dívida do Tesouro. Chegam
mesmo a considerar incluir cláusula que proíba o Presidente de implementar o
que chamam de ‘anistia executiva’ para os imigrantes ilegais.
Com a
morte do antigo espírito bipartidário, essas expressões podem ameaçar uma
reforma generosa e inteligente. Talvez seja demais esperar desses elementos do
GOP atitude que venha a merecer esse tipo de qualificação.
Dada a
inação e a resistência de setores republicanos, John A. Boehner, o Speaker republicano
da Câmara de Representantes chega a mesmo a brandir a ameaça de processar o
Presidente (como chegaram a considerar fazê-lo na sua demagógica oposição à Lei
da Assistência Sanitária). Nesse espírito, volta a agitar velhos espantalhos
como o fechamento do governo federal (um tiro que já lhes saíu pela
culatra).
Excitados
pela recente vitória nas eleições intermediárias de novembro corrente, os
republicanos – segundo observadores – semelham dispostos a atacar o decreto
presidencial, malgrado ele tenha o aval do Procurador-Geral
Eric H. Holder [2]Jr.,
e que é, consoante fontes jurídicas, “legalmente inatacável”. Demonstrando a
própria grandeza, Barack Obama tem afirmado aos legisladores – em público e em
privado – que ele reverterá a sua Ordem Executiva sobre a imigração, se o
Congresso aceder afinal em aprovar uma reforma abrangente que possa ser por ele
assinada.
Essa
atitude republicana, que se recusa a considerar a relevância e a justiça
da reforma imigratória, pode, nas
palavras do Senador independente Angus
King, do Maine, criar uma reação (backlash)
no país, que poderia fazer recuar tal causa, e inflamar o ambiente político
americano de forma em nada conducente para a solução do problema.
( Fontes: New York
Times, O Globo, Folha de S. Paulo )
[1] Há perfis na imprensa
americana que vêem no Senador pelo Texas semelhanças com o demagogo Joseph
McCarthy, que antes de ser censurado pelo Congresso exercera enorme poder, até
que, dele ficasse apenas a pecha do macarthismo, e de um período nada brilhante
na história política americana, no qual a demagogia e a extrema-direita se
deram as mãos para infelicitar milhares de americanos.
[2] Attorney-General, cuja autoridade ultrapassa a de Ministro da
Justiça, como a história constitucional americana o demonstrou em várias
ocasiões. Por isso, sob certos aspectos, tem autonomia, e não está necessariamente subordinado ao
Presidente da República.
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