sexta-feira, 21 de novembro de 2014

O Brasil e a Corrupção

                                    

        Dada a incidência da prática, parecerá quase natural que a corrupção – ou a maneira mais bem-comportada de apresentá-la, com a versão meio-hipócrita do malfeito[1], segundo o figurino de dona Dilma, quando foram afastados uns poucos gatos-pingados de seu ministério – constitua fato incontornável, presente na natureza como qualquer coisa de irremovível, assim como o ar que se respira.

        Tive essa impressão quando li em articulista com diária presença no jornal acerca do fenômeno da corrupção, presente em prefeituras interioranas como se fora fato da natureza.

         Essa visão fatalista da incidência do ilícito em repartições públicas – com o vinco atual, voltado para os diversos avatares do artigo 171 do Código Penal[2] -  se vem tornando corriqueira, e, o que é mais grave, fator inarredável da condição brasílica.

         Em certas passagens, assinala-se, com resignação oriental, o toque fatalista de que, se tudo levarmos em conta, nada, literalmente nada, haverá a fazer.

       Se tomarmos essa postura ao pé da letra – eis que desconheço o político que não brade aos céus a respectiva honestidade – temos a alternativa: ou fingimos que acreditamos, ou procuramos informar-nos melhor.

       E há verdades bastante simples, que podem ser aplicadas. Assim, política é atividade humana – e como o demonstrou Pedro Neves da Rocha, na sua ‘Crítica do Animal Político’[3], essa expressão aristotélica não tem objetivamente sentido, se a tomarmos literalmente.

       Um dado importante – que contradiz o fatalismo quase oriental  ora prevalente em termos de possibilidades de combater e extirpar a corrupção – seria o exemplo da jardinagem. Se quisermos manter em nossos espaços residenciais alguma vegetação, e se além disso nos animar o desígnio de ter algum controle sobre tal projeto, teremos forçosamente de conscientizar-nos da necessidade de extirpar (e de podar eventualmente) tudo aquilo que deforme, invada ou desfigure o espaço ‘jardim’. O inço existirá sempre. A variável aí estará no comportamento de cada um, e, portanto da sociedade,  na sua disposição (ou falta de) para lidar com esse desafio. Agora, o combate à corrupção fica mais fácil, se, a exemplo da jardinagem, não nos   esquecermos da serventia dos fiscais, da necessidade de sua substituição (para que não tragam outro gênero de corrupção) e, não por último, do incremento das punições. Nada, no entanto, nesses brasis, substitui a autoridade e, em especial, sua imagem de correção. Nem pilantras, nem picaretas  servem para esse papel. Tenho alguns anos nas costas, e só vi um governo neste país que infundia no cidadão esse temor. Infelizmente durou pouco, mas isso não é desculpa para que não venha a surgir de novo.  

        No Brasil da atualidade, o Povo brasileiro tem pela frente um desafio. O PT possui um projeto tipo PRI (o do antigo Partido Republicano Institucional, do México), que é o de assenhorear-se do poder, não de forma episódica como ocorre com outros partidos, mas sim de modo permanente e sustentado. É o projeto do aparelhamento do Estado que os gerarcas petistas colocaram em prática. A idéia é simples: fazer com que o chamado Povo Soberano se aposse para o PT dos meios e instrumentos do Estado. A fórmula mais simples é o incremento geométrico dos cargos públicos, tanto os DAS, quanto os subsidiários, que ficam em mãos de membros do PT e de seus partidários.

            Não foi à toa que logo no início dos anos Lula começou a observar-se o incremento inusitado dos Gastos Correntes do Estado, vale dizer o empreguismo acelerado promovido pelo PT, com a inchação dos cargos públicos.

            A filosofia é a mesma da Bolsa Família. Este órgão assistencialista também é subvencionado não com dinheiro do PT, mas sim do Erário. Assim, como no empreguismo desvairado – em época em que se procura diminuir o Estado, para torná-lo mais ágil e menos oneroso – a filosofia relembra a do velho mercantilismo, só que à custa da Fazenda Pública, e com o escopo de desviar tais fundos para membros e simpatizantes do PT.

             Para o  PT, não tem importância que essa engorda do Estado contrarie toda a moderna Política, que deseja maximizar as vantagens estatais para a sociedade em geral. O intuito sectário do PT é o de aparelhar o Estado em proveito próprio, assegurando de lambuja o apoio automático quando das eleições.

             Ora, com um projeto desse jaez, em que o governamental é instrumentalizado por esquema de partido político – o aparelhamento do Estado –, com o claro intuito de eternizar-se no poder,  o Povo Soberano referido implicitamente no Preâmbulo da Constituição de 5 de outubro de 1988 está aí como Pilatos no credo.

             Veja-se a filosofia da Bolsa-Família e de outros projetos assistencialistas. O titular não deve esquecer só uma coisa: que não é o Estado o responsável pela benesse, mas sim Lula ou Dilma.

             Christovão  Buarque, o ideólogo da Bolsa Família, na verdade via o programa não como curral eleitoral, mas sim como porta de entrada para  vida melhor, em que o assistencialismo fosse uma via de passagem para a obtenção de melhores condições existenciais, feita com a exigência de manutenção das crianças na escola. Hoje, o assistencialismo tomou conta, e as pessoas abraçam o desemprego em troca do pagamento dos R$ 169,00.  

             No atual loteamento do Estado – e talvez os ministérios fiquem em 39 para não arremedar Ali-Baba e os quarenta ladrões – a presença da corrupção se tornou ainda mais difícil de ser combatida ou arrancada, porque o aparelhamento do Estado pelo partido político dominante torna para eles ainda mais difícil distinguir entre a fazenda pública e a privada.

             Para quem, como Lula da Silva e sua discípula, e candidata de algibeira, Dilma Rousseff, se acostumou a viver das benesses do Erário Público e de percorrer o largo espaço cinzento em que todos os gatos são pardos, o fenômeno do aparelhamento e o da apropriação das facilidades estatais se tornou mais do que uma tentação, e sim opção diuturna de engajamento.

            Pode-se, assim, dizer que a Petrobrás haja sido desvirtuada e suas atividades vistas de outra forma, com a progressiva adulteração das respectivas funções?

            Lembram-se daquele diretor dos Correios, Maurício Marinho,  que aceitou com um peteleco, uma propina de três mil reais? O que dirá agora, enquanto acaso palmilha a rua da amargura, quando vê as mansões dos indicados petistas, escolhidos estes por dignitários que passaram pela Papuda, e da qual já estão saindo com rapidez que desperta espécie em observadores de ofício...

 

( Este artigo é a sequência de  ‘Brasil e Nigéria, modelos intercambiáveis ?’ )    



[1] A que fomos introduzidos, ao ensejo da efêmera operação  faxina de Dona Dilma, quando da exoneração de um punhado de gatos pingados ministeriais.
[2] Não é decerto por acaso que um artigo de código penal se integra ao linguajar comum, como exemplo genérico de ilicitude.
[3] Cuja íntegra está publicada no meu  blog, no link de 3.XII.2013

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