Para o
observador da cena política brasileira, Dilma há de constituir um enigma.
Nesses tempos que atravessamos, no entanto, em que a insatisfação é grande, os
escândalos são muitos, e a desconfiança nos governantes grassa com mais
desenvoltura do que as queimadas no restolho da colheita, a perplexidade será
nossa companheira, quer se queira ou não.
Assim, o
cidadão não se contenta com meros substantivos jogados ao vento. Enigma, mas de
que tipo? Um claro enigma, como nos
fala o poeta? Um perigoso enigma,
como o da esfinge? Ou apenas um enigma,
que nos deixa irritados e confusos?
Estamos em
ano de eleição. Avançamos no mês de abril, mês dedicado às contas com a tributação.
A cada ano, nos invade a sensação de que pagamos mais, para receber um retorno
sempre menor, em termos de segurança, saúde, saneamento básico, e um vastíssimo
etcetera. Washington Luiz, longínquo antecessor da Presidenta, proclamara que
governar é construir estradas. Naqueles tempos do atraso, no ciclo da
monocultura cafeeira, parecia muito e caía melhor para quem não as tinha, e
carecia dos navios do Lloyd e da Costeira para o transporte de pessoas e
mercadorias.
Brasileiro e
brasileira, gente comum ou não, o senhor e a senhora estão contentes com o
presente governo? A mim me inquieta a imagem de Dilma Rousseff que vejo na tevê e leio nos jornais. Pois nesses dias tumultuados, a imagem pode tanto vir em foto de jornal, ou tomada de noticiário televisivo, ou até numa declaração feita a esmo pela governante.
Devo
reconhecer que, em termos visuais, já a vi com aspecto mais saudável, loução,
alegre mesmo. Perseguida e, por vezes, encurralada por problemas mil, a
fisionomia de Dilma passa sensação de infindo cansaço, com tudo isso que a
espera implacável em cada encruzilhada desses imensos brasis.
Mais do que
cansada, extenuada, acossada por
queixas, queixumes, disfunções e escândalos. Ao sentar-se, o suor na face, a
fadiga no olhar, ela parece a viajante esperada com um misto de impaciência,
ainda que moderada pelo respeito devido, que será cobrada por questões de todo
gênero, algumas de sua responsabilidade, outras, não.
Vejo
estressada a minha presidente, e embora não a tenha sufragado em 2010, já
evidenciei em alguns blogs a
disposição de apoiá-la, se me desse razão para tanto.
Infelizmente, devo confessar que tais oportunidades foram raras.
Herdeira de tempos de relativa fartura,
a ela coube muita vez arrostar os rigores do inverno. Desses, nem todos lhe são
estranhos, mas, por certo, não os criou todos.
Em termos de
passos falsos – e a inexperiência é um cartão de utilidade reduzida, porque a
paciência do cidadão tem pavio curto – talvez o mais gravoso haja sido brincar
com a inflação. Neopetista, a senhora
poderia ter aceito de peito aberto o Plano
Real, que transcendeu a cartilha política. Tal o mostrou Lula da Silva, ao respeitá-lo, na letra
e no espírito, pelo menos no primeiro mandato. A senhora pensou que podia lidar
com o dragão com as armas da retórica, e se viu no que deu. Depois de retirá-la
do frasco, fica difícil convencê-la – com toda essa sopa de índices – a nele
retornar. Tampouco é sério combater a carestia, em se convidando para almoço
Delfim Netto e Gonzaga Belluzzo. Enquanto se pensar que o Plano Real é coisa de
FHC e do PSDB, estamos mal. Porque debelar a inflação foi conquista do Povo
brasileiro, e para quem a viveu – por falar nisso a senhora viveu esses anos
difíceis na terra de Santa Cruz, não ? – é experiência desagradável e
mortificante agir de forma a trazê-la de volta.
Nesse sentido, basta de manobrinhas por baixo do pano para debilitar a Lei da Responsabilidade Fiscal. Custou
deveras aprová-la – o seu partido chegou a questioná-la no Supremo – para que
agora a abandonemos às feras do período pré-eleitoral, aquele de muitas falsas
benesses, que o pós-eleição cuidará de desmentir.
Peço-lhe
também que mande Guido Mantega e seus assessores desfazer-se de toda a contabilidade dita criativa que a
ninguém engana, e só contribui para jogar a peçonha da desconfiança em nossas
contas, com os resultados que a senhora bem conhece.
Esta
deveria ser curta, mas não grossa. Prometo-lhe, por conseguinte, que levantarei
apenas mais um tópico, que creio valha a pena referir.
As obras de infraestrutura para a Copa do
Mundo – sobretudo os terminais dos aeroportos – registram atrasos que, em
muitos casos, além de preocupantes, são
vergonhosos. Estão muito atrasados os trabalhos para os terminais em Fortaleza,
Porto Alegre, Brasília e Rio de Janeiro. O Ministro Moreira Franco já aventou a
possibilidade de ‘provisórios’ – ‘puxadinhos’ para vários aeroportos – o que é
lamentável. Quem vê e utiliza os novos terminais do aeroporto Charles de Gaulle em Paris, e os compara
com os ‘armazéns’ de Galeão e quejandos, sente imenso desconforto e há de
perguntar se o nível de nossos terminais, cotejado com os aeroportos de Europa
e Estados Unidos, é digno do Brasil e de seu Povo.
Nesse ponto,
a senhora na entrevista em Porto Alegre disse que “rigorosamente falando as obras atendem a Copa, mas elas não são para a
Copa. Elas são para o povo deste país.”
Em nações que acolheram Copa e Olimpíadas, nunca escapou dos Estados
respectivos o destino final das melhorias, mas se eles serviram-se do
compromisso assumido como oportunidade de o país ter renovados os terminais,
que, uma vez terminado o certâmen, lá ficariam para servir com dignidade a
população nacional. Dizendo que as obras são para o povo deste país, a senhora
dá a impressão de aceitar obras concluídas de afogadilho, dentro do padrão Infraero. Isso é deplorável
porque dessa forma a senhora dá a impressão de que todos esses puxadinhos e
terminais de lona podem servir.
Por mais
modesta que seja uma pessoa, quando recebe
visita, faz questão de dar-lhe o melhor tratamento. O que queremos
mostrar, Presidente Dilma, com terminais antiquados, sujos, e sobretudo
inadequados para os modernos viajantes ? Que nos orgulha a precariedade do
Terceiro Mundo?
(Fontes: O Globo, Rede
Globo)
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