A Crimeia volta para a Rússia, por força da
invasão manipulada e organizada pelo Presidente Vladimir Putin, agora com a
solene confirmação legislativa e da própria assinatura do sorridente senhor do
Kremlin.
A despeito de
a península ter sido transferida para a Ucrânia – então república dentro da URSS
– a perda pela Rússia, determinada por Nikita Krushev, não envolvera questões
de soberania.
Quaisquer que
tenham sido as razões do então Secretário-Geral do PCUS, se sentimentais ou geopolíticas, elas não afetaram a URSS.
Não é o que
ocorreu desta feita. Putin tratou de colocar o Ocidente diante de fato
consumado. A iniciativa militar teve todas as passadas características desses
atos de força. Contou com a atual fraqueza de Kiev, em que governo provisório sucede
à derrubada por insurreição popular do presidente Viktor Yanukovich. Por outro lado, na Crimeia, a maioria da
população é partidária da Rússia, mormente por questões étnicas.
Se a predominância do lado pró-moscovita não é
tão desproporcional quanto parece à primeira vista – na Crimeia a minoria
tártara é adversária do Kremlin, e a
nova geração, nascida após a implosão da URSS,
pende para a causa ucraniana – as circunstâncias (o falso referendo lançado
por Sergei Aksionov, a invasão não-declarada
das tropas russas, a falta de reação
crível de Kiev) tornaram incontrastável no curto prazo o ato de força do
Presidente Putin.
No entanto,
somente alguém que sofre de agudo ataque de precipitacionismo ahistórico se disporia,
sob o condicionamento do imediatismo factual, a afirmar que em termos geopolíticos, a
reintegração da Crimeia à Rússia é o evento mais importante do mundo pós-Guerra
Fria.
Para evitar
conclusões apressadas, os alemães, em termos de história, julgam prudente estudar
aquela mais próxima sob a denominação de Zeitgeschichte,
vale dizer história (ou crônica) do tempo. Implícitos estão os condicionamentos
dos fatos que muita vez assumem características imprevistas, não suscetíveis de
análise à quente.
O futuro dirá
que tipo de confronto se desenvolve. Porque uma das características do
imperialismo está na sua própria húbris.
Essa intoxicante disposição pode ou não conter os elementos de sua desagregação
futura.
Nesse contexto, se modelos passados de
imperialismo oportunista – como o de Mussolini, com muita audácia e pouco
embasamento – tornam questionável o êxito de Putin, o quadro vindouro tende a
ficar ainda mais turvo se anunciados movimentos de tropa em torno da Ucrânia
oriental (em que predomina a etnia de fala russa) se confirmarem, como o
indicam informações colhidas pelos Estados Unidos.
Em briefing para repórteres acreditados na
Casa Branca, a Assessora de Segurança Nacional Susan E. Rice, assinalou que ‘não está claro se o significado’ da
concentração nos limites sul-orientais da Ucrânia de tropas russas, trata de exercícios
de treinamento (conforme indicam
as autoridades de Moscou), ou à luz de suas passadas práticas e “ o hiato (gap)
entre o que disseram e o que fizeram, estamos observando com ceticismo”.
No Pentágono, oficiais
de nível sênior e analistas declaram que estão monitorando com crescente alarme
a movimentação da infantaria aerotransportada, defesa antiaérea e outros reforços. Há cerca de vinte mil
soldados próximos da fronteira, e por ora os analistas militares americanos,
sem condições de determinar com certeza o que pretende Putin, não creem na iminência de um ataque.
O principal problema
do Ocidente está na falta de tempo hábil para uma reação, se a investida se
confirmar. “As Forças Russas estão reforçando o seu contingente no limite
oriental ucraniano”, segundo representante do Pentágono. “Segundo pensamos,
eles estão mantendo as suas opções, inclusive com respeito a eventual invasão.
Se eles fizeram isto, nós não disporemos de tempo suficiente de aviso”
Os comentários da
Sra. Rice que embasam a viagem de Obama à Europa nesta próxima semana sugeriram
que as tensões entre os Estados Unidos e a Rússia continuariam a
intensificar-se. Perguntada se a crise ucraniana estava provocando uma “reavaliação
básica” do relacionamento de Washington com Moscou, Rice respondeu
afirmativamente.
A Assessora de
Segurança Nacional asseverou que a integração russa na ordem política e
econômica global estava predicada na sua adesão a regras e normas
internacionais. “O que vimos na Ucrânia é obviamente um gritante afastamento
dessas práticas”, declarou Susan Rice.
Segundo tudo
indica, a Casa Branca está prestando menos atenção às palavras de Putin do que
à movimentação de suas tropas, descritas como de infantaria, e forças
motorizadas e aerotransportadas. Há
preocupação de choques com soldados ucranianos, em que aumenta a tensão.
Na quinta-feira,
o ministro da Defesa da Federação Russa, Sergei
K. Shoigu, disse para o Secretário da Defesa dos Estados Unidos, Chuck Hagel, que ‘as tropas alinhadas na
fronteira se destinam a realizar apenas manobras, e que não têm a intenção de
cruzar a fronteira com a Ucrânia, e que, por isso, não vão empreender nenhuma ação agressiva”.
O Secretário
Hagel está em contato constante com o Ministro da Defesa da Ucrânia, Ihor Tenyukh. Este pediu assistência
militar, o que inclui armas de pequeno porte, assim como ajuda não-letal, e
suprimentos medicinais. O Pentágono daria preferência por ora em assistência
não-letal.
A dezenove do
corrente, o Primeiro Ministro ucraniano, Arseniy
Yatsenyuk, telefonou para o Vice-Presidente Joe Biden para inteirá-lo da crescente tensão no leste do
país. Biden estava em missão na Polônia
e estados bálticos para reconfirmar o apoio americano na movimentação russa
anti-Ucrânia. Como é previsível, há divisões profundas entre os europeus quanto
à aplicação de sanções. O Presidente da
Estônia, Tomas Hendrik Ilves preconiza ousadia, com o que não concordam Polônia e Lituânia, pelos contratos de fornecimento de
energia com a Rússia...
(Fontes:
The New York Times, Folha de S. Paulo)
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