Tiro no Pé
A
versão muitas vezes sobrepuja o fato em si. O tiro no pé é (ou não é)
uma declaração do ex-Presidente Lula sobre a atitude, ou melhor, o rompante da
Presidenta, ao decidir escrever do próprio punho uma nota oficial sobre a
questão da compra da refinaria de Pasadena. Depois de avalizar a compra da
refinaria como chefe do Conselho de Administração, Dilma decide não mais
continuar a dar apoio à posição oficial da Petrobrás de que o negócio parecia
bom com as informações do mercado naquela época.
Se o
ex-Presidente Lula usou ou não a
expressão ‘tiro no pé’ e se, inclusive, a desmentiu oficialmente, a
questão vista nas suas implicações torna irrelevante ser ou não de sua autoria,
levados em conta os efeitos práticos para sua pupila.
Dilma
paga o preço de haver respondido sem pedir nem esperar os necessários e
indispensáveis conselhos. Em peculiar ironia, a circunstância de haver acoimado
os relatórios favoráveis à compra de ‘técnica e juridicamente falhos’, trouxe,
consoante a opinião de gregos e troianos, para dentro do Palácio do Planalto um
problema que era da alçada da Petrobrás.
Nesse
episódio – em que as consequências foram imediatas e de grande transparência –
Dilma Rousseff agiu conforme o próprio temperamento e mesmo instinto. Terá sido
prejudicada no passado por não colher a opinião e o parecer de políticos e
especialistas. Agiu como sempre faz, julgando poder prescindir ex-vi do cargo que ocupa dos juízos e das
avaliações de expertos nos diversos temas.
A minha imagem, tantas vezes repetida, carece de ser dita uma vez mais:
por acreditar que a árvore mais alta e frondosa na floresta prescinde do aporte
de outras menores, Dilma sequer terá cogitado da conveniência e oportunidade de
passar a respectiva opinião na peneira de pessoas com experiência em questões
do gênero.
Não é
possível determinar se este ato falho terá consequências políticas. A probabilidade é, no entanto, grande.
A Ucrânia e a Timoshenko
Posto
em fuga pela insurreição da praça Maidan, a razão do iniquo confinamento da
líder da oposição desaparecia, enquanto o campo de Yanukovitch debandava e
assumia o poder o lado adverso, aí incluído o Primeiro Ministro Arseniy Yatsenyuk,
bastante próximo da Timoshenko.
Vinda de prisão hospitalar, forçada a uma cadeira de rodas, não hesitou
em vir até o centro da revolução, aonde discursou para a multidão, que a
recebeu da forma que lhe era devida.
Com
o seu arqui-rival banido, o passado da Timoshenko – que a jogou no cárcere,
apesar de um juízo encomendado – viria agora reclamar a sua libra de carne
quanto à sua atuação no governo. De
certo modo, os aplausos em Maidan pareciam o lastro de uma acrescida
desconfiança. Como se todos os políticos não diferissem na sua postura quando
no poder.
Yulia Timoshenko, eventual cadeirante, disse então: ‘Como político, eu
me arrependo. Até hoje, os políticos não foram dignos de vocês.’
Brutalmente afastada da política, a Timoshenko, ao contrário de outros,
recebeu um áspero e mesmo cruel tratamento, menos pelos seus defeitos, do que
por suas qualidades.
Confinada em um lazareto do interior da Ucrânia, sem tratamento médico
digno desse nome, ela se descobre agora acusada das mesmas faltas de quem a fez
condenar, posto que a punição tenha sido motivada menos por seus defeitos, do
que por suas qualidades e a ameaça potencial que colocava para o rival.
Decaído agora Yanukovitch, os colunistas lhe redescobrem o passado, que
se antes servira para submetê-la a um julgamento em que estava de antemão
condenada, teve o prazo de validade reforçado, na medida em que volta a
colocá-la em posição de desvantagem.
Quando deparo essa súbita orquestração, em que a Timoshenko é colocada
no mesmo cesto que Yanukovitch, por colunistas americanos como experiência na
Rússia e redondezas, como David Remnick (do New Yorker) e Steven Erlanger (do
New York Times), pergunto-me da serventia de tais medidas para Vladimir Putin,
que, segundo acusações de corajosos opositores, se serve de ambas com muita
desenvoltura.
Nesse contexto, é de recordar-se a exigência dos diplomatas alemães da
república de Weimar, que reivindicavam a Gleichberechtigung
(igualdade de direitos) para a Alemanha derrota do entre-guerras. Se o Ocidente
vitorioso os tivesse ouvido, quem sabe a história seria diferente, e líderes
ultra-radicais como Adolf Hitler não houvessem prosperado para a desgraça da
Humanidade.
A
comparação pode ser válida até certo ponto. É sempre bom ter presente o
contexto e quais as alternativas disponíveis.
O Modelo UPP
A
PM também tomou os morros do Chapadão, em Costa Barros, do Juramento e Juramentinho, em Vicente de Carvalho, e a
favela Para-Pedro, no Colégio. Ontem, mais um PM foi morto, em uma perseguição
na Zona Oeste.
Segundo a PM, essa ocupação seria uma forma de preparar a cidade para a
chegada de homens da Força Nacional e das Forças Armadas, que são aguardados
nos próximos dias.
O
modelo UPP, do secretário José Mariano Beltrame, pode ser contestado, mas até o
momento não há substitutos à vista. Os seus críticos – que se ligariam ao
passado da chamada cidade partida - apresentam
censuras e reparos, mas não um outro modelo com credibilidade.
A
vinda do reforço da Força Nacional deve ser, no entanto, encarado como um
auxílio temporário. As Forças Armadas e o BOPE puseram para correr os trezentos
bandidos do Alemão, mas como a sua utilização – no que tange às FFAA e a Força
Nacional – tem prazo, a PM tem de reforçar-se tanto através do comportamento de
seus integrantes, que precisam ser mais solidários com as comunidades defendidas.
Atitudes como a dos três PMs que colocaram uma vítima baleada na mala do carro
– e a arrastaram por um tempo (o que só foi visível graças ao celular de um
motorista) – não são admissíveis.
Uma
P.M. integrada com a comunidade não teme líderes comunitários, porque a sua
consonância com o pessoal da favela, se
efetiva e real, torna, das duas uma, ou supérflua a sua intervenção, ou
incriminatória de sua eventual ligação com o tráfico.
(Fontes: O Globo,
Folha de S. Paulo, The New York Times, New Yorker)
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