Eurasianismo é a ideologia do futuro na Rússia?
Timothy Snyder
escreve em The New York Review
interessante artigo sob o título Fascismo,
Rússia e Ucrânia[1].
No contexto, desejo reportar-me em especial acerca de ideologia de direita,
autoritária e de cunho fascistóide, de que se ocupa Snyder. Trata-se do Eurasianismo,
que seria o instrumento para combater a ‘decadência’ da União Europeia e seus
princípios democráticos.
Não é
infelizmente coisa de somenos, como se fosse mais um credo direitista, pregado
por algum crackpot (louco manso). A
ideologia eurasiana, fundada em 2001, pelo cientista político russo Alexander
Dugin, propõe a realização do Bolchevismo Nacional. Ao
invés de rejeitar ideologias totalitárias, vai colher tudo o que reputa útil no
fascismo e no estalinismo. Com efeito, o magnum
opus de Dugin – As Fundações da Geopolítica (1997) – segue de perto o
pensamento de Carl Schmitt, o principal teórico político do Nazismo.
Dessarte, o eurasianismo não é somente
a fonte ideológica da União
Eurasiana (o projeto acalentado por Vladimir Putin), senão o credo de
muitos na Administração Putin, e a força motriz em movimento da juventude russa
de extrema direita. Nesse contexto, semelha interessante a sinalização de
Snyder de que Dugin apoia abertamente a divisão e a colonização da Ucrânia.
Sem entrar em
salpicos de antissemitismo de discípulos de Dugin , como Sergei Glazyev (que
coordena no Kremlin as políticas eurasiana e ucraniana!), a ideologia eurasiana passou para os cuidados
de Dmitri Kiselyov, que toca o principal show de opinião , na Russia, que
acumula tais funções com a direção do conglomerado estatal da mídia para a formação
de opinião. Kiselyov assumiu a campanha
de gospodin Putin contra os direitos dos gays,
e a transformou em arma contra a integração europeia. Nesse sentido, de acordo
com o ministro do exterior russo, a exploração da política sexual deveria ser
uma arma utilizável (open) na luta contra a ‘decadência’ da U.E.
Snyder mostra
igualmente a tortuosa linha de argumentação da ‘ideologia’ eurasiana, no que
tange a ‘confusões’ com o fascismo.
Assim, a linha de legitimação moral (sic)
do eurasianismo seria a seguinte: como
os representantes do regime Putin se distanciaram do Estalinismo de forma muito seletiva, eles podem ser vistos
como ‘confiáveis’ herdeiros da história soviética, e, por isso, como
automáticos oponentes dos Nazistas, e por conseguinte da Extrema direita.
Como Timothy
Snyder mostra, nesse tese há muitas falácias, como a aliança Hitler – Stalin às
vésperas da II Guerra Mundial, a expulsão dos judeus sobreviventes para a
Polônia ocupada pelo nazismo, sem falar da campanha que camarada Stalin
preparava contra o judaísmo internacional
em 1953 (quando faleceu).
Tenha-se
presente, igualmente, que não é por acaso existirem tantos próximos de Vladimir
V. Putin a defenderem o Eurasianismo como política (autoritária) de Estado.
Como alguns desses ‘ideólogos’ defendem a colonização da Ucrânia, fica mais
fácil de entender as iniciativas de Putin, e o seu desrespeito pelos tratados
assinados e a recentíssima invasão da Península da Crimeia, com o escopo de
reverter a perda histórica (em 1954) dessa região, que foi na época cedida à
República da Ucrânia.
Não tendo na
época nenhum significado em termos políticos e militares – como se sabe, a
União Soviética estava muito bem de saúde, e a ‘cessão’ da Crimeia para a
Ucrânia nada representava em termos de eventual redução do poder geopolítico e
militar da URSS.
Decorrência
direta dessa política imperialista de Putin está na organização do plebiscito
na Crimeia, que não sem razão vem sendo declarado como írrito e sem qualquer
valor pelo governo ucraniano, assim como por Washington e o Ocidente,
notadamente a União Europeia e Berlin.
O Plebiscito pró-Russia
Putin – que não desdenha métodos
violentos e autoritários na política interna – semelha ora inclinado a trazer um
pouco desse ar mefítico para as relações externas. Posto que se deveria assumir a ação na
Abkázia e na Ossétia do Sul como indícios em tal sentido, a sua desimportância
estratégica terá levado qualificá-los como exceções, e não pelo que
efetivamente eram, indícios de um comportamento fora dos pressupostos vigentes.
Havendo a
Federação Russa vetado a resolução do
Conselho de Segurança das Nações Unidas que declarava ilegal o referendo da
Crimeia, a reação do Ocidente se dirigirá para penalizar individualmente os
membros sênior do círculo dirigente em torno de V. Putin.
Por outro lado
esse referendo já nasceu ilegal. A alternativa que ele supostamente
coloca para o eleitor na Crimeia é falsa. As duas opções
são: (a) Está em favor da reunificação
da Crimeia com a Rússia, como parte da Federação Russa ?; e (b) Está em favor
de restaurar a Constituição de 1992 e o status da Crimeia como parte da Ucrânia
?
Essa suposta
segunda opção daria à Crimeia a independência da Ucrânia sem ruptura com Kiev,
pelo fato de que tal ruptura se tornaria inevitável. E foi justamente por causa
dessa falsa opção que o referendo foi declarado ilegal pelo Ocidente.
Outros elementos
no cenário instituído por Putin reforçam a sua ilegalidade. A cínica intervenção
militar orquestrada por Moscou, com o envio de tropas russas descaracterizadas,
o controle das instalações militares da Crimeia ucraniana, e o acintoso
desrespeito ao direito internacional público e ao princípio do pacta sunt servanda (os tratados devem ser honrados).
Movido por
ideologia fascistóide (V. Eurasianismo), que é uma mixórdia (halfbaked) de elementos autoritários do
nazismo e do bolchevismo estalinista, esse retorno do imperialismo reintroduz
nas relações internacionais atmosfera deletéria, reminiscente notadamente da
insegurança em termos de princípios e de respeito aos direitos dos povos (em
especial, os mais fracos) que caracterizara o período de entre-guerra.
Em meio à
deplorável atitude de uma parte dos grupos favoráveis a Moscou – o que relembra
uma ‘solução’ preconizada para o problema ucraniano, i.e., a sua colonização
pela Rússia – é interessante notar que a juventude da Crimeia (nascida depois
da extinção da URSS) privilegia a nacionalidade ucraniana ao invés da russa
(preferida pelos mais velhos).
Dado o seu
potencial demográfico, é uma porta aberta para futuro mais promissor que a
Ucrânia – como o fez a Polônia – escolha o Ocidente e não as muralhas do Kremlin. E não se trata apenas do
aspecto econômico que está em jogo. Fica mais fácil entender a pertinácia e a coragem dos manifestantes da Praça Maidan.
Nuvens negras sobre o programa das UPPs
No correr da
semana, este blog tratou de questão
que muito interessa o domínio da lei no estado do Rio de Janeiro. As ameaças do
tráfico contra as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que é o cerne da
política de segurança introduzida pelo Secretário José Mariano Beltrame, se têm
exacerbado nas últimas semanas, com uma série de assassínios de policiais militares
empenhados nesse trabalho.
A resposta do
Governo Sérgio Cabral e do próprio Secretário de Segurança tem sido firme, com
a acentuada utilização do batalhão de elite da PM, o BOPE, para criar condições
de que essa política não constitua apenas um interregno, mas que se crie uma
situação efetiva para a normalização das condições de vida de largos
segmentos da população, mantidos à
margem ou o que é pior, sob o domínio do tráfico e da ilegalidade, por tantos
anos. Daí, o júbilo que acolhera a operação conjunta dos FFAA e Polícia
Militar, que levou ao desmantelamento do tráfico no Complexo do Alemão, e a que
me referi no correr desta semana.
Estamos, no
entanto, às vésperas de eleições no Rio de Janeiro. O mandato do Governador
Sérgio Cabral se aproxima de seu término – e, por conseguinte, a presença à
testa da Secretaria de Segurança do Secretário José Mariano Beltrame. Se for eleito o candidato preconizado por
Sérgio Cabral – o Vice-Governador Luis Fernando de Souza, o Pezão – dentre as
muitas dúvidas acerca do futuro, a continuação do Secretário de Segurança
Beltrame – que é o condutor e o garante do plano de pacificação atualmente em
aplicação – deixaria de ser possibilidade para constituir uma probabilidade.
No que tange aos
demais pré-candidatos ao governo – notadamente Lindbergh Farias, do PT e
Garotinho, do PR – quaisquer objeções que se façam à administração Cabral, elas
se dissipam se a sociedade fluminense obtiver a garantia da eventual
permanência do Delegado Federal José Mariano Beltrame, no caso da eleição do
candidato Pezão.
O jovem senador
Lindbergh tem feito em sua pré-propaganda eleitoral (veiculada pela tevê)
muitos reparos e dúvidas sobre o programa de pacificação. Há indicações de
transformações no dito programa que trazem à baila antigas situações de descontrole
e de demagogia, que a gestão de Beltrame tem trabalhado, com firmeza e
coerência, pela defesa e sustentação da pacificação, dentro dos princípios
enunciados desde o início do programa.
Infelizmente,
não é o momento de experimentos e de modificações em programas que têm o apoio
da população diretamente interessada, e a par disso, a indicação de uma firmeza
de propósitos, longe da demagogia e dos novéis experimentos.
(Fontes: Timothy Snyder, New York Review of
Books, The New York Times, O Globo, Rede Globo)
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