quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Junho já está esquecido ?

                             

          Outro dia, os jornais anunciaram que a pauta das reivindicações das passeatas de junho dorme nas gavetas de Câmara e Senado.
         De repente, desapareceu a urgência e tudo semelha voltar à pasmaceira de antes. As PECs relativas às votações das cassações, a serem doravante decididas por voto a descoberto, voltaram à situação anterior. Nada mais anda... Como se, passada a tempestade, o Congresso das quartas-feiras pensasse em voltar às antigas usanças, sob a doce música (para os ouvidos deles) da alienação parlamentar.

        Outro comportamento similar está na renovação das posturas de independência dos poderes, sobretudo no que concerne à cassação de mandatos de Suas Excelências. Em termos de cassação de mandato parlamentar, por decisão colegial do Supremo, a determinação da cassação ficaria a cargo do Congresso (Senado ou Câmara).
        Essa alteração, se mantido o voto secreto, pode criar problema similar ao do congressista presidiário Natan Donadon. Bem fez, portanto, o Presidente Henrique Alves, no caso em tela dos deputados presos (ou por serem presos), em função de sentença do STF, de evitar que reponte e ressurja a dança sem sentido do corporativismo exacerbado. Por isso, o presidente da Câmara, o Deputado Alves, deixou bem claro que só porá a matéria em votação quando alterado o instituto respectivo para o voto aberto.  Invibializará, dessarte, a repetição do vexame da negação da cassação ao deputado Natan Donadon. É sensata a decisão do Presidente Henrique Alves, ao evitar ulterior motivo para a desmoralização da Câmara.

        Neste jogo de vaidades, é de lamentar-se que se deixe ao bom senso as ações respectivas. O caso precedente, pelo seu absurdo – negar a cassação ao deputado Natan Donadon – afundou ainda mais o processo vigente, em que os deputados se escondiam no anonimato para manter situações que são afronta antes de tudo à própria cidadania.
        Quanto ao caso do Deputado José Genoino, não confundamos alhos com bugalhos. Pela sua condição médica, Genoino deve ter decretada a prisão domiciliar, porque mais do que um erro, seria desumanidade mantê-lo no regime atual, com a precariedade dos atendimentos médicos do cárcere.

      Entretanto, o deputado Genoino foi legalmente condenado pelo Supremo em sessões públicas, na Ação Penal 470. Não querendo ser mais realista do que o rei, forçoso será concluir que a omissão do Supremo deveria ser corrigida. Não é o caso de conceder ao Congresso a opção de divergir sobre determinação judicial. Atuando dentro de sua competência, o Supremo tomou decisão, de que não cabe recurso. À Camara (ou ao Senado) cabe apenas tomar ciência, em decisão de índole administrativa.  Ipso facto e ipso jure[1], por conseguinte, o seu mandato de deputado foi automaticamente cassado. Caberia à presidência da Câmara tomar conhecimento do fato, e registrá-lo para os devidos fins. E nada mais.
      Na democracia americana, um juiz singular, após o devido processo – que prescinde de qualquer autorização, seja do Senado Federal, seja da Câmara de Representantes – após conhecer, julgar e eventualmente condenar o parlamentar, cria um fato jurídico perfeito e inatacável. O congressista não tem nenhum privilégio no particular sobre o cidadão comum. Agora, tal procedimento acaso nos induziria a considerar o regime estadunidense como menos democrático?

     Infelizmente, as condições da democracia em Pindorama exigem que precauções ulteriores sejam tomadas, como atribuir a competência do julgado ao Supremo. Mas depois de todo o processo, realizado em sessões públicas, e asseguradas todas as defesas, esgotado o contraditório, a justiça no Brasil não merece passar pelas forcas caudinas do privilégio de que outro Poder se sobreponha à lei (válida para os demais mortais) e assegure aos congressistas um juízo de exceção. Como, no entanto, essa decisão corporativa só tem o valor de manter a ficção do mandato – como se viu no caso do deputado Donadon – creio que é mais do que tempo que o Legislativo  – no caso a Câmara – cesse com tais encenações corporativistas e mostrem respeito à Lei e a competência dos Poderes. O que, mutatis mutandis, semelha ser a posição do Presidente Henrique Alves.
 

 
(Fonte: O  Globo )   



[1] Pelo mesmo fato e pelo mesmo direito.

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