Que o espírito do bipartidismo e a
presunção de que Governo e oposição devem ter sempre presente a premissa de que
Democratas e Republicanos servem ao mesmo país, e daí a necessidade de jamais
esquecer o interesse nacional, que sobreleva àqueles de partido ou facção, que
esse espírito desde muito se ausentara da colina do Capitólio, eis verdade factual que o comportamento do GOP na
oposição cuidou de observar diuturna e acintosamente.
Todo o exagero e todo o extremismo carregam
dentro de si o germe de sua própria destruição. O líder da maioria, o Senador
Harry Reid (Nev/Dem.) evidenciou por muito posição moderada que sua contraparte, o Líder da Minoria, Senador
Mitch McConnell, terá confundido com fraqueza.
Pelo regimento
do Senado, até ontem, o debate – e, por conseguinte, a prática do filibuster – só poderia ser encerrado
por sessenta votos (o Senado,
presidido pelo Vice-Presidente, tem cem
senadores). Essa regra estava em vigor desde 1975. Anteriormente, entre
1917 e 1975, a maioria exigida para tanto era de dois terços.
O sistemático
abuso pelos opositores republicanos do filibuster
– que era utilizado precipuamente para bloquear as designações para cargos no
executivo e no judiciário – forçou, por fim, o líder da maioria a ter de pôr em
votação proposta de mudança da regra no regimento do Senado: se aprovada,
passaria a valer a maioria simples, i.e., 51 votos.
A estratégia do
GOP havia sido até então a do
bloqueio cego das designações da Administração Obama, tanto para o poder
Executivo (e há 1183 cargos que requerem confirmação pelo Senado), quanto para
o Judiciário. Em política de terra
arrasada, os candidatos não eram avaliados pelo GOP por suas qualificações e eventuais antecedentes. O partido
Republicano se limitava a bloquear, por intermédio do filibuster, as nomeações,
sem preocupar-se em fundamentar a motivação dessa postura, que só é cabível
quando a fé de ofício ou os antecedentes do indicado militam contra a respectiva
confirmação.
A obstrução
das nomeações tornou-se a regra do GOP na oposição. Dado o cinismo desta
posição – que racionalmente não se sustenta – e a enorme diferença com o
comportamento dispensado a presidentes anteriores, a única surpresa na mudança
da regra quanto ao filibuster se
encerra na pergunta – por que a modificação demorou tanto para ser implementada
?
Quando o
líder Harry Reid se decidiu a agir, havia em pauta, pendurados pela recusa do GOP,
59 designações para cargos no
Executivo e 17 para o Judiciário Federal.
Como o seu
afrontoso desrespeito ao espírito parlamentar se estendera durante a primeira
Administração Obama (com 27 filibusters para cargos no
Executivo), o GOP terá pensado que
pela ameaça de retaliações futuras lograria manter o bloqueio a que o governo
Obama pudesse atuar normalmente, em consequência da vitória nas urnas em 2012.
Para que se
tenha idéia de o quanto pesou na balança o abuso do ‘veto’ da bancada do GOP para que Obama governe, semelha
relevante assinalar que o Presidente Barack Obama, no segundo mandato, já teve 45 nomeações para o Executivo
contestadas por filibuster ! Em contraposição, Eisenhower (Rep.), Kennedy
(Dem.), Johnson (Dem.), Nixon (Rep.) e Ford (Rep) não tiveram nenhuma
contestada. Em tempos mais próximos, Carter (Dem.) teve duas, Reagan (Rep.)
também duas, Bush sênior (Rep.) nenhuma, Bill Clinton (9), Bush júnior (7) e
Obama, com os já citados 27 e 45 (na primeira e segunda
Administrações).
A maior
ironia é que foi no judiciário a última palha que levou o líder democrata a pôr
em votação a mudança regimental (e apenas três democratas dissentiram do
chefe), com a votação por 52 a 48
determinando a mudança da regra para encerrar o filibuster por maioria simples. Havia três vagas na Corte distrital de
Washington, em nível de tribunal de recurso. Para não preencher as vacâncias,
os republicanos chegaram a propor que o efetivo dessa corte fosse reduzido em
três! O interesse estava apenas em manter o viés conservador – dado por Bush
júnior – a esse importante tribunal distrital.
O erro do Senador Mitch McConnell foi o de
pensar que a sua estratégia de bloqueio virtual da Administração Obama – em
postura que relembra o seu lema anterior de impedir a reeleição do 44º presidente,
e de tornar Obama presidente de um só mandato, falhou pela debacle do candidato
republicano Mitt Romney – poderia em sã mente prevalecer
indefinidamente.
Foi com
ameaças que o líder da minoria recebeu a derrota: “Pensam que isto (a mudança na regra do filibuster) é o melhor para o
Senado e o Povo Americano ? Vocês (os senadores democratas) vão lamentar isto. E vocês podem lamentá-lo
mais cedo do que pensam.”
Ao
enrijecer as regras e passar para a tática de não permitir que a Administração
Obama possa governar, o Partido Republicano, estimulado talvez pela húbris, pensou que poderia converter a
excepcionalidade em norma básica e corriqueira. Quem desconhece os limites do bom senso, bem cedo será levado a deles
tomar conhecimento em condições bastante mais desfavoráveis.
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