domingo, 17 de novembro de 2013

Colcha de Retalhos A 42

                                    

A Greenpeace respeitou seus ativistas ?

 
        Continua o padecimento dos trinta ativistas do Greenpeace – entre os quais a brasileira Ana Paula Maciel. Estão presos há mais de dois meses, nas habituais condições dos cárceres russos, após a operação determinada pela organização ambientalista, em protesto contra a exploração de petróleo no Ártico.

       O aquecimento global, com o fenômeno do acrescido degelo no Ártico, decerto favorece a exploração do petróleo, além de abrir à navegação o antes congelado oceano. Tais benesses, no entanto, vem acompanhadas de efeitos colaterais desastrosos, e, em especial, sobre o permafrost dos grandes espaços siberianos (e do Alaska!), e a consequente liberação do gás venenoso metano.
      Mas não é disso que pretendo ocupar-me. Como se sabe, a operação do Greenpeace, que visava protestar contra a exploração de petróleo no Ártico pela Federação Russa, terminou com a detenção dos trinta dedicados militantes do Greenpeace, a princípio com a ridícula acusação de pirataria à tripulação da pequena embarcação. Mais tarde, a justiça russa rebaixou a imputação para vandalismo, o que também não procede.

      Os militantes – e a brasileira Ana Paula, entre eles - sofrem a traumática experiência de uma das justiças mais e atrasadas do planeta. Não há muitas diferenças entre o que sofreu o escritor oitocentista Fiodor Dostoievski (que nos deixou  Recordações da Casa dos Mortos de sua prisão de quatro anos na Sibéria), e o dia-a-dia nas masmorras sob gospodin Vladimir V. Putin, que agora enfrentam os corajosos militantes da Greenpeace (primeiro na gelada Murmansk (Sibéria) e presentemente, em São Petersburgo, em condições um pouco menos ruins ).
     O fato de que os acusados sejam colocados em jaulas individuais constitui indício não tão sutil das características da justiça sob (e põe sob nisso!) do Presidente de todas as Rússias, Vladimir V. Putin. Não é preciso pesquisar muito para determinar que a justiça na Rússia (e as respectivas prisões) ainda não foram muito influenciadas pelo tratado (século XVIII) Dos Delitos e das Penas, de Cesare Bonesana, marquês de Beccaria...

      A gaúcha Ana Maciel, a par de sua simpatia, vem demonstrando muita firmeza, enquanto ergue seus cartazes para salvar o Ártico, além de agradecer ao governo brasileiro, e na embaixada em Moscou, ao que presumo seja  auxiliar-local, Clara Solon, a quem considera quase  uma segunda mãe.
       Como previsto, o fato de pertencer ao BRIC não parece ter comovido gospodin Putin (presumo que a Presidenta Dilma lhe terá enviado alguma mensagem). Por outro lado, Ana Maciel não se refere a nenhum diplomata brasileiro. Será que nenhum teve tempo de aparecer para visita de apoio à pobre moça?

      E não por último, creio de toda oportunidade sublinhar a irresponsabilidade da Greenpeace ao realizar essa operação demonstrativa contra a exploração do petróleo no Artico pela Russia. Além de ser mais do que previsível a mão pesada do governo autoritário de Vladimir Putin, e a discutível oportunidade de colocar em risco seus militantes (não é o mesmo que enfrentar os navios-usina do Japão na pesquisa científica das baleias no Mar Antártico), creio que teria sido muito mais humano e sensato poupar os respectivos militantes desse arriscado stunt (invasão acrobática) da base russa. Será que a alta direção da Greenpeace não teria outro meio mais responsável e mais respeitador da integridade física e mental de seus dedicados ativistas, para  divulgar a falta de consciência ecológica de Vladimir Putin e de seu governo ?     

 
Blue Jasmine

       
        O novo filme de Woody Allen evidencia, uma vez mais, a versatilidade do cineasta americano. A filmografia de Allen impressiona tanto pela diversidade, quanto pela qualidade. Assim, nas suas películas mais recentes ele passa tanto do realismo mágico de Meia Noite em Paris,como para o drama social de Match Point,ou a comédia picaresca em episódios  Para Roma com Amor  e agora a tragédia burguesa de Blue Jasmine.

       Inspirado pelo estelionatário Bernard Madoff, as fraudes do personagem Hal (Alec Baldwin), marido de Jasmine (Cate Blanchet) constituem o subtexto do filme, proporcionando à mulher uma vida de socialite em Manhattan, Paris e adjacências. O filme começa com a vinda de Jasmine para San Francisco, onde viverá com a irmã, a atriz inglesa Sally Hawkins, que a recebe com boa vontade no seu apartamento chinfrim. As duas irmãs foram  adotadas e Ginger não guarda rancor da maneira com que Jasmine a tratara, em que um menosprezo light estava sempre presente.

       Jasmine tem igualmente vergonha do marido da irmã, Augie (Andrew Dice Clay), por ser brega e de baixo nível. No entanto, ao saber que o casal ganhara na loteria – o que permitira a vinda a Manhattan – Jasmine (que desconhece a base fraudulenta das operações financeiras do marido) sugere que o cunhado empregue o dinheiro com Hal (o que vai decretar a perda do que ganharam na loteria, e também o naufrágio do casamento da irmã).

       De tudo isso e muito mais o espectador tomará conhecimento por sucessivos flash-backs que se inserem à perfeição na estória. Vindo quebrada de New York – sabe-se que o marido se suicidou por enforcamento, e que todos os seus pertences foram vendidos em hasta pública. A única coisa que Jasmine trouxe de New York foi o conjunto Vuitton de malas, salvo pelo uso excessivo que lhe tirou o valor de venda.

       Blue Jasmine não é uma comédia, nem uma tragicomédia. Em nenhum momento Woody Allen nos faz rir. Constrói essa tragédia americana – em que a socialite sofisticada e superficial tem de conviver com o ambiente brega e o baixo nível de um bairro de San Francisco  – através das experiências, fantasias e desejos nostálgicos de uma virada de jogo impossível de parte da protagonista. Cate Blanchet nos dá uma interpretação  impressionante pela facilidade com que trafega da realizada e superficial Jasmine para a amargada, por vezes incoerente, atendente de dentista, que sonha coisas impossíveis, como terminar o curso de antropologia que abandonou para casar-se com a falsa fortuna de Hal. Cate é a coluna mestra do filme, e nos presenteia com representação digna de Oscar.

        Além de recomendar vivamente este avatar do gênio filmográfico de Woody Allen, apenas uma vinheta a mais, em que a personagem central experimenta autêntica  peripeteia (a reviravolta). Encontra em uma festa o diplomata Dwight (Peter Saarsgaard), a quem ilude a princípio pelos seus conhecimentos amealhados enquanto circulava na alta sociedade nova-iorquina. Parece predestinada a desvencilhar-se da maldição de Hal, quando estreita os laços da união com Dwight (que tem ambições políticas) se não se encontrasse com o ex-marido de Ginger, Augie (Andrew Dice Clay). Na cena, como um coro grego, Augie irrompe e despeja todo o seu rancor em Jasmine que, inadvertidamente, fizera com que ele empregasse todo o dinheiro da loteria com o vigarista Hal. Por isso, separado de Ginger, ele não poupa qualquer detalhe dos podres de Jasmine, queimando assim cego de raiva  qualquer possibilidade  de o viúvo Dwight unir-se a Jasmine, como antes pretendia. 

        Sem mais esperança, completa-se o círculo. Quando o marido Hal, de muitas conquistas, resolve enfim abandoná-la por uma jovem, Jasmine se vinga, destruindo Hal, através de denúncia para o FBI. Tudo ela admitiria sob a condição de que o laço conjugal fosse mantido. Quando Hal lhe diz que vai se mudar para um hotel, Jasmine mostra que a sua pretensa ignorância das falcatruas do cônjuge fazia parte de visão seletiva da realidade, fundada sob a condição que a união permanecesse. Como tudo se desfaz, nos despedimos da personagem em banco de praça a falar sozinha, sem outra perspectiva que a própria loucura.

.
 Guerra Civil Síria

 
        Foi-se o tempo do avanço da Liga Rebelde, e do progressivo encolhimento do território sob controle do governo de Bashar al-Assad. Depois da queda de Qusayr, importante base da insurgência, de forma crescente o exército situacionista vem tomando a iniciativa. Não é avanço esmagador, nem as defesas da revolução estão em debandada. No entanto, algo mudou, e o que ocorre não prenuncia quadro favorável à insurgência.

       Assim, a iniciativa tanto em Aleppo, quanto nos subúrbios de Damasco, não mais se acha com os rebeldes, e sim com as tropas do governo.
       Ao sul da capital, os subúrbios voltaram a ser contestados pelo regime alauíta. A perda de Qusayr enfraqueceu a resistência rebelde. Nesses termos, a ‘limpeza’ da área continua.  O domínio de Qusayr assegurava à Liga Rebelde livre acesso a Damasco. A retomada dos subúrbios é uma decorrência dessa alteração no quadro geral, em terras onde ganhos táticos podem somar vantagem estratégica, eis que aumenta a dificuldade de provisão de meios e de movimentação de pessoal.

       A mesma impressão prevalece em Aleppo, a principal cidade ao norte da Síria. Dividida em dois por muito tempo a situação se vai tornando mais precária para as bravas defesas da revolução.      
       Depois da longa permanência do equivalente a um confronto  de trincheiras, o lado rebelde começa a evidenciar maiores problemas com as características do conflito. Para Bashar al-Assad tanto a Federação Russa, quanto o Irã nunca cessaram a remessa de armamentos, sofisticados ou não. No caso, Teerã conta com o suporte do Hezbollah, para quem a vitória sobre a Liga Rebelde não é apenas questão de prestígio, eis que tem a ver com as bases vitais da milícia de Hassan Nasrallah. 

        Da parte rebelde, o apoio tem vindo do Qatar e da Arábia Saudita. Quanto ao Ocidente, a movimentação é diplomática...

 

(Fontes: O Globo; Folha de S. Paulo; New York Times)

Um comentário:

Mauro disse...

Blue Jasmine é realmente um grande filme. O espectador vai descendo na vida esvaziada da personagem, punida pelos cineasta por sua arrogância. Fica apenas a sua loucura.