sexta-feira, 15 de novembro de 2013

A Crise da Presidência Obama

                                

        De repente, uma séria crise se abateu sobre Barack Obama e sua presidência. A sociedade civil está revoltada com a aparente indiferença quanto à implementação da Lei da Reforma Sanitária Custeável, a mais importante realização legislativa do seu governo. Em consequência, o índice de aprovação de Obama despencou de 51 para 41%,  e muitos já acenam com cenário similar ao enfrentado pelo antecessor George W. Bush, na  metade final do segundo mandato, que a História já enquadra no âmbito do furacão Katrina e do desastrado tratamento que recebeu da Administração Bush.
       Os parlamentares democratas estão inquietos e em polvorosa diante da assaz efetiva possibilidade de que a mistura de displicência, falta de controle, e incompetência administrativa na gestão e implementação do site da reforma sanitária venha a castigar pesadamente os democratas nas vindouras eleições intermediárias de 2014, repetindo o cenário do shellacking de 2010.

      É realmente difícil de engolir tanto alheamento e displicência quando soou a hora de o que deveria ser firme resposta às críticas sectárias do Tea Party, e a falta de qualquer cooperação do GOP para tornar realidade um programa de assistência sanitária que se destina a beneficiar milhões de americanos até hoje sem cobertura de seguro médico. Toda a oposição do Partido Republicano a uma ideia e a um plano calcado em projeto de governador do GOP (Mitt Romney em Massachusetts) – sequer um voto de deputado ou senador desse partido foi dado para o referido projeto -, deveria ter sido contra-arrestada, uma vez vencidas as grandes barreiras (não só a total oposição no Congresso, mas a contestação à constitucionalidade do Obamacare que foi levada até a Suprema Corte, onde a lei da Assistência Sanitária Custeável prevaleceu, surpreendentemente com o voto do presidente da Corte, o republicano John G. Roberts).
       Mais uma vez esse estranho autismo político de Barack H. Obama se evidenciou. Como já referi, o ex-Presidente Clinton reportou-se a contradição na personalidade do atual presidente: consegue fazer as coisas difíceis (e a aprovação da Reforma da Saúde está entre elas), mas tem dificuldade com as fáceis, tendo nesse âmbito comportamento alienado e mesmo desinteressado.

      Como me reportei em blog anterior, o povo americano mostra certo preconceito contra os intelectuais na política. Obama, por uma série de circunstâncias, contornou essa desconfiança, ao vencer as primárias contra iHi    H H     Hillary Clinton e o embate contra John McCain, para o primeiro mandato, e, no segundo, com a ajuda do bartender da Flórida, a disputa com Mitt Romney.
      Por vezes, é difícil tentar entender as características do temperamento de Barack Obama. O primeiro presidente afro-americano da história estadunidense, a personalidade do 44º presidente nos reserva muitos contrastes que fazem a alegria de psicólogos e psicanalistas. Não faz aparente sentido que criatura política com a sua experiência de adversidade (saíu do cenário complicado do estado de Illinois), possa cair em armadilhas criadas pelo respectivo temperamento, em que um intelecto privilegiado convive com dessultória vontade de empenho na aparente pequena política – que como insinuou o grande especialista Bill Clinton (que logrou a custo vencer os próprios demônios) Obama, de forma até preconceituosa, pode às vezes tratar  de modo desdenhoso (e, contraditoriamente, pouco inteligente).

       Não há exemplo mais crasso desta recorrente falta de sensibilidade de Barack Obama para o dia-a-dia às vezes aborrecido da pequena política, do que o abismal alheamento que deu à implementação da Lei da Reforma Sanitária Custeável.
       Agindo como agiu, deixando nas mãos de burocratas sem imaginação ou de pessoas que não tinham a inteligência prática de capacitar-se do desafio que tinham pela frente – afinal o site de um programa é a sua porta de entrada para os usuários. De que serve construir a sofisticada armação do ACA, sempre sob o fogo amigo do GOP, se estupidamente se deixa nas mãos de incapazes o mecanismo que deverá torná-lo afinal realidade?

         A maldição do Katrina para o final da Administração Bush envolve insensibilidade diante da tragédia da gente pobre e afro-americana em New Orleans e no respectivo entorno. Se a comparação semelha a princípio forçada, pela diferença no impacto existencial e na própria atitude de George Bush, não estão errados aqueles que alertam para os muitos pontos de contato entre o tópico alheamento dos dois Presidentes.
        Começa, assim, a questionar-se não a inteligência e a capacidade respectiva dos mandatários, mas a sua honestidade e o compromisso de bem servir à gente mais necessitada. A raiva não é boa companheira, e Obama deveria estar mais atento às implicações de seu distanciamento eventual (que já apareceu no desastroso biênio inicial do primeiro mandato), se deseja vencer este desafio – pois acredite ou não – tal prova é digna de Sua Excelência, e não afundar-se, ao invés, literalmente como seu predecessor nos pântanos da região de New Orleans.

 

(Fonte:  The New York Times)            

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