quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Will Trump Have a Nervous Breakdown ? (1)


                             
         Que me perdoe o leitor se coloco o título deste blog em inglês. O motivo é simples:  um break-down nervoso não é coisa de somenos,  e é difícil que ocorra em alguém tão clinicamente protegido quanto um presidente americano. Mas pelo seu temperamento, a manifesta dificuldade que tem em controlá-lo, e, máxime, pelo vezo que tem de inventar problemas, mesmo quando eles não existem ou se acham em situação  em que outros políticos teriam condições  de dominá-los, mais passe o tempo, mais contemple a front-page dos jornais americanos, a sensação que tenho é que Trump, ou não está em condições de lidar com os problemas do cargo, eis que,  de uma maneira ou de outra, logrou na sua costumeira forma impetuosa de arrebatá-los  para si, ou o 45º presidente procura essa chusma de magnos problemas, numa forma de vedetismo - como se a cena presidencial já não fosse um espaço prenhe de questões anosos e conflituosas, assim como de problemas que exigem um espaço prudencial para resolvê-los. 
          A par disso, se o chefe da Nação bem faria em não exacerbá-los, buscando sempre que possível mante-los em espécie de banho-maria, o que fazer se a sua atitude é justamente a contrária?
            Senão, vejamos à guisa de tomada cinematográfica  - como se fosse panorâmica em que o diretor tentasse transmitir a ideia de que, através de variegados malabarismos,  Sua Excelência desenvolvera a agressiva técnica de conviver e controlar à distância essa chusma de desafios de diferentes potências, sejam elas externas ou internas, passadas ou presentes.  
             No começo, está o muro, como símbolo de uma visão tão pretextuosa quanto instrumental das relações com o México e, por conseguinte, com um país que já tanto sofreu com o colosso americano e as suas invasões de conquista territorial. É preciso mais do que arrogância para transformar a imagem do invasor mexicano na deformada visão de um estuprador de mulheres americanas, que a plus fort raison[2] se impõe controlar, barrando-lhe o caminho de América del Norte. A razão apresentada é decerto absurda, prepóstera mesmo, mas com todo o alarido da imprensa, em que o original, mesmo se aético muita vez comanda, quer queiram quer não,captou boa porção de ouvintes republicanos, e tornou a caminhada política das primárias do GOP um passeio para Trump.
             Na tentativa de entender melhor o personagem Trump, não se pode perder nunca de vista essa estranha figura de manipulador da mídia, que se delicia em afrontá-la, sem talvez o desejo de restabelecer a verdade, mas com escopo quiçá ainda mais ambicioso, transformá-la, quem sabe domesticá-la, de forma a apresentá-la  não pelo que é no suposto catecismo trumpiano. Não é uma assertiva despropositada dizer que Trump é a essência do anti-intelectual, do político multifacético que quer parecer muitas coisas ao mesmo tempo. Nesse sentido, como já o demonstrara antes da pré-eleição, Trump é um personagem de faz-de-conta, mas sem nenhuma tendência romântica. Faz  de conta - não é o que disse, mas o desejava fazer, ao buscar destruir um herói americano como John Mc Cain, enquanto intentou retirar-lhe a base do respeito popular,  ao buscar diminuir este herói americano justamente por sua condição de herói-prisioneiro na guerra do Vietnam. Esta tendência de atacar o inatacável já se vê na sua exposição  de uma alegada teoria do birtherism, uma ideia de projetar-se à custa de Barack Obama - que não teria nascido nos Estados Unidos e sim no Quênia... 

              Daí a periculosidade de Donald Trump, que os seus adversários e mesmo Hillary tentaram ignorar, mas com substancial risco pessoal. Ele cunhou ou se serviu da expressão Crooked Hillary,  na verdade uma calúnia mal disfarçada, inspirada talvez na frase de Beaumarchais, calomniez, il en reste toujours quelque chose![3]
              Talvez o histrionismo de Trump lhe tenha valido para amealhar votos. Sendo a disputa eleitoral com Hillary bastante renhida, infelizmente seria determinante o estranhíssimo comunicado de um James Comey desgarrado, em uma Secretaria de Justiça  na prática sem Secretário, o que lhe abriu o caminho para a capciosa mensagem para o período da chamada votação antecipada: de que se descobrira um outro computador na entourage de Hillary - o do marido afastado de Huma Abedin, a secretária da candidata - "aviso" que veio junto de que poderia levantar novas lebres em uma campanha, em que a democrata tinha curta vantagem.
                Mas deixemos essa página pouco feliz da história política americana, e voltemos para o tema que nos interessa precipuamente. Nas últimas semanas, quem sabe, exacerbado pelas tensões de que sofrem os presidentes, Trump tem recorrido a uma estranha, estranhíssima mesmo, estratégia.  O 45º presidente afronta aos problemas políticos de sua presidência, ao invés de intentar resolvê-los. Assim, como se fosse um novo Houdini, ele prefere manipular os problemas que tentar resolvê-los. Talvez se possa dizer que o cerne da questão esteja aí, mas como se verá adiante, Trump exagera...
                 Na verdade, Trump vem adotando uma estratégia perigosa. Se se pode individuar algo na mente conturbada desse ocupante da Casa Branca, ele adota uma teoria do caos um pouco arrevesada. De problemas, quanto presentes e intrusivos melhor.
                  É bom não esquecer que continua muito atuante para sua inquietação o Conselheiro Especial Robert Mueller III, que, ao que consta, continua levantando questões delicadas para o presidente. O que ele fará das declarações do advogado particular de Trump, Michael Cohen, nas quais mentira para o Congresso americano? 
                  O problema com Trump vai muito além do perjúrio de Cohen,mas também na circunstância de que o causídico tratara de escamotear encontros de Trump com duas call-girls. O que é grave aí não seria o fato em si - a ocultação não do fato em si, mas sim a mentira para o Congresso.
                   Pelo seu comportamento, de certa forma, Trump desvaloriza o escândalo, embora o acúmulo deles configure já um belo caso para inquietar qualquer mortal.
                    Sem embargo, o voluntarismo desse presidente não é avaro em criar ulteriores problemas.  Entre esses, estão as questões do muro, e a derivada do fechamento de funções estatais.
                     A construção do muro é uma exigência perene  para Trump, o que lhe provoca desgaste crescente, pela série de consequências derivadas deste sine qua non para o presidente.  O dito fechamento do Estado implica na clausura de atividades que são úteis para o coletivo de pessoas. Como a clausura implica em não-utilização, e as consequentes dificuldades que dela decorrem para os habitantes de Washington, atendido ainda o caráter impopular da injunção com as dificuldades que acarreta, não é de estranhar que a exasperação aumente.
                       Outro erro pesado do presidente foi a determinação do fim da participação americana em dois conflitos: o da Síria (que é largada à própria sorte e a Putin),  assim como a guerra contra o E.I. (exército islâmico), sob o frágil pretexto de que a ameaça desse movimento terrorista já esteja controlada. O consenso no Pentágono é que esta desastrada medida de Trump dará nova vida ao movimento do califa al-Bagdaadi, que, de resto, não se acharia longe da própria extirpação. Daí, as desculpas de Trump irritaram sobremaneira o general Mattis, que, pelo bom senso e equilíbrio, vinha assegurando um papel muito eficaz aos Estados Unidos, com ajuda dos bravos guerreiros curdos,  cujo abandono poderia causar mais uma derrota para um futuro Curdistão, o que constituiria válida posição de segurança para uma comunidade que é apoio do Ocidente, contra as perenes incursões do turco Erdogan.
                       A maneira abrupta adotada por Trump sem qualquer consulta com o Secretário Mattis,com experiência e grande prestígio no estamento militar - e que estava sendo fator de estabilidade diante do errático presidente - afastou a influência do Secretário - e dele qualquer veleidade que poderia manter com esse presidente qualquer sistemazione apropriada, no esquema militar. O próprio Trump abriria - igualmente sem preparação - as suas supostas "reformas" nos compromissos militares da Superpotência, com um desastroso ensaio de mudança tanto no Afeganistão, quanto na Síria e no Mediterrâneo.
                      
(Fontes: The New York Times, Pierre-Augustin Caron de Beaumarchais) 



[1] Terá Trump um Break-down  nervoso?
[2] por razão mais forte
[3] Caluniai, caluniai sempre, fica sempre alguma coisa...

Nenhum comentário: