quarta-feira, 29 de maio de 2013

Pescando em águas turvas ?

                                       
       O Ministro Sergei Lavrov, da Federação Russa, tem mantido relação muito amistosa com  John Kerry, o novel Secretário de Estado, que acaba de suceder à Hillary Clinton.
       É sabido que relações pessoais têm importância bastante relativa no campo da política exterior.  Provoca, por conseguinte, uma certa espécie que o nível do relacionamento entre Rússia e Estados Unidos registre melhora tão acentuada, por força da substituição de Hillary por Kerry nas Relações Exteriores.
       Kerry acedeu à proposta de Lavrov para  conferência de paz em Genebra, com respeito à situação na Síria. A guerra civil nesse país já está no seu terceiro ano e as possibilidades de composição entre a ditadura de Bashar al-Assad e a Liga Rebelde não parecem, para o observador diplomático, assim tão animadoras.
       A par da entrada no conflito do Hezbollah – que seria um desenvolvimento anunciado, dada a dependência estratégica da milícia do clérigo Nasrallah do regime alauíta -, há movimentos no campo que brigam com uma disposição de Bashar para real negociação com os rebeldes.
       Por um lado, depois de longa série de reveses, a causa de al-Assad e de seu exército mostra sinais de contra-ofensiva não apenas tática. Entrementes, a Liga Rebelde, a quem Barack Obama prefere recusar o fornecimento de armas pesadas, enfrenta dificuldades atribuíveis à falta de equipamentos tendentes a pelo menos equilibrar a contenda.
       Agora, a decisão da União Européia de levantar o embargo da remessa de armas para aquela área é sinalização assaz importante. Trocando em miúdos, se a vindoura conferência de paz fracassar, Assad não terá o campo livre para derrotar os rebeldes. É de assinalar-se, a propósito, que até o presente o referido embargo favorecia a Damasco, que nunca deixou de receber a generosa assistência de Moscou e de Teerã.
        Dada a negativa de Washington,  a disposição da U.E. terá o condão de não induzir Putin a pensar que tenha a partida ganha, diante da recusa de Obama em fornecer armas aos rebeldes.  
        A ajuda ocidental se direcionaria para os rebeldes com orientação política em linha mais secular, e evitaria mandar armas para os islamitas radicais da facção Al Nusra, que são apoiados pela Arábia Saudita e o Qatar. Com tal orientação, se atenderia, outrossim, à preocupação da Administração Obama de que as armas dadas aos rebeldes não caiam em mãos da al-Qaida.
         Outro desenvolvimento que tende a expor de forma mais crua o objetivo do Kremlin, está no plano de fornecer ao regime de Bashar al-Assad mísseis de defesa anti-aérea S-300, de alta sofisticação. Consoante o vice de Lavrov, Sergei Ryabkov,  que criticou a decisão da U.E., a instalação desses mísseis seria ‘fator de estabilização’, eis que representaria um deterrente contra eventual intervenção do Ocidente. Sem mencionar expressamente, de novo reponta o temor de  intervenção da OTAN, em um cenário que para Vladimir Putin seria anátema, pois lhe relembraria a queda de Muamar Kaddafi.
                A decisão da U.E. contribui, de certa forma, para aclarar o quadro, na medida em que mostra a contradição entre a alegada disposição russa de ser um corretor honesto (honest broker) na conferência de paz  entre Assad e a Liga Rebelde, e a sua política de fornecimento ininterrupto de armas de todo tipo ao regime alauíta.  Fica ainda mais comovente tal disposição de Moscou em ajudar Bashar, diante da verificação de que essa política continuara, mesmo no período em que os próprios russos encaravam com muito pessimismo as perspectivas de resistência do regime alauíta.

                

( Fonte:  International Herald Tribune )  

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