terça-feira, 21 de maio de 2013

Obama e a Guerra na Síria (II)


          Depois de ser dada como próxima do fim –  houve declarações do aliado russo que chegaram a insinuar sua iminente possibilidade - de uns tempos para cá a guerra civil na Síria parece haver entrado em um impasse. Não mais se fala de próximo desmoronamento do regime alauíta. Se tampouco se reportam ações importantes, tendentes a desestabilizar as linhas gerais do quadro, há menções repetidas de sucessos parciais das forças de Assad.
         Por outro lado, se também não há referência à séria crise no campo da Liga Rebelde, escasseiam  sinalizações de êxitos de monta.
         Outra evolução importante no quadro geral é a aberta participação de contingentes do Hezbollah. Dessarte, as forças do Governo sírio, com o apoio daquelas milícias, conseguiram adentrar partes da estratégica cidade de Qusayr. Com ataques aéreos preliminares – os rebeldes não dispõem de força aérea equivalente – o exército sírio logrou apoderar-se de cerca de 60% de Qusayr.
         A referida cidade, no oeste sírio, acha-se no centro da província de Homs, que está sendo duramente disputada pelas forças de Bashar e os rebeldes. Tal batalha chega a ser encarada, de uma parte, por visões grandiloquentes, no sentido de que ‘decidiria do destino do regime e da revolução’.
         Se há evidente exagero nesta avaliação, como se fosse um “turning point[1] na conflagração, ela decerto tenderá para reforçar a posição do lado vencedor na província de Homs. Se as forças de Assad predominarem, a perspectiva lógica é de que o regime venha a se fortalecer na área ocidental do país.
         A pequena cidade de Qusayr, muito próxima da fronteira do Líbano – o que facilita o envolvimento da milícia do Hezbollah, mas igualmente traz o perigo de maior alargamento do conflito, inclusive além do território sírio, comprometendo o frágil equilíbrio libanês – tem importância estratégica, por estar a 160 km de Damasco, e representar  via natural para o fornecimento de armas aos redutos rebeldes.
         Quanto à participação do Hezbollah do clérigo Nasrallah – cujo inimigo é Israel – verifica-se que nos últimos tempos diversos de seus  militantes têm caído na guerra civil síria. Tal circunstância aponta para a crescente participação ao lado das forças governistas de Bashar al-Assad. Não é segredo que a eventual queda do regime alauíta seria desastrosa para o Hezbollah, por ter a proteção de Damasco que, de resto, lhe  fornece base para armazenar o armamento procedente de Teerã.   
          Como se observa, portanto, pelas sinalizações acima, adentra a guerra civil, já no seu terceiro ano, uma inesperada fluidez quanto às possíveis evoluções.
           A  Liga Rebelde, e não de súbito, se descobre sem armas bastantes. Tal ocorre, v.g., na cidade de Aleppo, que está cindida em dois, em um tiroteio local menos intenso – porém sumamente cruel nos seus atiradores shabiha (milícias governamentais), que não se pejam de matar crianças e civis – e os bombardeios esporádicos da aviação governamental.  Mas também, como se verifica acima, se enfraquece o poder de fogo dos rebeldes, em outras áreas, o que é preocupante para a Liga Rebelde.
          Apesar de suas manifestações a líderes de países simpáticos à causa rebelde de um eventual apoio,  semelha difícil distinguir qual seja o real significado desta postura do Presidente dos Estados Unidos.
           Aguarda ele acaso a conferência de paz entre as duas partes, para então intervir (sempre diplomaticamente ou com o poder soft), apoiando a Liga Rebelde ?
           Essa interrogação, no entanto, corre algum risco de ser retórica, eis que poderá haver mudança na atitude do regime de Bashar al-Assad, com o resoluto apoio da Federação Russa (no Conselho de Segurança, e nas constantes remessas de armamento) e da República Islâmica do Irã (com igual liberalidade em armas e homens).
           Se continuarem a prevalecer no campo de batalha, por faltarem aos rebeldes  armas e munições (a Arábia Saudita e os estados do Golfo continuam dispostos a fornecê-las, mas os canais de abastecimento podem ficar ainda mais precários), Obama terá a oportunidade de presenciar o resultado político de suas terminantes disposições (V. a própria anterior negativa à proposta da trinca dos Departamentos de Estado e da Defesa, assim como da CIA de apoiar com armas a Liga Rebelde).
          Essa negação de apoio em armas à Liga Rebelde contraria igualmente o Primeiro Ministro da Turquia, Recip Erdogan, a quem de resto o presidente americano recebeu nesta última semana, sem que alterasse substancialmente a respectiva posição.
         Se não houver modificações ulteriores, são decerto nebulosas – em contrate com o noticiário de passado não tão distante - as perspectivas da Liga Rebelde, haja vista a relativa falta de provisões bélicas, e as novas nos campos de batalha nas últimas semanas.
         Sem embargo, as conversações entre o Secretário de Estado John Kerry e o Ministro do Exterior russo, Sergei V. Lavrov – e já se encontraram cinco vezes – tem sido apresentadas como positivas. Ao invés dos contatos entre Lavrov e a Secretária de Estado Hillary Clinton, a quem o ministro russo chamara de  ‘histérica’, semelha existir atmosfera de cordialidade entre ele e Kerry. Tudo estaria sendo preparado para uma decisão negociada da guerra civil na Síria. Para tanto, Genebra seria o local  e a data, junho próximo.
         Resta saber se o clima amistoso entre Kerry e Lavrov sobreviverá aos acontecimentos no terreno. Para que haja condições de negociação de uma chamada ‘solução de compromisso’ carece de existir a convicção de que não há outras saídas para o conflito.
         Nesse contexto, o alegado otimismo conjunto russo-americano em viabilizar a solução diplomática não é compartilhado por todos. Nesse sentido, o senador John Barrasso, do GOP, considera que “pedir o apoio da Rússia para apoiar os interesses americanos na Síria seria o mesmo de confiar à raposa a guarda do galinheiro.”
         Em tal quadro, a tentativa de interpretação da eventual milagrosa sobrevivência da ditadura de Bashar al-Assad – para evidente gáudio de Vladimir Putin e Ali Khamenei,  que tantas fichas nele jogaram – é tarefa a que não me arrisco no presente, e a que preferiria não ter de fazê-la no futuro.

 

( Fonte:  International Herald Tribune )



[1] Decisão determinante.
 
 

Nenhum comentário: