terça-feira, 23 de abril de 2013

Trincheiras da Liberdade (II)

                                           
          O julgamento de Aleksei Navalny não se realiza na província de Kirov por acaso. Qualquer sugestão para Vladimir Putin trazê-lo para Moscou correria o risco  de merecer-lhe aquele rasgado sorriso de desdém que o caracteriza. Gospodin Putin sabe que, ao submeter o blogueiro Navalny a um processo criminal,  fundado em falseadas provas de suposto desfalque, o que importa é o pretexto para obter a condenação, e não determinar a verdade. Como assinala Bill Keller a inanidade das acusações contra Navalny fora determinada por firma advocatícia de Chicago.
         Se tal não bastasse, as autoridades locais realizaram ampla investigação e concluíram que nenhum crime havia sido cometido. Sem embargo, o Comitê de Investigação Federal não se pejou de – sem nada acrescentar à documentação apresentada – incriminar Navalny pelo furto de madeira em valor acima de quinhentos mil dólares.
         Tampouco ajudou ao blogueiro a circunstância de haver exposto recentemente o fato de o chefe do Comitê de Investigação, Aleksandr Bastrykin, ser detentor de visto de residência e de propriedade imobiliária na República Checa. Como o governo de Praga é membro da OTAN, tais circunstâncias expõem Bastrykin à ameaça de chantagem, além de colocar em dúvida a sua fé no regime russo.
         Não há dúvida, segundo sublinha Keller, quanto à importância do processo. Até o presente, Putin se tem servido do sistema judiciário russo para implementar a repressão política. Persegue os antagonistas através das cortes penais (taxa de absolvição: 0,4%): o ex-amigo Mikhail Khodorkovsky, e ex-czar de agência petrolífera,  ainda na prisão, no curso da segunda sentença; Sergei Magnitsky, o advogado defensor dos direitos humanos, que morreu por maus tratos e negação de assistência médica no cárcere; e o juízo das moças de Pussy Riot, que sublinhou a falta de espírito do presidente, se ele é o objeto da sátira.  Não há dúvida que o pendor para déspota de Vladimir Putin se tem evidenciado, mas o seu comportamento não o habilitaria  a apresentar-se como  déspota esclarecido.  
           Putin acaso enfrenta riscos nesse julgamento ?  Em relação aos alvos anteriores, não há negar a magnitude e a popularidade de Aleksei Navalny. Por isso, o presidente não traria o caso para a capital, porque o imponderável – que existe sempre – aumentaria deveras, mesmo dentro de um processo manipulado como o atual.
           Quanto ao perigo que correria Putin ao incrementar a sua ‘solução judicial’, vale dizer dispor de seus adversários por meio de um dócil sistema judiciário – o que o colocaria no nível de Aleksandr Lukashenko,  o presidente-vitalício da Bielorrússia – tal me parece assaz discutível, dada a exponencial diferença relativa em termos econômicos e políticos da Federação Russa. 
           O destino de Vladimir Putin, como de outros tiranos, sói ser decidido pelo próprio povo. Enquanto mantiver o domínio dos meios de comunicação e do Legislativo – sem falar é claro do Judiciário – o mais provável é que continue a ser persona grata nos diversos conciliábulos do Ocidente. Quanto ao Oriente, não creio haver problema com o magno vizinho da República Popular da China, onde a democracia não semelha representar  prioridade urgente.  A propósito, o pobre Liu Xiaobo, Prêmio Nobel da Paz 2010, continua numa masmorra do fundo interior chinês, enquanto sua esposa Liu Xia, goza de prisão domiciliar não-declarada. Tudo isso por haver defendido uma hiper-moderada reforma política pela Carta 08.

 

( Fonte:  International Herald Tribune )    

    

         

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