domingo, 11 de março de 2012

Colcha de Retalhos CVII

                                   
A Prêmio Nobel San Suu Kyi

            O retrato que aparece na imprensa a princípio choca. Por suas longas e iníquas prisões, o semblante hodierno da Sra. Daw Aung San Suu Kyi, a heroína da Birmânia, nos surpreende. À primeira vista, com a sua pele flácida, a fisionomia marcada, mais parece o retrato da genitora da sempre jovem Prêmio Nobel, que a corrupta e odiosa ditadura militar de Myanmar trancafiara por incontáveis anos em detenção residencial.
           A tirania castrense e seus assessores inventam muitos delitos para, na verdade, neutralizar uma só razão. O carisma, a popularidade de Suu Kyi não são produto do acaso. A sua vida é trajetória marcada pela fatalidade e difíceis escolhas.
     Está com dois de idade,quando ocorre o assassínio do pai, o general Aung San, criador do exército birmanês, que semelhava destinado à presidência.
          Mais tarde, a viaja para a Birmânia, deixando na Inglaterra o marido e os dois filhos. Veio para assumir a liderança da oposição contra o governo militar. A sua vitória nas urnas não lhe daria o poder,  de que se assenhoreou uma linha de generais.
         A substituição do velho ditador general Than Shwe pelo general reformado Thein Sein veio arejar um pouco a opressa atmosfera que antes lá prevalecia. Na gradualidade da nova política, as prisões se foram abrindo. Em fins de 2010,a líder da oposicão  recuperou a liberdade. No processo de distensão, que os militares sóem organizar com o feltro da prudência, provocaria espécie a primeira reunião de San Suu Kyi com o presidente Thein Sein, a que se seguiriam outras.
          A mártir Suu Kyi acedeu em participar de eleição suplementar, que proverá 48 cadeiras em parlamento de seiscentas. São vagas deixadas por parlamentares que assumiram cargos na administração. Se o seu partido arrebatar a maioria dos assentos em disputa – o que refletiria o apoio entusiasta e multitudinário dado pelo povo birmanês nos diversos comícios protagonizados pela líder da oposição – o efeito prático em um universo de seiscentos deputados não seria dos maiores.
         Com 66 anos, Aung San Suu Kyi não descura de uma pesada rotina, que exige deveras de organismo minado pela adversidade. Por isso, já teve de cancelar discurso em Mandalay, baixando a hospital. Para representar na assembleia cosida pelo regime, optou pelo distrito de Wah Thi Ka, próximo da costa sul, e não muito distante da cidade de Yangon. Para tanto, ali estabeleceu sua morada, para os comícios de primeiro de abril.                 
         Essa circunscrição não difere muito da Myanmar rural. A escolha de Suu Kyi causou grande regozijo entre os camponeses. Entretanto, um viajante no tempo, residente em uma das vilas do faraó Amasis – de que nos escreve Heródoto – não encontraria muitas diferenças na aldeia de Wah Thi Ka. Lá não há eletricidade, nem água encanada, e portanto nem se fale de geringonças eletrônicas e  redes cibernéticas. É um poeirento povoado, cuja representação será disputada por Suu Kyi e um médico, U Soe Min.
         Não semelha haver dúvidas,mesmo no aldeão-chefe, em quem vencerá o embate.
         Questiona-se, por fim, as implicações sobre a popularidade de Suu Kyi de sua postulação. De dissidente ela passa a ser um político em campanha para cadeira no Parlamento. Em outras palavras, ao invés de falhas no sistema dela se esperaria agora que interviesse para saná-las. Dada a disparidade de forças, tal suposição mal poderia surgir, mesmo em aldeão que enfrenta uma existência dura, reminiscente da penúria dos servos da gleba. Seria atribuir a Aung San Suu Kyi qualidades quase divinas que, não obstante a sua popularidade, eles bem sabem que não as tem. Prova disso são os quase vinte anos transcorridos em cárcere residencial.



Revogação de pena sob medida ?    


     A imprensa desta semana noticiou a revogação da pena máxima contra o americano, de origem iraniana, Amir Mirzaei Hekmati, ex-fuzileiro naval, que fora detido no Irã, sob alegação de espionagem. Como é do conhecimento dos leitores desta coluna, o blog Operações Atípicas, de treze de janeiro último, se ocupara do assunto.
      Na época, fontes consultadas pelo New York Times haviam julgado bastante improvável que a CIA engajasse alguém em missão desse gênero, cujo curriculum vitae chega a ser mencionado pela Kuma Games, no âmbito de jogos de guerra, como principal base de contato.
      Diante da anulação da sentença pela Suprema Corte do Irã, com a disposição de que seja submetido a novo julgamento, especula-se acerca da brusca mudança, que pode corresponder a um aceno para a Administração Obama. Acresce notar que a súbita iniciativa coincide com a visita do Primeiro Ministro Benjamin Netanyahu para debater na Casa Branca com o presidente acerca de um ataque preventivo aos sítios iranianos.  
 

Demitido mais um Ministro de Dilma


      Sob fogo amigo dos companheiros do PT, a presidente demitiu o seu 12º ministro. Trata-se de Afonso Florence, que exercia a pasta do Desenvolvimento Agrário. Além dos movimentos sociais – que criticavam-lhe a lentidão nas desapropriações – o Planalto tampouco fazia boa avaliação do deputado do PT baiano.
    Em seu lugar, assume o deputado Pepe Vargas, do PT gaúcho, e que integra a mesma corrente de Florence, a Democracia Socialista. Vargas é  próximo de Dilma, a quem conhece desde a época em que ela se transferiu para o Rio Grande.
    Apesar de não ser área de sua especialidade, a seleção de Pepe Vargas também agrada ao Presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), com quem cultiva boas relações.
    Por outro lado, aumenta a quota do Rio Grande do Sul no ministério, enquanto diminue a da Bahia. Com efeito, o governador Jaques Wagner, além de Florence (PT-BA), perdeu também Mário Negroponte (PP), no Ministério das Cidades, e noutro posto de grande relevância, na presidência da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, que tomou posse da Secretaria do Planejamento da Bahia.   
 

Maltratos à idosa brasileira no aeroporto de Madri


       Diante da inércia de nosso governo, repetem-se os maltratos a turistas brasileiros em Madri. No moderníssimo e gigantesco aeroporto de Barajas, agora foi a vez da aposentada Dionísia Rosa da Silva, de 77 anos de idade, a quem se reteve por três dias, com alimentação, higiene e pousada inadequadas. Sem acesso à bagagem, a idosa teve de ficar com a roupa do corpo por todo o período da permanência, até que fosse deportada.
      Ao contrário de outras destinações na Europa, o aeroporto de Madri se assinala pelas retenções de brasileiros desde 2008 (2.196 naquele ano, e 1.412, em 2011), a quem os funcionários de Barajas dispensam tratamento em geral áspero e grosseiro, e em condições de recepção bastante sofríveis.    
      Não tem havido do governo brasileiro  resposta condigna, que valorize os co- nacionais, que são virtualmente tratados como contrabandistas. Na arbitrariedade da semana, o meganha espanhol ameaçou inclusive algemar a idosa.
      Sem a devida retorsão[1], não se faz chegar à administração espanhola as consequências da violência e da arbitrariedade aplicada a turistas brasileiros. Em outras palavras, o Brasil continua a curvar-se como autêntico país de lá-bàs.  


( Fontes: International Herald Tribune, Folha de S.Paulo, O Globo)




[1] Retorsão se diferencia de represália, na linguagem diplomática, na medida em que responde à infração cominada pela outra parte, com um procedimento similar. Não vai além da ação sofrida, como no caso da represália.

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