sábado, 31 de março de 2012

A absurda dependência da gasolina estrangeira

                             
        A estranha escassez da gasolina é a consequência de uma política equivocada em muitas frentes. Em verdade, à primeira vista, a situação do mercado de combustíveis nos parece esdrúxula.
       Como deveria ser do geral conhecimento, o Brasil por longas décadas padeceu dos inconvenientes de não dispor de petróleo suficiente para abastecer o consumo interno. Tais aspectos negativos não nos pesavam apenas no balanço de pagamentos.
      Além dos efeitos economico-financeiros, estivemos submetidos a contingências políticas por força de dependermos do petróleo árabe. Com o agravamento da situação, esta dependência em um período caracterizado pela manipulação política pelos fornecedores dessa matéria prima básica para o pleno funcionamento e eventual desenvolvimento de nossa economia forçou os generais-presidentes da época, e notadamente Ernesto Geisel, a alinhamentos e posturas políticas que diferiam, pela radicalização e sobretudo pela ênfase pró-árabe em determinados aspectos, de uma diplomacia anterior, que se desejava mais imparcial e equidistante das partes no conflito árabe-israelense, máxime na questão palestina.
    Se alguns excessos dessa fase foram mais adiante deixados pelo caminho, resta assinalar, no que nos concerne, que houve uma boa consequência da prévia  atitude por muitos considerada como oscilante entre os apoios automáticos e  algo constrangedora aparência de subserviente bajulação. Reporto-me à nossa firme posição de apoio ao povo palestino, em que razão e justiça se dão as mãos. Se o Brasil, pela presidência Oswaldo Aranha da Assembléia Geral das Nações Unidas, está ligado tanto ao nascimento de Israel, quanto ao conflito árabo-israelense, a sua inequívoca posterior posição de apoio ao povo palestino e à equitativa solução do diferendo com Israel, representa relevante contribuição para a construção da paz. Grita aos céus, em verdade, que um dos pilares da segurança mundial e da contenção do terrorismo está na implementação de uma paz equa naquela região, que garanta ao povo palestino a sua independência plena, livre afinal da bantustanização buscada pelos muros e pela continuada e iniqua apropriação de territórios árabes pela praga dos assentamentos dos colonos.
     Depois de longo inverno, o desenvolvimento da explotação petrolífera pela Petrobrás, a conquista da tecnologia de exploração de nossos depósitos submarinos e, já na era Lula, a descoberta de uma riqueza inda maior, na área do pré-sal, transformou nossa terra, de eterna pedinte no abastecimento do ouro negro alienígena, em produtora e mesmo exportadora de petróleo.
      É indubitável que a situação macro se alterou de forma extremamente positiva para o interesse da Nação brasileira, realidade que de resto se delineia inequívoca na magnitude de nossa produção de petróleo bruto.  No entanto,  a produção de gasolina, a par da de etanol, se ressentem de desenvolvimentos, nem todos sob o necessário controle das instâncias governamentais e da Petrobrás.
      Temos a Presidente Dilma Rousseff,  que é experta no assunto, e que acaba de colocar na Petrobrás  Graça Foster, dirigente de sua confiança e de reconhecida capacidade na área. Sem embargo, as Minas e Energia, área governamental de competência nas questões atinentes ao problema, deveria ser assumida por político ou técnico em condições de ter visão abrangente dos enormes desafios colocados pelo setor energético.
        A nossa atual condição de importadores de gasolina é uma decorrência dessa falta de planejamento, vale dizer a omissão na construção de refinarias para a produção de gasolina, o que nos coloca na desvantajosa situação de importar em grande quantidade produto manufaturado (e por tanto pagamos o ágio dessa tecnologia exterior, que poderíamos dispensar, se cuidássemos de criar instalações adequadas para tanto).
        Há muitas outras questões nesta área energética que não estão atendidas da melhor maneira, como o relativo descontrole da política relativa à cana de açúcar e aos seus produtos derivados, i.e., o açúcar para consumo (em vários estágios de preparo) e o etanol, essa invenção brasileira, com tanto potencial, e tão errática direção em termos de coordenação política.
        Neste blog tenho batido deveras na tecla concernente às montadoras sediadas no Brasil, todas elas estrangeiras (em consequência de magnos erros políticos tanto do regime militar, quanto de governantes civis, e em especial os laivos neoliberais da administração de Fernando Henrique Cardoso).  Permiti-me chamá-las de feitorias[1]     porque vi na sua instalação e localização a ênfase primacial do necessário desvio dos lucros auferidos para as matrizes alienígenas (muita vez, como na recente crise financeira internacional, transferindo a poupança brasileira para as matrizes em dificuldade financeira) e de problemas conflitantes no que tange ao aproveitamento da cana, seja como  açúcar, seja como etanol.  
       Um segundo aspecto dessas feitorias reside em uma situação monopsônica de fornecimento de peças, i.e., as indústrias de autopeças que não dispõem de outro comprador que não a montadora para a qual produzem, enfrentam situação a priori desfavorável, pois o único adquirente (monopsônio) é a outra versão do monopólio (único vendedor), ambas extremamente desfavoráveis seja no primeiro caso para o produtor, seja no segundo para os compradores.
      As autoridades brasileiras competentes no setor têm igualmente permitido que o nível de poluição dos carros aqui montados estejam escandalosamente acima dos requisitos impostos no circuito Elizabeth Arden.
     O exame da produção de petróleo – e não me ocupo aqui das confusões na exploração submarina, de que é exemplo a Chevron – e de seus produtos derivados, com a gasolina à frente, é uma triste relação do fracasso gerencial dos responsáveis, políticos e administrativos, nesse campo.
     Seria de todo interesse para a Nação brasileira que, depois de tantas décadas de pires na mão (por suposta carência de petróleo), nos descubramos agora enredados pela pletora de matérias primas, as quais por decorrência de deficiente gestão técnica, ambiental e política apresentam para o governo um grande, redundante problema, que decerto desapareceria se o entregássemos a quem dentre os brasileiros, tem visão abrangente e competência no capítulo. O fisiologismo, se é planta dispensável e sobretudo descartável, o será ainda mais em área de tal prioridade para o nosso sustentado desenvolvimento.
 

( Fonte subsidiária:  O Globo )  



[1] A história das feitorias do nascente império lusitano em costas de África constitui outro exemplo, com a explotação na época da exportação do fator trabalho (mão de obra escrava)  para as colônias e a metrópole.
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