Não importa como Maduro conseguiu a
reeleição. Se todos sabem que a coação e a fraude são suas agentes devotadas, o
resultado não será de molde a facilitar-lhes a vida na Venezuela.
Há muitas condicionantes que tornam a
existência no paraíso chavista um verdadeiro inferno, e não carece aqui
repeti-las, porque é chover no molhado. Que pessoas de todas as condições
empreendam essa custosa e arriscada travessia para além do paraíso, é um fato,
e não discutível premissa. Ao virarem essa página, esses novos, hodiernos
miseráveis, escarnecem não só das matérias pagas nos jornais, senão da
vociferante propaganda dos que antes se cognominava inocentes úteis.
Assim, a fuga de ônibus, ela não é
paga com o meio-óbulo de Caronte, pois carrega os passageiros para muito além das
sombras do Hades. É gente humilde que ora empreende essa viagem.
Se é um escândalo a céu aberto, que tal regime não só persista, mas logre,
pela fraude, a coação e a geral indiferença das Américas, manter-se no
poder, o que dizer da condição imposta
aos refugiados? Se entre eles haverá quem imite a jornada dos desgraçados, ainda
que não lhe faltem os meios, a travessia daqueles cobra a cada milha o viático
da esperança.
Não será fácil, portanto, ter
pelas costas o inferno chavista, feito de carestia, penúria e, sobretudo, a
incerteza que visita a pobres e ricos, na terra de Maduro. Em penosos
transportes, forçados a parar menos pelos achaques de um governo corrupto, mas
pelo das próprias conduções que se aventuram nessa dúbia rota da fuga, elas
serão acompanhadas pelos abutres que voejam à volta da carniça.
É raro, surpreendente mesmo, que os percalços e dissabores das classes
em geral submersas nas páginas da mídia repontem em publicações que em geral
não lhes abrem o espaço para as próprias misérias do cotidiano.
Sem embargo, se essas nesgas de
luz e conhecimento chegam a espaços ditos nobres, elas trazem consigo o luor da
esperança. Pois a esperança não tem classes, nem restrições burguesas. Pois ela ousa aninhar-se em todos os peitos e mentes. Tanto aquelas forjadas nas
cuidadas aléias dos bairros elegantes, quanto nos ínvios, tortuosos caminhos
dos casebres e das favelas.
Quando eles se tornam comuns e a
todos desejáveis, se o eldorado não está próximo, o inferno está ficando para
trás.
(
Fontes: Dante, La Commedia, Inferno; O Estado de S. Paulo )
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