O
episódio que veio ontem a lume e passou a ser geralmente conhecido pela
confissão espontânea de seu próprio causador tem múltiplos aspectos que,
decerto, não jogam uma luz benfazeja sobre o respectivo autor.
Procurador-Geral da República,
por dois períodos (2013-2017), tendo o seu biênio prorrogado em outro, pela
presidente Dilma Rousseff, uma distinção rara, que não foi concedida a outros
procuradores-gerais.
Agora, às vésperas de publicar
suas memórias, "Nada Menos que Tudo", livro que
está previsto para outubro vindouro, vem brutalmente à luz o escândalo
protagonizado pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot. Com efeito, o
ex-Procurador-Geral da República Rodrigo Janot foi alvo de ações de busca e
apreensão executadas pela Polícia Federal em sua casa e escritório, em
Brasília.
A ordem para tanto foi dada ontem (27 de setembro) pelo Ministro do
Supremo Alexandre de Moraes, que atendeu pedido feito pelo Ministro Gilmar
Mendes para suspender o porte de armas de Janot e impedi-lo de entrar nas
dependências do Supremo.
A Polícia Federal apreendeu uma pistola, um tablet e um celular no aparta-mento de Janot. As ações de busca e
apreensão foram decretadas no inquérito das fake
news - aberto para apurar ameaças a ministros do
STF e suas famílias - e de acordo com o
Ministro Moraes, tiveram o escopo de verificar a "eventual existência de
planeja- mento de novos atos atentatórios" contra Gilmar. " O quadro
revelado é gravíssimo, pois as entrevistas concedidas sugerem que aqueles que
não concordem com decisões proferidas pelos ministros desta Corte devem
resolver essas pendências usando de violência, armas de fogo e, até com a
prática de delitos contra a vida", observou Moraes.
Em entrevista ao Estado, Janot revelou que, em 2017, chegou a entrar
armado com uma pistola no Supremo,
decidido a matar Gilmar."Não ía ser ameaça,não. Ia ser assassinato mesmo. Ia matar ele e
depois me suicidar", afirmou o ex-procurador.
Duas equipes da Polícia Federal chegaram por volta de 1d7h40 na casa de
Janot, na Asa Sul. O ex-procurador-geral
acompanhou as buscas ao lado do segurança particular e de um morador
chamado pelos policiais para servir de
testemunha.
Além de suspender o
porte de armas de Janot, de impedi-lo de entrar nos edifícios do STF e de
barrar sua aproximação a Ministros da Corte Suprema, Moraes também determinou o
recolhimento imediato de depoimento do ex-procurador-geral "salvo se houver
recusa", "por tratar-se de
direito do investigado ao silêncio". Rodrigo Janot preferiu não depor.
Reações.
O episódio e seus desdobramentos chocaram o mundo político e provocaram reações
de perplexidade. Janot disse ao Estado de
S. Paulo que a intenção de atirar em Gilmar foi motivada por ataques que o
Ministro fez à filha dele.Quando era chefe do Ministério Público, Janot chegou
a pedir a suspeição de Gilmar Mendes na análise de um habeas corpus do empresário Eike Batista, sob o argumento de que a
mulher do ministro, Guiomar Mendes, atuava no escritório de Sérgio Bermudes.
Ao
se defender, o magistrado afirmou que a filha de Janot advogava para a em- preiteira OAS em processo no Conselho
Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e poderia ser "credora por honorários advocatícios de
pessoas jurídicas envolvidas na Lava Jato". A história aparece no livro de
memórias Nada Melhor que Tudo, a selançado pelo ex-chefe do MP em outubro.
Na publicação, porém, Janot preferiu "não dar nome aos bois".
A respeito do entrevero, e em tom irônico, o presidente da Câmara,
Rodrigo Maia (DEM-RJ) afirmou que "esse é o Brasil". Depois,
disse que a revelação de Janot pode
afetar os investimentos privados no País. "O Brasil é um país estranho.
Cada dia é uma novidade. Hoje descobrimos que o procurador-geral queria matar
um ministro do Supremo. Quem é que vai querer investir num país desse?",
perguntou Maia, em um seminário na Fundação Getúlio Vargas, no Rio, sobre
parcerias público-privadas.
Gilmar. Em resposta à revelação de Rodrigo Janot, o
Ministro do Supremo Gilmar Mendes afirmou em
nota, que o ex-procurador-geral deve buscar ajuda psiquiátrica e, durante entrevista,
disse que não imaginava que houvesse um "potencial facínora" no
comando da Procuradoria-Geral da República - Janot comandou o Ministério
Público entre 2013 e 2017.
Em entrevista ao Estado, Janot disse
que chegou a ir ao STF armado com a intenção de matar a tiros o ministro Gilmar. "Não ia ser ameaça
não. Ia ser assassinato mesmo. Ia matar ele (Gilmar) e depois me
suicidar", declarou Janot.
Durante entrevista em Brasília, Gilmar Mendes disse que, frente às
declara- ções do ex-procurador-geral, até a atuação de Janot enquanto esteve à
frente da PGR precisa ser analisada pelo País. Ele fez críticas ao modelo de
indicação ao cargo, que chamou de "corporativo", e afirmou que o
sistema político terá de descobrir novos critérios para a escolha do posto.
"Modelo deu errado", afirmou o ministro.
Gilmar também afirmou que por se tratar, em sua "impressão",
de um problema grave de caráter psiquiátrico", a atuação do ex-procurador
atinge todas as medidas que ele solicitou e foram deferidas na Suprema Corte.
"Denúncias, investiga-ções, e tudo o mais. É isso que tem que ser
analisado pelo País", afirmou o
ministro Gilmar.
O ministro também fez comentários sobre o assunto nas redes sociais.
"É difícil não imaginar os abusos cometidos ao acusar e processar investigados",
escreveu Gilmar no Twitter. "Lamento que o ex-chefe da PGR tenha sido
capaz de cogitações homicidas por divergências na interpretação da
Constituição."
Em nota, Gilmar Mendes, que é crítico aos métodos da Operação Lava Jato,
afirmou que o combate à corrupção no Brasil "justo, necessário e
urgente", "tornou-se refém de fanáticos que nunca esconderam que também tinham um projeto de poder".
"Dentro do que é cabível a um ministro do STF, procurei evidenciar tais
desvios. E continuarei a fazê-lo em defesa da Constituição e do devido processo
legal."
(
Fonte: O Estado de S. Paulo )