sábado, 30 de agosto de 2014

Papai Putin bate à porta...


                                     

          É difícil determinar até que ponto o Presidente Vladimir V. Putin quer ir na sua campanha de baixa intensidade contra a Ucrânia. Como se vivesse em um mundo em que inexistisse direito internacional, em que o respeito às fronteiras constitui norma comezinha da lei das gentes, o presidente de todas as Rússias continua a agir de forma esquizofrênica, pairando em esfera que ele pensa sua, a qual em princípio deve permitir-lhe responder aos telefonemas de autoridades de vizinhos países europeus – como a Chanceler Angela Merkel - que porventura lhe peçam explicações sobre as repetidas incursões de seu exército na Ucrânia oriental.

          Com o nível de seu respeito à verdade, não semelha difícil que a gospodin Putin acudam desculpas verossímeis, que possam envolver com uma esgarçada tela as contínuas incursões de seu exército em terras ucranianas.

           No passado, existiam os chamados kremlinologistas, que eram jornalistas estudiosos do mundo soviético e, em particular, de sua instância colegial de governo. Não era, decerto, ciência exata, e muita vez as suas ilações sobre a posição e a influência dos membros do Politburo – que era a mais alta expressão do poder soviético – tinham de sustentar-se na ordem de colocação, sobre o monumento da Praça Vermelha, dos gerarcas soviéticos, na ritual assistência aos desfiles do Exército Vermelho, nas suas grandes datas.

            Na encolhida Rússia da atualidade, talvez a principal preocupação de seu Presidente, estaria na afirmação do respectivo poder internacional. Até hoje Putin guardaria rancor acerca da maneira com que se tratava o seu predecessor Boris Ieltsin, e a não suficiente deferência prestada pelo Ocidente à nova Rússia, saída do inusitado fenômeno da autodissolução da superpotência União Soviética.

           Não é de hoje que a Rússia de Putin brinca de gato e rato com os seus vizinhos menores, como foi no caso da Geórgia do Sul e da Abkazia do Sul. No entanto, George Bush Jr. sofreu na carne a passageira ilusão de que, enquanto superpotência, os Estados Unidos poderiam exercer alguma influência para impedir que o chamado modelo imperialista século XIX pudesse ser empregado impunemente por Moscou.

           Não tardou muito para que o 43º presidente americano se desse conta das tristes condições que pairam sobre os estados colindantes com o urso do Kremlin.  Já o 44º Presidente, Barack H. Obama, pode chamar a Federação Russa de potência regional – ali o jurista Obama sabe que toca em nervo à flor da pele de Putin – porque o que o antigo membro do Grupo dos Oito (dele afastado justamente pelas tropelias contra a Ucrânia)  mais anseia é voltar a ter posição similar à da extinta URSS.

            Se a Rússia é ainda o país mais extenso do planeta, a dissolução pacífica de 1992 a fez perder muito território – como as repúblicas do Báltico, e as suas vizinhas da Sibéria – mas conservou o assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas e a capacidade de influenciar as antigas repúblicas soviéticas.

             Se ainda por cima dispõe de considerável arsenal termonuclear, e a possibilidade de alimentar fumaças da chamada doutrina eurasiana (sob o corte do eclético alfaiate Putin, com suas pretensões de hegemonia a que servem fazendas de direita e esquerda). Esqueceu-me dizer que o braço do ex-KGB  também alcança o acrônimo BRICS...

                  Como já foi dito neste blog – e mais de uma vez – gospodin Vladimir Putin admira il Duce, aquele que inventou o Estado fascista, e que, à distância, lhe ensinou alguns truques como o do torso nu, na batalha do trigo, e o gosto tão italiano da encenação.

                  Nesse contexto, na internet tropecei em uma assertiva do presidente russo que me parece importante, na medida em que lhe desnuda o pensamento (mas também as próprias limitações).

                  Disse o Presidente: “Quero lembrar que a Rússia é uma das nações nucleares mais poderosas. Isto é a realidade e não somente palavras. Não se metam com a Rússia (don’t mess up)”.

                  Não há negar que, por tal circunstância, o presidente russo reivindica respeito. Dá a impressão, outrossim, de alguém que julga merecer mais atenção do que aquela que vem recebendo. Se não se pode duvidar do poder inerente às armas nucleares, dadas as suas implicações de destruição, na verdade esse poder é muito mais deterrente do que pro-ativo (dadas as impensáveis consequências de seu uso).  Em outras palavras, como instrumento de política esse arsenal se afigura bastante limitado em termos de uso.

                    Até o presente, o acosso da Ucrânia não tem custado demasiado à economia russa. São sabidas as limitações de sua economia. Até o momento as sanções do Ocidente podem ter incomodado Moscou, mas não são de molde a induzir o invasor russo a recuar.

                     O presidente Petro Poroshenko tem continuado a encontrar-se com quem instrumentaliza o acosso de seu país, com o provável escopo de apoderar-se de mais uma fatia de território ucraniano. Nada foi dito pelo governo de Kiev quanto a uma estratégia de reação na Ucrânia oriental e de eventual recuperação da Crimeia.

                      O Kremlin vem forçando a Ucrânia a batalhar em duas frentes, uma contra forças separatistas pró-Rússia (Donetsk e Luhansk) e a outra, em Novoazovsk, contra coluna entre quatro mil e cinco mil de militares russos.  O escopo dessa última incursão – fica a 20 km da fronteira e a sudeste de Donetsk – seria a de minorar o ataque das forças de Kiev contra o bolsão de Donetsk.

                      Caso não baste essa incursão no sul da Ucrânia, se prevê o recurso a um    exército russo com vinte mil homens na fronteira.  Nesse contexto, é importante a declaração do Secretário-Geral da NATO, Anders Fogh Rasmussen: “Fique claro que tropas russas e equipamento ilegalmente atravessaram a fronteira na Ucrânia leste e sudeste. Malgrado os desmentidos sem consistência,  a real intenção é desestabilizar a Ucrânia como país independente e soberano.”

                       Pode-se dizer que a Ucrânia está sendo ‘castigada’ pelo atrevimento de escorraçar o quisling Viktor Yanukovych – que cancelara a assinatura do pacto com a União Europeia – através da revolta da Praça Maidan.  Como o escopo do então presidente ucraniano era fazer a Ucrania parte da União Aduaneira Russa,  a agressão sistemática contra a Ucrânia, nas suas províncias orientais, faz parte de um programa de desestabilização desse país, com o escopo de transformá-lo em algo similar à Bielo-Rússia.

( Fonte:  CNN )

                        

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