quinta-feira, 14 de março de 2013

A Radicalização da Burrice

                                         

          Desde algum tempo, nem os incorrigíveis otimistas – apesar de repetidas recaídas -  podem encontrar motivos para aferrar-se à esperança de que ainda exista um remanescente espírito bipartidário no Senado.
          Decerto, o líder da maioria, Senador Harry Reid (Nev/Dem)  acreditava em tal ilusão quando acordou com o Senador Mitch McConnell (SC/Rep) em não aprofundar as disposições contra a filibuster, desde que respeitadas as questões de segurança nacional.
         Não foi decisão unânime, eis que muitos democratas temiam que continuasse a instrumentalização da manobra parlamentar fundada na regra XXII do regimento do Senado, que é o direito da minoria de prolongar o debate, em geral por um orador solitário, que visa esgotar o tempo e ‘matar’ a proposta da maioria. O termo vem de ‘filibusteiro’, o pirata do Caribe, e é essencialmente um recurso da minoria.
        No entanto, como o  filibuster’ vem sendo praticado pelo Partido Republicano, esse instrumento  extremo passou à rotina, e de defesa das prerrogativas democráticas de uma minoria virou expediente sistemático de tentativa de inviabilização da atividade governamental, que é exercida, por antiga usança democrática, pela maioria.
        Já o presidente Barack Obama pagou caro pela doce ilusão de julgar possível reviver o antigo espírito bipartidista, testemunhado por congressos de antanho, em questões reputadas de interesse nacional e, portanto, não suscetíveis das deformações de facção.
        O Grand Old Party é hoje um partido amargado por duas derrotas sucessivas na eleição para a Casa Branca. Costuma defender os interesses dos ricos e abastados, e tal feição ficou muito clara quando veio a lume, no encontro em Boca Ratón do candidato Mitt Romney com grandes doadores, como o ex-governador de Massachusetts via no corpo eleitoral  os 47% de ‘tomadores’, pouco mais do que parasitas da ajuda estatal, e votantes contumazes do Partido Democrata.
       Esse erro estratégico de o que foi o partido de Lincoln o condenou à derrota nos comícios de seis de novembro, em que os empecilhos artificiais colocados por republicanos em estados-chave não foram suficientes para evitar a vitória de Obama e do Partido Democrata não só junto aos afro-americanos, mas também às mulheres, latino-americanos e comunidades de baixa renda.
       Parece que o GOP não aprendeu a lição de que a desejada vitória nas urnas não será obtida através de artifícios e de medidas tendentes a dificultar o acesso (ou, o que dá no mesmo, alongar o tempo de espera para os fracos, pobres e idosos) e desta maneira tentar reduzir o contingente de sufrágios dos supostos ‘tomadores’ (takers).
      Com efeito, também no Senado os republicanos recorrem ao sufoco das iniciativas e das designações governamentais, que por dispositivo constitucional devam ser ratificadas pela Câmara Alta.
      A esse respeito, é sintomática a gritante obstrução pela bancada republicana, através do filibuster, de confirmação da designação do diretor-interino Richard Cordray.  Cruamente colocada, trata-se do intento de matar ou mutilar o ‘Bureau de Proteção ao Consumidor Financeiro’ (Consumer Financial Protection Bureau), por intermédio da inviabilização dessa agência, se despojada da respectiva direção (o que automaticamente a atingirá na sua capacidade de proteger o pequeno consumidor).
       Elizabeth Warren, a senadora democrata júnior por Massachusetts, que é a principal autora da proposta desta Agência, em suas palavras, no Comitê bancário do Senado assinalou que “o povo americano deseja um Congresso que se preocupe menos em ajudar grandes bancos e sim  auxiliar  pessoas comuns (regular people) que foram enganadas nas hipotecas, nos cartões de crédito, em seguros para estudantes, ou nos seus registros de crédito!”
      A cega oposição do GOP contra a efetivação da nomeação de Richard Cordray não é pessoal ou relativa à suposta incapacidade do indicado para o desempenho das respectivas funções. O que cinicamente o Partido Republicano se propõe é inviabilizar uma conquista para o pequeno e médio consumidor, e sabemos o quão importante essa agência pode ser, se tivermos em mente os sistemáticos enganos que foram praticados pelos bancos junto a consumidores de baixa renda, muitos deles negros, latinos ou simplesmente idosos, induzidos a assumirem hipotecas subprime, com os conhecidos embustes, que desembocaram na grande crise das ditas hipotecas subprime e mais adiante na Grande Crise Financeira internacional.  
      Diante do descumprimento da palavra empenhada – o que possibilitou a permanência do filibuster praticamente sem maiores emendas corretivas – os lideres democratas voltaram a discutir sobre a necessidade de pôr um termo à obstrução sistemática das nomeações para o Governo e os tribunais, que vem sendo exercida pela bancada minoritária do GOP no Senado. Diante da conscientização de tal desígnio anti-governo, torna-se imperiosa a modificação das regras para o filibuster, se o Partido Democrata deseja evitar que as vagas para funções administrativas e judiciais possam ser preenchidas, e não sistematicamente inviabilizadas, como vem ocorrendo.
     Há vários exemplos de cargos importantes que não podem ser assumidos pelos indicados respectivos. Caetlin Halligan, v.g., teve a nomeação bloqueada por diversos anos no seu processo de confirmação para juíza na Corte Superior de Apelações, no Distrito de Colúmbia.
     A senhora Halligan, a despeito de seus inúmeros títulos e experiência legal, por haver preparado um parecer jurídico para o procurador André Cuomo, foi distinguida por poderosa inimizade nos círculos de direção da Associação Nacional de Armas (National Rifle Association).  Através de solícitos republicanos no Senado tem sido obstada (e na prática enterrada) a designação da dra. Halligan, que decerto está sendo perseguida por suas qualidades e conhecimento específico.
      Resta verificar se esta coleção de injustiças e de mesquinharias encontrará cobro em modificação da regra do filibuster (que deve proteger as minorias, mas não inviabilizar a ação governamental das maiorias).

 

( Fonte:  TPMDC )

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