quinta-feira, 21 de março de 2013

A Crise do GOP

                               

           A crise do Partido Republicano vem sendo objeto de uma série de artigos na imprensa americana. Desde algum tempo, como o leitor terá presente, a questão é versada pelo blog, posto que até o presente de forma incidental.
          A esse propósito, somente para dar uma ideia da atenção dispensada, o International Herald Tribune (edição internacional do New York Times) estampou a 19 do corrente a matéria “Republicanos se olham no Espelho e vacilam” e, por outro lado, a conceituada publicação  New York Review publica artigo de Elizabeth Drew ‘Será que os republicanos não podem mais ser salvos ?’.
          A questão cresce em importância, se levarmos em conta que a política americana se caracteriza pelo bipartidarismo. Assim, a esquerda, ou para ser mais preciso, a parcela liberal-progressista é representada pelo Partido Democrata, enquanto a direita, ou a parte conservadora do eleitorado, fica a cargo do Grand Old Party, que em outras encarnações foi o partido de Abraham Lincoln.
         Tanto no Senado Federal, quanto na Câmara de Representantes, apenas estão presentes democratas e republicanos, com a eventual exceção de uns poucos independentes. Esse fenômeno, que, em geral, se circunscreve à Câmara Alta, não tem maior efeito nas votações, eis que os ditos independentes participam do grupo (‘caucus’)  dos democratas, e costumam apoiar as posições deste partido.
          Antes de aprofundarmos a análise, será necessário ter em mente que o Partido Republicano vai muito bem obrigado na esfera estadual (controla trinta das cinquenta governadorias) e a sua posição nas assembleias estaduais é igualmente avantajada.
         No nível federal, o GOP manteve uma diminuída maioria na Casa de Representantes. Como muito bem assinala E. Drew, os republicanos perderam no voto popular para essa Câmara de Deputados em 2012, “só logrando manter uma maioria de cadeiras como resultado do gerrymandering nos estados controlados pelo Partido Republicano”.
         Tal já foi dito, mas não é sem propósito reafirmar que essa situação constitucional de paralisia legislativa (gridlock) se deve ao abismal desempenho do novel Presidente Barack Obama, em seu primeiro biênio, como descrito por Suskind em seu livro Homens de Confiança. Daí não só o shellacking (tunda) de 2010, mas também a criação de bases objetivas para o desvirtuamento do voto para a Câmara por muitas assembleias estaduais. Por isso, os percentuais nacionais para presidente e Senado estão adulterados na votação para a Câmara. Nesse contexto, é importante que E. Drew dê nome aos bois,  e não recorra aos circunlóquios de outros jornais e jornalistas, que não vão além de obscuras insinuações.
         Sem o artifício do gerrymandering (que foi inventado em Massachusetts no século XIX e consiste em montar circunscrições eleitorais que assegurem a vitória do partido favorecido  pela assembleia, através da fraude na composição do distrito), Nancy Pelosi teria voltado a ser a Speaker, consignando o pomposo John Boehner para a chefia da minoria... Como o GOP se vale do artificialismo de um truque, é de presumir-se que a sua vida não será longa, posto que não se possa subestimar as dificuldades em estados onde a maioria dos juízes[1] será nomeada pelo Partido Republicano.
        De qualquer forma, os republicanos perderam no voto popular cinco das últimas seis eleições presidenciais, embora tenham vencido em duas pela eleição indireta (por especial cortesia da Corte Suprema que, em 2000, mandou suspender a recontagem dos votos na Flórida, o que na prática implicou em dar a eleição de bandeja a George W.Bush, o candidato do GOP.
        Também para o Senado, perderam a oportunidade de retomá-lo por duas vezes. Tal se deve ao ingresso na cena política – depois da eleição de Obama em 2008 – do movimento Tea Party. Essa facção, de viés reacionário, surgiu com a ajuda de grandes contribuintes do GOP (como os petroleiros irmãos Koch), e atingiu a sua maior força em 2010.
        Com a reeleição de Barack Obama em 2012, notou-se sensível decréscimo nos representantes legislativos oriundos desse movimento.   
        É mais um avatar da extrema direita que se sucede às aproximações do GOP com grupelhos como a John Birch Society, que foram depois repudiadas pela direção partidária. De qualquer maneira, a atual crise no Partido Republicano é uma decorrência de seu extremo e demagógico conservadorismo. Em função da crescente presença evangélica no GOP, a ala moderada foi paulatinamente afastada e mesmo escorraçada do partido.
         Não surpreende, portanto, a sua postura favorável aos ricos, com a manutenção de baixos impostos para os abastados e a tentativa de esvaziar os grandes programas (v.g., Medicaid e Medicare) que favorecem as classes menos afortunadas.
         Por isso, não surpreende que Obama tenha vencido com certa facilidade a Mitt Romney, em resultado do apoio recebido de latinos, afro-americanos, mulheres e outras minorias que não logram identificar-se com o GOP.
         Até mesmo o episódio de Boca Ratón, em que a gafe de Romney em reunião privada com grandes contribuintes acerca dos 47% de tomadores (leia-se no léxico republicano parasitas) que apoiam sempre o Partido Democrata. Esse deslize teve influência inegável em mostrar o verdadeiro rosto do campeão republicano, e a fonte da divulgação se deve – como foi ulteriormente verificado - ao bartender, o que semelha bastante significativo da conscientização das minorias na luta contra os gatos gordos do GOP...
         Se o Partido Republicano continuar na sua linha de tentar obviar a sua falta de votos nas camadas populares com os truques de dificultar a votação dos segmentos que a sua política hostiliza, a par de outros expedientes de dúbia validade (como o intento de pulverizar a votação indireta de cada estado, e não mais a regra de que o vencedor leva o conjunto dos votos indiretos), ele se estará estigmatizando perante o eleitorado e apressando a respectiva decadência no âmbito federal.

                                                                                                                             (a continuar)

( Fontes:  International Herald Tribune, The New York Review of Books )



[1] Cabe aos tribunais invalidar as eventuais fraudes na formação dos distritos.

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