quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Para garantir o presente, gastar o futuro ?

Poderia tratar da arrogância dos líderes partidários, negando-se a conferir urgência ao pedido de um milhão e quinhentos mil eleitores (projeto de lei de iniciativa popular das fichas sujas), ou então da incrível carga da cavalaria pesada contra manifestantes estudantis, ousando o governador Arruda o que nem o próprio Fernando Collor fizera contra outros jovens, que igualmente protestavam. No entanto, creio importante pedir a sua atenção para o irresponsável padrão de gastos que ora caracteriza o governo do Presidente Lula.
Desde algum tempo, este blog tem ressaltado o neopopulismo de Lula, em seu segundo mandato, que difere da postura do primeiro mandato, com o respeito da ortodoxia economico-financeira, e que se traduziu em posição invejável para o Brasil junto às finanças internacionais.
A princípio, era de acreditar-se na genuína conversão de Lula aos ditames de responsável gestão economico-financeira, o que de resto não pouco lhe facilitou o trânsito internacional, a par de assegurar à economia brasileira solidez provada pelo embate da crise financeira internacional de 2008/9. Tampouco o presidente hesitou em jactar-se dos resultados obtidos, exatamente por haver seguido o manual da ortodoxia.
Infelizmente, o comportamento presidencial neste segundo mandato vem demonstrar que, na verdade, não abandonara a heterodoxia do passado. Da pele de cordeiro do bom comportamento se serviu por um tempo, porém retorna agora e gostosamente à natureza do Lula de antes, com o próprio irresponsável neopopulismo.
Em sua coluna de hoje, Merval Pereira assinala: “o governo está usando até o limite da irresponsabilidade a permissão para gastar dada aos governos nacionais pela crise financeira (internacional)”.
Fiando-se na sua conduta anterior, o mercado financeiro internacional ainda não deu a atenção devida à deterioração das contas públicas, que uma série de medidas, de índole demagógica e eleitoreira, vem acumulando e agravando, de maneira inequívoca.
Assim, o novo aporte de R$ 80 bilhões para o BNDES estimular setores da economia (bens de capital) deverá aumentar a dívida bruta nacional. Com efeito, o Ministério da Fazenda se está valendo de um artifício, repassando recursos aos bancos públicos sem aumentar a dívida líquida. Conforme tal estratégia, o volume de crédito do BNDES desde junho de 2008 subiu para cerca de 5% do PIB. Com as novas disposições, o percentual tenderá a elevar-se. Dessa considerável expansão do crédito, em que se testa o limite inflacionário, também participam Banco do Brasil e Caixa Econômica.
Por causa disso, a dívida pública bruta – que está em 66,5% do PIB – deve ultrapassar em 2010 os 70 %. Por uma série de circunstãncias conjunturais, o Brasil tem gozado de um verdadeiro upgrade em termos de inversões estrangeiras, eis que as estamos recebendo como se estivéramos na faixa dos países de 40% da relação dívida bruta/PIB.
Por outro lado, a relação dívida liquida/PIB é atualmente de 44%, suscetível de pequenos decréscimos em função de revisões periódicas do PIB pelo IBGE. Já o superávit primário se acha bem menor aos de anos anteriores. No entanto, este indicador tem no ano corrente menor importância negativa, determinada pela queda dos juros, e a consequente diminuição no montante total a ser pago por conta da dívida.
Dessarte, foi possível reduzir o superávit primário, não só pela queda dos juros, dada a ulterior indicação de médio prazo, também com viés estacionário ou declinante. Contudo, com o previsto retorno da normalidade, reentrará em cena a necessidade de um superavit primário mais relevante.
E quais são as ações do governo ? Anúncio de novas desonerações fiscais, que vão custar aos cofres públicos R$ 3,208 bilhões em 2010, que compreendem prorrogação da desoneração do IPI, bem como suspensão de cobrança de impostos sobre bens de capital e serviços. A respeito, o Ministro Mantega descartou risco inflacionário, porque se trataria de voltar ao patamar de investimentos de 2008, com crescimento de 20% ao ano, e o resultante incremento da oferta de produtos.
Se aqui as boas intenções poderão ter bons resultados (sem aquecimento da demanda e, portanto, sem viés inflacionário), o quadro se torna bem mais preocupante nas despesas primárias do governo central. Segundo estudo do economista Fabio Giambiagi, eis o salto dessa despesa primária (benefícios do INSS, pagamento de pessoal, e transferências a estados e municípios): em 1991 era de 13,7% do PIB; cresceu a 19,5% em 2002, último ano de FHC; e a previsão é que cheguem a 23,6% do PIB em 2010, último ano de Lula.
Tem-se aqui referido várias vezes ao sensível incremento nos chamados gastos correntes, que diz respeito aos compromisso com o pagamento de pessoal. Tal corresponde não só à inchação de vários quadros de funcionários, assim como os reajustes concedidos a determinadas categorias profissionais. Quanto aos reajustes do salário mínimo no governo Lula, devem ser avaliados positivamente, dados o seu baixo nível anterior e a finalidade social dos incrementos.
Acresce notar que com todas essas elevações nos gastos primários e nas despesas com programas assistencialistas, e as concomitantes reduções fiscais, haverá poucos fundos para investimentos públicos. Na verdade, essa característica não se distingue da precedente linha de ação da presidência Lula, com o seu fraco desempenho nas inversões de infraestrutura, saúde, segurança e educação.
Em outras palavras, a ênfase no presente e em detrimento do futuro, pode condenar o Brasil a um presente estagnado e sem futuro.

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