quinta-feira, 2 de julho de 2009

O Processo da Queda de Sarney

O enfraquecimento da posição de José Sarney no Senado não foi detido tanto pelo esbravejar do Presidente Lula, quanto pelas ameaças do Senador com o fantasma da ingovernabilidade.
Acentua-se o isolamento político do presidente do Senado. Para evitar os constrangimentos da presença em plenário, Sarney passou mais tempo refugiado em casa ou no próprio gabinete, do que se dispôs a enfrentar da mesa a crescente hostilidade da assembléia de seus pares. A sua fragilidade chegou ao ponto de não admitir questionamentos ou outras invasões da realidade, quando aceitou presidir à sessão em homenagem ao deputado José Aristodemo Pinotti, recentemente falecido.
Como sublinhou comentarista, isolamento é mau sinal para dirigente político, e sobretudo para quem depende de diálogo e consenso como instrumentos da respectiva atuação.
Diante da oposição do PSDB, a ulterior defecção do DEM – que formara com o PMDB e o PT a coalizão que o elegera – representou para a sustentabilidade da presidência de Sarney golpe cuja gravidade não podia ser escamoteada.
Dados os laços do velho oligarca com a antiga Frente liberal – para não falar do PDS – será compreensível o quanto o afetou pessoalmente o afastamento dos Senadores do DEM, liderados por José Agripino Maia.
Contestado igualmente pelo PDT e o pequeno PSol, a base de apoio do presidente Sarney ficou encolhida para o PMDB e o PT.
Quanto ao Partido dos Trabalhadores, o seu comportamento ontem beirou os limites do constrangedor. Encabeçados pelo líder Aloizio Mercadante, dez elementos da bancada (não se associaram Tião Viana e Flávio Arns) visitaram Sarney em sua casa. Nessa oportunidade, Eduardo Suplicy e Marina Silva pediram afastamento temporário de trinta dias, metade do que fora aventado por PSDB e DEM.
Essa posição dos senadores petistas, reminiscente das posturas éticas do passado, não iria perdurar por muito. Do exterior, onde o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva costuma encontrar-se demasiado amiúde, vieram telefonemas presidenciais que conseguiriam reverter o quadro petista.
Embora seja difícil precisar o que realmente aconteceu, não há dúvidas de que o magistrado se recolheu e ressurgiu, com o destempero previsível, o avatar do dirigente sindical. Consoante o Panorama Político de O Globo, “o presidente Lula está possesso. Pelo telefone, xingou o líder da bancada, Aloizio Mercadante (PT-SP), e delegou a Ideli Salvatti (PT-SC) a defesa de Sarney.”
Como se estivesse manejando ninho de metralhadoras, despejou telefonemas em que intentou coser o reiterado socorro do PT ao naufragante presidente, encareceu a este que não tomasse qualquer decisão antes de seu retorno à Brasília, e polemizou com a oposição de que quer ganhar o Senado ‘no tapetão’, o que, no entender presidencial, “não faz parte do jogo democrático”.
José Sarney, por outro lado, busca transformar a própria fraqueza em força, ao ameaçar com a renúncia e a consequente temida ingovernabilidade. Nessa faixa, entra no jogo Renan Calheiros, dentro de sua especialidade de valer-se das incertezas políticas como forma de atemorizar os atuais parceiros com as insídias de infernos astrais epitomizados pelo tucano Marconi Perillo (o substituto de Sarney na hipótese da licença), e pela incógnita do sucessor (na eventualidade da renúncia do titular), com a viabilização da CPI da Petrobrás e outros demônios.
Só existe um problema com a estratégia da defesa desesperada de Lula de seu velho amigo José Sarney. Não sendo a crise artificial, a manutenção in extremis da presidência Sarney, não esvaziará a sua antecâmara da pletora de escândalos a que me referira em artigo anterior.
Ao que tudo indica, pelo contrário, eles continuarão a crescer, como é da natureza do processo. E, cumpre lembrar, a esfinge tende a devorar a todos aqueles que não podem, ou não querem decifrar-lhe o enigma.

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