sexta-feira, 17 de julho de 2009

Considerações acerca da Suplência no Senado

Dentre os desajustes e as deficiências da chamada Constituição Cidadã, os Constituintes permitiram a permanência no Senado Federal de instituto de ranço patrimonialista, verdadeira excrescência jurídica, que é aquele de Suplente de Senador. Com efeito, o artigo 46, parágrafo 3º , dispõe que “cada Senador será eleito com dois suplentes.”
Os eleitores não são informados desses dois nomes que o candidato traz consigo. Se porventura eleito o ‘seu’ Senador, cabe a esses senhores aguardar, na própria obscuridade, a eventual ocasião que lhes podem reservar, sejam as Parcas, seja o voo do respectivo Pai da Pátria para mais altas destinações.
Dado o caráter patrimonialista do instituto que o macula, a indicação para a suplência será decidida pelo arbítrio do candidato. Como um pequeno régulo, ele determina que fulano e beltrano são seus suplentes. O Povo não tem qualquer poder ad referendum para confirmar o substituto daquele que escolhera em eleição majoritária para mandato de oito anos.
Para todos os fins, o Senador é senhor desta sua especial listinha. Que aponte os suplentes por compadrio, por nepotismo, por contubérnio político ou até por especial distinção, é coisa que guarda na sua algibeira e a mais ninguém concerne.
A história do Senado da República tem exemplos abundantes de suplentes que herdaram por dádiva celeste a sinecura senatorial, alguns impondo a sua vacuidade política ao próprio estado por longos períodos que emulam os sete bíblicos anos.
Que os constituíntes do Dr. Ulysses Guimarães, que tantas disposições generosas e democráticas trouxeram para a Carta Magna de 5 de outubro de 1988, tenham consentido na sobrevivência de tal privilégio, que recende ao autoritarismo dos biônicos, não lhes foi acoimado na época, quiçá sob a efusão libertária da abolição da censura, do habeas data, e de inúmeros outros progressos, arrancados ao cabo da longa noite da ditadura militar.
Diante da crise do Senado Federal, que alguns acreditam terminal, e que levou inclusive um Senador a sugerir, por plebiscito, a dissolução, há fenômenos maiores e menores. Só escapa àqueles que não querem ver que o mofino instituto da suplência é apenas mazela do órgão político, em meio à profusão de escândalos ora levantados pelos ditos atos secretos e demais ilegalidades.
Este artigo não se propõe pormenorizar o que subjaz à falta de qualquer senso de decoro e decência que infesta ambientes que contrastam na sua linearidade com os contortos membros que ex officio os frequentam.
Hoje me ocupo de algo mofino, mas de consequências não de todo sem importância. A direção do Senado, ora para sua infelicidade, entregue a José Sarney e a Renan Calheiros, julgou aceitável e condizente com os parâmetros da instituição nomear para a presidência do Conselho de Ética o suplente Paulo Duque (PMDB-RJ), que até este dia tinha como principal distinção ser o mais velho da Casa.
Não creio necessário delongar-me em o que significa para o Senado tal nomeação. Há certos tópicos cujas características são desdouro para quem deles demasiado se aproxima.
Releva apenas transcrever o que disse o citado representante a propósito da opinião pública: “Não estou preocupado com isso. A opinião pública é muito volúvel. Ela flutua. E quem tem muita influência sobre ela são vocês, jornalistas.” E, em seguida, aditou: “Não temo ser cobrado por nada. Quem faz a opinião pública são os jornais, tanto eles estão acabando.”
À vista de tais declarações, é de presumir que o Sr. Paulo Duque se irmana à grei do deputado Sérgio Moraes (PTB-RS). Ele também se lixa para a opinião pública.
Esta posição, de cunho fascistóide, tem sido abraçada por alguns outros, no afã de desonerar um Presidente que da opinião pública se tem dissociado em declarações e gestos públicos.
São moscas. Incomodam, mas passarão.
E o Sr. Paulo Duque ? Será decerto um escárnio para a Ética, que em um Conselho tomado pela tropa de choque seja pespegado como presidente.
Não obstante, o Sr. Paulo Duque fala corretamente, ao desprezar a opinião pública. Para ele, a voz das ruas não tem relevância. Porque nenhum voto do Povo o colocou no Senado. Traz para a curul em que ora se assenta tão somente o peso da respectiva pessoa.
Não percamos tempo com tais personagens. Eles passarão, talvez mais rápido do que pensam, assim como o instituto da suplência que enxovalha o que ainda enxovalhar possa a imagem do Senado Federal.

Nenhum comentário: