quarta-feira, 29 de julho de 2009

Demasiadas Concessões em Itaipu

Do recente acordo Brasil – Paraguai, que acaba de ser assinado pelos presidentes Lula da Silva e Fernando Lugo, há muito o que assinalar, mas infelizmente pouco que acrescente aos fastos da diplomacia brasileira.
Para que melhor se entenda das razões dos resultados obtidos, cabe um sumário da prática diplomática. Os chefes de estado e de governo não negociam diretamente os tratados. Para disporem de mais tempo e acautelarem os direitos respectivos, a negociação é feita por agentes diplomáticos, de preferência experientes. A história diplomática brasileira é, por isso, uma longa cadeia de êxitos, que honram os ministérios dos negócios estrangeiros do Império, e o Itamaraty, dos ministérios de relações exteriores da República.
Essa prática de negociação, na verdade, antecede à própria independência. Alexandre de Gusmão, brasileiro de Santos, e secretário de D. João V, negociou o tratado de Madrid, que daria à posteridade a feição do Brasil que hoje conhecemos.
Fê-lo, no entanto, através de instruções pormenorizadas ao negociador formal, que as repassaria ao negociador espanhol. Pelo preparo e a experiência dessa figura tutelar da diplomacia, D. João V obteve para Portugal e sua então colônia, Brasil, o melhor dos resultados, sem que ele, ou seu negociador secreto, carecessem pôr os pés em Castela.
Quando mãos inexperientes acreditaram poder se substituir à experiência diplomática – e, por sorte, até o presente, os exemplos são escassos – os resultados foram mais do que decepcionantes, na verdade atentatórios ao interesse nacional. Basta referir o apressado tratado firmado por Quintino Bocaiúva, cedendo à Argentina terras que estavam em nosso poder, habitadas por cidadãos brasileiros e de importância estratégica para a segurança nacional.[i] Em boa hora rejeitado pelo Congresso brasileiro, a questão voltou aos termos deixados pelo Imperador em 7 de setembro de 1889, vale dizer, o arbitramento. Disso oportunamente cuidaria, para sua glória e reconhecimento da Nação, o Barão do Rio Branco.
Mas retornemos aos tempos atuais. O Presidente Lula, e sua assessoria, julgou trabalhar em prol do congraçamento brasilo-paraguaio, ao ceder à pressurosa insistência do Presidente Fernando Lugo. Talvez no quadro das negociações sindicais, a que está mais afeito, assumiu a pressa de Lugo como se dele igualmente fora.
Sem que de tais detalhes tivesse consciência, terá mutatis mutandi repetido, nos dias de hoje, o triste documento produzido pelo açodado ministro do exterior do Marechal Deodoro da Fonseca.
Intentemos resumir o que Lula concedeu ao ex-bispo F. Lugo. Pelo tratado de 1973, Brasil e Paraguai tem direito a 50% da energia gerada em Itaipu. Na prática, por só consumir 5%, o Paraguai vende o restante, conforme o estipulado, ao Brasil (Eletrobrás). A primeira concessão é a de que o Paraguai, no futuro, ofereça a sua cota no mercado livre de energia do Brasil, sem intermediação da Eletrobrás. E, a partir de 2023, se abre a possibilidade de a venda ser liberada a outros países. Por outro lado, ao invés da compensação que ora paga o Brasil, de US$ 120 milhões, a dita compensação passa a US$ 360 milhões. Não páram aí as concessões. Ao contrário de apenas financiar pelo BNDES linha de transmissão a fim de levar a energia de Itaipu até Assunção, esta obra, orçada em US$ 450 milhões, passará a ser custeada pela usina de Itaipu.
O negociador brasileiro, cujo semblante contrastava com a exultância do negociador paraguaio, tentou sublinhar que não haverá custo adicional para o contribuinte brasileiro. Resulta difícil crer que Itaipu binacional possa absorver doravante conta tão salgada.
Passa agora, no que nos concerne, a questão à competência do Congresso brasileiro. Esperemos que os nossos congressistas tenham presentes as suas responsabilidades e a tradição diplomática brasileira. Não confundamos boa vizinhança com excessiva prodigalidade e a produção de documento que não honra a tradição diplomática de exação e equilíbrio que nos legaram os nossos maiores.
[i] V.p.197, Álvaro Lins, Rio Branco,Cia.Editora Nacional, São Paulo, 1965.

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