Mais do que episódio melancólico, o comportamento do Governo Dilma Rousseff em matéria de meio ambiente provoca irada perplexidade.
É inacreditável que os papéis se invertam a tal ponto. Depois de renunciar – por motivos não declinados – a preparar substitutivo para o chamado relatório Aldo Rebelo (PCdoB/SP), a administração, sob a coordenação do Ministro-Chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, optou em limitar-se a oferecer ‘sugestões’ para o anteprojeto, elaborado pelo aludido deputado, sob encomenda da coalizão ruralista.
Ao ceder neste ponto fundamental, o governo de Dilma mostrou precipuamente a baixa prioridade, ou se preferirmos, a benigna negligência que atribui à questão.
Diga-se, de passagem, que, assim procedendo, renegou o compromisso ambientalista assinado pela candidata, quando soavam alarmantes as campaínhas do segundo turno da eleição presidencial.
Por quê ? É elementar que ao não exercer a prerrogativa de elaborar articulado que melhor defenda o patrimônio nacional brasileiro – quem ousará contraditar a riqueza de nossos recursos naturais -, o governo se negou vantagem que lhe pertence de direito, qual seja a de proteger e resguardar o interesse nacional.
Dessarte, a presidenta Dilma, que se tomara em brios e houvera por bem fazer aprovar a sua proposta de salário mínimo por um a princípio recalcitrante Congresso, agora reputa mais conveniente renunciar à iniciativa de elaborar projeto de código florestal digno deste nome ! Não creio que a força dos proponentes a terá atemorizado. Se afrontara as centrais sindicais e diversas direções partidárias na fixação do salário mínimo, não será um agrupamento do agro-negócio e de ruralistas criatura a induzi-la a esse tímido recuo. Tudo leva a crer que não considera o tema como merecedor de seu pleno empenho. Por isso, aceitam ‘negociar’ com um relator as emendas que julgam importantes ser introduzidas no texto do anteprojeto.
Não perceberão, porventura, Presidenta e seu Ministro-Chefe da Casa Civil, que, ao permitir esta indigna inversão de papéis, estão entregando muito mais do que um simples formalismo de precedência ?
Ao apequenar-se deste modo, o governo renuncia lamentavelmente não só à precedência, mas sobretudo ao poder de moldar projeto de lei que melhor consulte o interesse nacional. Perplexa, a sociedade assiste a essa ‘negociação’, em que a administração submete ao relator do projeto ruralista suas sugestões de emenda.
Conhecemos bem o parecer dos órgãos com entendimento na matéria – como o da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Foram tais órgãos e expertos que o relator Rebelo, com reveladora constância, sempre evitou ouvir. Eles recomendam cautela no assunto, sobretudo não decidir de afogadilho questão de real interesse nacional.
Chegamos a tal nível que o governo representado pela Ministra Izabella Teixeira concordou em abrir mão de reflorestar 23 milhões de hectares de reserva legal desmatada ilegalmente. Será bom e oportuno bem pesar a gravidade dessa renúncia, pois ela equivale a cinco vezes o estado do Rio de Janeiro. Do passivo atual – 43 milhões de hectares – de reservas legais desmatadas, se deixam apenas vinte milhões, para que o senhor relator conserve no seu texto esta chaga aberta em nossos finitos recursos naturais.
É deveras estranho o método seguido pelo Governo de Dilma Rousseff. Não tremerá acaso diante do juízo da posteridade – quando estivermos como Índia e China, desmatados e poluídos – pelo procedimento pouco edificante de haver entregue o que não devera em termos de tramitação legislativa ? Enseja, assim, por torpe e tolo oportunismo que venham os representantes da frente ruralista, inclusive de eventuais transgressores, a erigir-se em autores de código que, além de coonestar os malfeitos, vai apressar ainda mais o desmate, e todas as consequências dos atentados contra a natureza e toda a população que pagará o pesado preço de ulterior infâmia ?
( Fonte: O Globo )
terça-feira, 10 de maio de 2011
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