sexta-feira, 27 de maio de 2011

Afrouxamento Ético

           Ontem foi aprovado pelo Conselho de Ética da Câmara de Deputados projeto que flexibiliza o respectivo Código de Ética.
           As mudanças introduzidas são as seguintes: o Conselho pode recomendar (a) censura, verbal ou escrita; (b) suspensão temporária de prerrogativas; e (c) suspensão do exercício do mandato por até seis meses.
           A censura é aplicada pela Mesa Diretora da Câmara, mas o punido poderá recorrer ao plenário. Nos demais casos, o processo irá a plenário.
           Entre a suspensão de prerrogativas, há medidas políticas, como não ser indicado para relator. Se a suspensão do mandato for superior a 120 dias, o suplente será convocado. Não foi esclarecido se o punido terá os subsídios suspensos no cumprimento da pena, mas, segundo juristas, o pagamento também deveria ser suspenso.
           O projeto amplia o número de conselheiros, que de quinze passam a vinte e um. E, com vistas em suposta maior rapidez, muda o sistema de contagem dos prazos. Ao invés de sessões ordinárias, se passa a dias úteis.
           Antes de avaliar o que tais modificações possam significar, cabe assinalar que o novo projeto não considera alterações que tenderiam a estabelecer procedimentos mais eficazes. Nesse sentido, o Conselho continua sem poder convocar testemunhas - está autorizado somente a convidá-las. Tampouco é abolido o voto secreto no processo de cassação.
           Como se verifica, a ampliação do leque das penas a serem cominadas àqueles representantes que venham a ser objeto de ações por quebra de decoro não tem a intenção de torná-las mais abrangentes e muito menos de adequar o processo a normas mais conformes ao sentir da sociedade.
           Muito pelo contrário. É um intento de mascarar a impunidade, através da aplicação de penas light para os deputados que porventura forem julgados culpados.
           Prossegue, portanto, o processo de deterioração da ética congressual. Não é de hoje que tal acentuação ocorre. Assinale-se, por oportuno, que apesar dos diversos escândalos, a última legislatura não encontrou motivos para cassações.
           Com o crescimento do corporativismo, diminuem na razão inversa as perspectivas de deputados – malgrado a gravidade das eventuais incriminações – serem eventualmente cassados.
           De resto, as presentes modificações podem aplicar-se até para a deputada Jaqueline Roriz (PMN-DF), que responde, como se sabe, a processo por ter recebido dinheiro de Durval Barbosa, delator do mensalão no DF.
           O Presidente do Conselho, José Carlos Araújo (PDT-BA) descarta essa possibilidade, eis que já está pronto o parecer do relator, deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP). Não seria motivo bastante, porém, para os contumazes espectadores desse filme, afastarem de plano tal possibilidade.
           Já no que respeita ao Deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), que tem representações na Mesa Diretora, sob acusação de homofobia e racismo, presume-se que a flexibilização do Código de Ética possibilitará a aplicação de penas mais brandas para o deputado.
           Dessarte, de acordo com a tendência para a piora, referida por Ulysses Guimarães para as sucessivas legislaturas, as novas regras do Código de Ética não foram criadas para aperfeiçoá-lo.
           Se a tendência é pelo afrouxamento, a abertura do leque das sanções corresponderia, em verdade, a ulterior tentativa de tapar o sol com a peneira. Ou talvez nem mesmo essa intenção perdure.


                                                                                     ( Fonte: O Globo )

Nenhum comentário: