sábado, 13 de agosto de 2011

Síria: a bola da vez ?


Cresce a linha de interpretação de que o regime alauíta de Bashar al-Assad já se estaria aproximando de um estágio terminal e irreversível. As quedas de ditaduras costumam às vezes parecer súbitas, no sentido de que a partir de determinado momento tudo se precipita e com surpreendente estrondo - o antes portentoso edifício vem abaixo. Aconteceu com Reza Pahlevi, o Xá do Irã. Depois de longo processo, ei-lo na estrada da fuga, junto da escada do avião, a receber de um genuflexo general - derradeira homenagem à antes inconteste autoridade do Shainsha.
Apesar de que Bashar, que herdou o poder do pai Hafez al-Assad em 2000, não assinale a mesma longa permanência no mando absoluto, sua influência seria ainda vista como determinante na revolução síria de cinco meses.
Segundo tal enfoque, a sublevação cresceu menos por méritos próprios do que por deméritos de Bashar. Haveria no início uma rejeição não ao presidente al-Assad, mas ao regime que encabeçava. Dessarte, o progresso e a propagação do levante se deveria mais à incompetência do chefe de estado, que perdeu a oportunidade de ‘fazer as reformas necessárias’ para manter a popularidade, e adaptar o sistema aos reclamos de democracia trazidos pelos ventos da primavera árabe.
Ainda, consoante essa visão, se entenderia a moderação do Ocidente, a abaixar o diapasão de seus protestos, e a limitar a imposição de sanções ao mínimo, sempre sob a linha mestra de preservar Bashar al-Assad.
Por fim, teria sido a incompetência do presidente sírio que tornara irreversível o processo, seja ampliando uma oposição, antes débil e tentativa, seja convencendo, não só Estados Unidos e seus aliados, senão outros países com maior influência em Damasco – V. Turquia e Arábia Saudita – a se afastarem do caminho anterior.
O alegado gradualismo de Bashar – que pensara destarte manter calado o mundo árabe e o Ocidente – acabou por evidenciar-lhe o cinismo. Manter as baixas da oposição em níveis aceitáveis, não ultrapassando cem mortes nos ‘piores dias’ seria a fórmula para o déspota esclarecido.
Sempre de acordo com tal visão, essa inabilidade política do presidente equivaleria a tiro pela culatra. A popularidade na Síria – e o apoio no exterior - de Bashar despencaria de forma irremediável. Haveria ainda a placidez de Damasco e de Alepo, as duas maiores cidades, assim como a neutralidade da comunidade empresarial sunita, mas as perspectivas se haviam degringolado, com a condenação externa e o repúdio interno.
A teorização do papel desempenhado por Bashar semelha bem costurada, mas padece de um erro fundamental. Essas visões idílicas de um ditador bem intencionado e suscetível de alterar a progressão política se adequam à maravilha aos propósitos da máquina propagandística do regime.
O único defeito que apresentam é estarem na contramão da história. O oftalmologista Bashar sucedeu a Hafez al-Assad, em julho de 2000, não por apresentar uma proposta que colhera a aprovação de alguma assembleia ou colegio eleitoral. Foi simples sucessão dinástica, que recaíu sobre o filho mais velho sobrevivente, dada a morte do primogênito Basil al-Assad, preparado pelo pai para cuidar dos interesses do clã e do sistema de poder cosido pelo general Hafez al-Assad.
Assim, um ditador dinástico é a projeção externa de associação política que lhe garante a permanência. Presumir que o homem forte possa afastar-se ou dissociar-se de o que informa o respectivo poder será uma doce ilusão, que as realidades políticas tendem a incompatibilizar.
Por não dispor de alternativas reais, o tirano poderá fazer promessas democráticas – como as ensaiadas por Bashar – as quais, no entanto, por não terem substância, nem perspectiva de apoios válidos, rápido se evaporam debaixo do sol da razão de estado.
Quem governa pelo fuzil, ou permanece e prevalece com ele, ou é sobrepujado por superior conjunção de forças, que o joga na lata de lixo da história.

(Fonte subsidiária: CNN)

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