sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Crônica de Morte Anunciada


A primeira reação será de revolta. Contra a morte em si, covarde e traiçoeira. Contra as circunstâncias em que ocorreu. Contra situação iniqua, de um Estado que, por um aparente descarado menosprezo, desincentiva o profissional honesto e correto. Contra a cultura do medo e da impunidade.
A sociedade acaso se lembra da diretora do Presidio de ‘Segurança Máxima’ Bangu 1, Sidneya Santos de Jesus, abatida em 2008, em frente de casa na ilha do Governador ? Por causa de seu assassínio, o Secretário de Justiça João Luiz Pinaud, foi agredido no enterro, os diretores de presídio entregaram seus cargos e os agentes penitenciários entraram em greve.
Sidneya, incorruptível, que não abria exceções, cortando as mordomias dos chefões do crime encarcerados na sua unidade, dita de segurança máxima, não dispunha de qualquer proteção policial, apesar de estar jurada de morte pela mala vita. Presumivelmente, por deixá-la sem a indispensável segurança, a aparição de Pinaud no sepultamento despertara a cólera dos colegas de ofício de Sidneya.
A sorte e as circunstâncias da morte encomendada da juíza Patrícia Lourival Acioli, da 4ª Vara Criminal de São Gonçalo (RJ), são similares da covarde execução da predecessora na campanha por sistema judiciário digno e íntegro.
A magistrada Patrícia Acioli, juíza há vinte anos, já tivera o carro metralhado por bandidos. Foi morta também em frente de casa, no seu carro Fiat. Tampouco dispunha de qualquer segurança. No seu caso, se trataria de repor-lhe dispositivo de proteção, que lhe fora retirado pelo Desembargador Luiz Zveiter, quando na presidência do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Malgrado as ameaças constantes – constava inclusive em lista negra de doze nomes encontrada com o traficante Wanderley Silva Tavares, o Gordinho, preso em Guarapari no início do ano – por motivos ignotos não lhe foi restabelecida a segurança, a despeito das gritantes razões a clamarem em seu favor.
Como se vê, a juíza Patrícia Acioli, em São Gonçalo e a diretora do presídio Sidneya de Jesus, em Bangu 1, tiveram em vida muitos traços louváveis, que as distinguiram pela incorruptibilidade e coragem pessoal. Modestas, de conduta inatacável, cumpriam o seu dever dentro do sistema judiciário. E, no entanto, entregues à própria sorte, por atitude tão incompreensível quanto irresponsável, igualmente lhes coube morte covarde, administrada por capangas a serviço do crime organizado.
Alguém sabe, alguém viu que os sicários que mataram Sidneya de Jesus tenham sido caçados e trazidos à justiça, como seus vis mandantes ? Dadas as semelhanças do destino de outra servidora do Estado honesta e destemida, porventura subsistem dúvidas acerca das probabilidades de identificação, indiciamento e punição dos capangas e daqueles por cuja causa a juíza Patrícia foi torpemente executada ?
Gostaria de saber se Sidneya terá sido homenageada com alguma placa, ou designação de serviço no setor respectivo. Se a indiferença prevaleceu até hoje, e ela não o foi, será sempre tempo de reparar a omissão. O mesmo se aplica à Patrícia. Abandonadas em vida, poderão servir de exemplo na morte.
( Fonte: Portal Terra )

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