quarta-feira, 6 de maio de 2009

Reforma ou Arremedo de Reforma Política ?

Segundo noticia a Folha de hoje, a Câmara dos Deputados se mobiliza para aprovar até outubro vindouro o financiamento público de campanha e a adoção do voto em lista fechada já para 2010. Em texto ‘condensado’ pelo Deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), sob o patrocínio do Governo Federal e com o apoio de cinco partidos – PT, PMDB, DEM, PPS e PC do B – além de parte expressiva do PSDB, se propõe a criação: (A) de um fundo de cerca R$913 milhões (equivalente a R$7,00 por eleitor) para cobertura das despesas do primeiro turno, e de cerca R$260 milhões (R$2,00 por eleitor) para o segundo turno; e (B), de lista fechada. “preordenada” para o Legislativo.
Conquanto seja relevante a adoção do financiamento público das campanhas políticas – se submetido a regras estritas no que concerne a coibir o aporte de recursos espúrios – limitar-me-ei neste comentário às implicações da eventual adoção de listas partidárias.
A aludida lista seria preparada pelo partido (ou coligação), e os deputados de cada sigla seriam eleitos, de acordo com a votação da legenda e a sua hierarquia na respectiva relação. Assim, o eleitor passaria a votar em sigla e não mais no candidato individual.
A votação por lista, em um sistema de voto distrital-misto, é o adotado pela Alemanha. Nesse país, os principais candidatos – seja,v.g., dos cristãos-democratas (CDU), seja dos social-democratas (SPD) – são elencados nas listas partidárias. Candidatos menos representativos são submetidos aos distritos eleitorais.
Pela aparente pressa de nosso legislador, como o sistema do voto distrital-misto exigiria emenda constitucional, o deputado Ibsen Pinheiro privilegia o sistema de lista, mantido o voto proporcional, cuja aprovação não requer mudança constitucional, e dependeria de maioria simples para a sua aprovação.
Ainda segundo Ibsen, que se diz a favor do voto distrital misto, a preferência ao voto de lista fechada é o produto do casamento entre “relevância e viabilidade”. Como a introdução do voto distrital misto implicaria em emenda constitucional, se opta por uma versão que torna possível a aplicação da reforma já em 2010.

A reforma de afogadilho.

Sob pretexto do interesse de aprovar a ‘reforma política’ já com validade para as próximas eleições, o redator do projeto enjeita uma verdadeira reforma. Não se trata de dizer que ‘o perfeito é inimigo do bom’. O sistema político estruturado pela Constituição ‘Cidadã’ tem mais de vinte anos e a pressa – que esta sim é inimiga da perfeição – não se justifica. A criação do voto distrital-misto balançaria os aspectos negativos das listas partidárias, e para tanto valeria a pena de um maior prazo de espera.
Quanto às listas partidárias, representariam a cristalização do caciquismo nas legendas. Afastar-se-ía o eleitor de efetiva participação na eleição dos deputados, ao diluir o seu ‘voto soberano’ em elenco adrede preparado pelos integrantes das direções das diversas siglas.
Temos diante de nós a ânsia e a avidez de poder das direções partidárias. Atualmente, transcorre a semana do PDT na dita propaganda partidária obrigatória. Pois para os filmetes de divulgação – ao contrário de outros partidos que corretamente intentaram transmitir visão mais ampla dos respectivos próceres e propósitos – do partido do Engenheiro Lionel Brizola, o presente Ministro do Trabalho (e presidente licenciado da sigla) Carlos Lupi julgou próprio limitar as intervenções à sua augusta pessoa !
Será igualmente previsível que veremos proliferar nas listas os descendentes dos principais dirigentes estaduais das grandes siglas.
De resto, a composição das listas partidárias há de espelhar a criatividade do legislador nacional, inda que a faculdade imaginativa dos políticos não costume as mais das vezes perseguir objetivos de genuíno interesse geral.
Não seria melhor e mais auspicioso realizar autêntica reforma política, em que o voto, tanto em São Paulo, quanto no Amapá, tivesse o mesmo peso e valor ? Em que o eleitor, através do sistema distrital misto, pudesse ter maior presença e controle na escolha – e no acompanhamento – de seus mandatários ? Em que fossem afinal varridos os resquícios do patrimonialismo do Congresso, tais como os chamados suplentes sem voto no Senado ?
Ao procurar aprovar-se essa ‘reforminha’do sistema de votação, a nomenclatura do Legislativo (e do Executivo) persegue outros interesses que não o da verdadeira reforma política.
Por isso, devemos transmitir a quem de direito o nosso desagrado e nossa desaprovação com este tipo de arremedo. Já se esperou demasiado para que tenhamos de suportar, sob alegados motivos de urgência, mais um frankenstein das cúpulas partidárias.

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