sábado, 23 de maio de 2009

Obama e sua política antiterrorismo

Terminados os primeiros cem dias da Presidência de Barack Obama, não causa surpresa que a nova Administração deve enfrentar obstáculos e mesmo amargar algum revés.
O Senado e a Câmara de Representantes denegaram, de forma maciça, a autorização de fundos para fechar, no prazo de um ano, o campo de Guantánamo. Preocupa a opinião americana o destino a ser dado aos 240 detentos que aí se encontram, em função de suspeitas de terrorismo relativas ao período iniciado com os ataques de onze setembro de 2001.
Diante da inquietação pública, as maiorias democratas no Senado e na Câmara, associando-se aos opositores republicanos, não trepidaram em contrariar o desígnio presidencial. Resta determinar o que significa a primeira derrota parlamentar da Administração Obama.
De um lado, evidenciando a própria têmpera e a convicção em seus propósitos, o Presidente não acenou com qualquer modificação de seu plano de fechar o campo de Guantánamo em 22 de janeiro de 2010.
Em discurso solene no Arquivo Nacional de Washington, à frente de mostruário de páginas da Constituição americana, o Presidente Obama prometeu trabalhar com o Congresso para estabelecer um sistema seguro e justo para lidar com aqueles detentos que não podem ser processados, “a despeito de colocarem manifesto perigo para o povo americano”. Ao aduzir que “se outros países enfrentaram esta questão, também nós devemos fazê-lo”, acrescentou: “Nosso escopo é construir uma legítima estrutura legal para os detentos de Guantánamo, e não tentar evitá-la. Em nosso sistema constitucional, a detenção prolongada não deve ser decisão de um só homem.”
Assumindo posição que consoante os adversários republicanos o torna vulnerável, Obama asseverou que a maneira pela qual os suspeitos de terrorismo foram tratados em Guantánamo demonstrou ser um approach injusto e imprevisível que minou a posição (standing) do país e a segurança dos americanos.
Não obstante as intenções hostis de alguns detentos de Guantánamo, segundo o Presidente, os cidadãos estadunidenses não devem inquietar-se se um número relativamente pequeno ficar encarcerado no território continental americano. “Tenham presente o seguinte fato: ninguém jamais escapou de nossas prisões federais de segurança máxima, em que se concentram centenas de terroristas condenados.” Nessas prisões se acham Ramzi Yousef, que tentou fazer explodir o World Trade Center em 1993, e Zaccarias Moussaoui, denominado pelo Presidente “o vigésimo sequestrador de onze de setembro”.

Dick Cheney e a oposição do Partido Republicano.
O principal contestador do discurso presidencial foi o ex-Vice Presidente Dick Cheney. Depois de caótica fase inicial, que patenteou a confusão nas fileiras republicanas – a ponto do radialista de direita Rush Limbaugh ganhar certa notoriedade – a velha raposa Cheney vem assumindo progressivamente o papel do anti-Obama. Chefe de Gabinete do Presidente Ford, deputado republicano pelo Wyoming, Secretário da Defesa de Bush senior, Cheney exerceria durante a Administração de Bush júnior verdadeira Vice-Presidência executiva.
Se ao fim do governo Bush, a relação entre Vice e Presidente se resfriou, por Bush se haver negado a conceder perdão presidencial ao ex-chefe de gabinete de Cheney, Lewis ‘Scooter’Libby, o retraimento do antigo Chefe abriu caminho para Dick Cheney transformar-se no contestador oficioso do Presidente Obama.
Para tanto, ele bate sobretudo na tecla do medo. Como os alarmes que, no passado eram utilizados por Cheney e seu aliado – e antigo protetor – Donald Rumsfeld para manter vivo junto à opinião pública o temor do terrorismo, o ex-vice presidente joga com a ameaça do ressurgimento de ataques terroristas, viabilizados pela postura mais branda da nova Administração.
Cheney não deixa muitas dúvidas quanto à importância que para ele reveste a tortura (nas suas palavras, o ‘ interrogatório áspero’. Na sua opinião, “na luta contra o terrorismo não há área intermediária, e meias-medidas deixam o povo americano meio-exposto”. Dentro dessa linha de demonizar o perigo, a nova administração estaria fazendo cálculo profundamente falho e arriscado de que os ataques de onze de setembro de 2001 foram, em realidade, evento único e não permanente ameaça existencial.
O Presidente Barack Obama, malgrado o próprio carisma, habilidade oratória, e sólido embasamento jurídico, depara talvez o seu maior desafio nessa direita enrijecida, que maneja sem maiores escrúpulos os temores das trevas e do imponderável. A dupla Bush-Cheney só logrou afirmar-se na presidência depois dos ataques de onze de setembro, e a histeria que através da intimidação reforçou os métodos fascistóides dessa Administração republicana.
Não se deve minimizar os escolhos e as ameaças que se desenham no futuro, desejosos de golpear-lhe a popularidade e de tornar Obama o presidente de único mandato.
No meu entender, porém, a direita raivosa de Dick Cheney encontrou alguém que está em condições de derrotá-la na sua solitária empreitada do medo. Mas, como o próprio Obama reconhece, a tarefa não será nada fácil.

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